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Violento e Estilizado

Em Os Oito Odiados, Quentin Tarantino renova seu amor pelo gênero western e volta a esbarrar em questões raciais delicadas

Érico Fuks Publicado em 11/01/2016, às 11h59 - Atualizado às 15h05

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<b>EXPERIENTE</b>
O diretor nunca tinha trabalhado em um set antes de Cães de Aluguel. “Agora eu já estive em alguns e sei organizar os meus para que sejam lugares agradáveis”, diz. - VICTORIA WILL/INVISION/AP
<b>EXPERIENTE</b> O diretor nunca tinha trabalhado em um set antes de Cães de Aluguel. “Agora eu já estive em alguns e sei organizar os meus para que sejam lugares agradáveis”, diz. - VICTORIA WILL/INVISION/AP

Uma aura de admiração e adoração segue Quentin Tarantino, de 52 anos, aonde quer que ele vá, e no Brasil não foi diferente. Diretor de clássicos como Pulp Fiction: Tempo de Violência e Jackie Brown, ele agora causa expectativa com Os Oito Odiados, sua mais nova empreitada (possivelmente uma das últimas, segundo ele insinuou no passado, desmentiu recentemente e volta a aludir nesta entrevista). Para promover o filme, segunda incursão dele no mundo do faroeste (logo depois de Django Livre, de 2012), Tarantino veio ao país na companhia do ator Tim Roth, um dos astros do longa e com quem trabalhou anteriormente em Cães de Aluguel e no já citado Pulp Fiction.

Tarantino recebeu a reportagem após um longo dia de entrevistas e eventos, mas com disposição e simpatia, quebrando a antecipação que se poderia ter diante da fama de temperamental que ele carrega – o cineasta chegou a desistir de rodar o novo filme, quando o roteiro dele vazou, e foi notícia no passado por se irritar com jornalistas. Mas o diretor e roteirista de Os Oito Odiados estava ansioso para compartilhar detalhes a respeito da produção, que chega aos cinemas em 7 de janeiro.

A trama se passa logo após a Guerra Civil dos Estados Unidos, encerrada em 1865, na qual o Norte e o Sul, entre outras coisas, disputavam para determinar se seria abolida a escravidão no país. No estado de Wyoming, oito sujeitos de caráter duvidoso se veem presos juntos em uma cabana quando buscam abrigo durante uma nevasca – nesse contexto, ninguém sabe em quem confiar. O longa também é estrelado por Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Demián Bichir, Michael Madsen e Bruce Dern e traz trilha do lendário Ennio Morricone, que compôs músicas para grandes títulos como Cinema Paradiso e Três Homens em Conflito (The Good, the Bad and the Ugly, cuja música-tema é uma das mais mais famosas do cinema).

Bastardos Inglórios e Django Livre pegam uma parte da história e a contam de uma maneira diferente, ficcional. Os Oito Odiados também cobre um determinado período dos Estados Unidos. Você está tentando

reescrever ou reconstruir a história norte-americana?

Bem, eu não sei o quanto de reconstrução tem aí. Acho que o filme é como um complemento de Django Livre. Uma das coisas que eu ofereço ao gênero western é lidar com políticas raciais, especialmente entre negros e brancos. Nos Estados Unidos, isso foi meio que ignorado na maioria dos estados do oeste. E trabalho com isso de um modo real, mas polido. No caso de Django..., eu mostro o período de escravidão dois anos antes da Guerra Civil. Em Os Oito Odiados, foco num período específico depois da Guerra. Seis, oito, dez anos depois. Porém, de fato estou lidando com a Guerra Civil e suas consequências para as pessoas envolvidas nela. Eu não diria que Django... é um filme sob a perspectiva dos negros. Todo personagem tem um ponto de vista sobre tudo. Já Os Oito Odiados é quase como um filme pós-apocalíptico. Neste caso, o apocalipse é a Guerra Civil.

Você costuma trabalhar com um elenco sempre repleto de atores com quem não tenha trabalhado antes. Por que agora optou por uma combinação equilibrada de atores novatos e veteranos em relação à sua obra?

Neste caso, particularmente, acabei escrevendo todos os detalhes dos oito personagens. Fiz quatro deles para atores com quem já trabalhei. Eu escrevi papéis para o Tim [Roth], para o Michael [Madsen], para o Sam [Samuel L. Jackson] e para o Kurt [Russell]. Primeiro, porque eu queria trabalhar com eles. Segundo, o filme tem muitos diálogos e eu sabia o que esperar deles quatro. Queria atores muito bons e familiarizados comigo para interpretar essas falas. E entrei na ideia de trabalhar com “os astros” do Tarantino [risos]. Contudo, também gostei de escalar atores que eram os personagens, sem eu ter escrito o papel para um ator em particular. Era apenas o personagem, que iria se desenvolver como tal e eu tinha que achar alguém que fosse esse personagem. Acho que essa combinação funcionou muito bem.

Você pensou em algum nome diferente ou a Jennifer Jason Leigh foi a escolhida desde sempre para viver Daisy (mulher acusada de um crime e capturada pelo caçador de recompensas vivido por Kurt Russel)?

Fiz uma reunião com Jennifer Lawrence. Eu a considero uma atriz incrível e a imaginei fazendo um excelente trabalho. Mas então comecei a ver outras atrizes e isso me fez perceber que esse filme tem todo um aspecto de anos 1990. Havia uma conexão simbiótica com Cães de Aluguel. E boa parte dos atores com quem trabalhei está ligada à década de 1990. Foi aí que me ocorreu que a atriz para a personagem Daisy não podia ser tão jovem, ela deve deveria ser contemporânea desses caras. Nesse sentido, Jennifer Jason Leigh e Tim têm similaridades e paralelos, então fiquei muito entusiasmado com a ideia de chamá-la.

Nos créditos iniciais, por que você escolheu colocar a legenda “O oitavo filme de Quentin Tarantino”?

Eu também fiz isso em Kill Bill: Volume 1, “O quarto filme”. Eu fiz isso em todas as minhas comédias [risos]. Agora é contagem regressiva: “O último filme de Quentin Tarantino” [risos]. É exatamente isso que vou fazer.

Qual é a característica mais relevante que se modificou no seu jeito de dirigir desde que fez Cães de Aluguel?

Boa pergunta. A maior diferença é que quando fiz Cães de Aluguel eu nunca tinha estado em um set antes. A situação mais próxima havia sido como assistente de produção em um home video sobre exercícios do [ator e artista marcial sueco] Dolph Lundgren. Em Cães... tudo era baseado em teoria. Eu sabia o que queria filmar, mas o cinegrafista, os atores, o montador, todos sabiam mais sobre filmagem do que eu. Só que eu conhecia mais o material que estava rodando, esse era meu critério. Agora, eu já estive em alguns sets e sei organizar os meus para que eles sejam um lugar agradável. Criei uma família; antes, eu era como um órfão. Tim esteve no set [de Cães de Aluguel] muitas vezes. Ele foi muito generoso comigo. “Não, não é assim que deve ser. É assim que deve ser. Esse cara não está fazendo o trabalho direito. Ele está te ferrando porque está custando uma grana que você não pode pagar”, Tim alertava. E agora ele aparece neste filme.