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Nick Jonas entrevista Elvis Costello

Em setembro de 2008, o líder do Jonas Brothers revelou à Rolling Stone EUA que seu herói era Elvis Costello - e a equipe da revista viabilizou o improvável encontro dos dois para uma conversa sobre música, fama e ser bonzinho com seus irmãos

Por Jenny Eliscu Publicado em 18/05/2009, às 17h24

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Elvis Costello saía da adolescência num momento em que se esperava dos rock stars que matassem seus ídolos, porém Nick Jonas é o tipo de rock star que abraça os seus. No começo desse ano, o líder - de 16 anos - da febre adolescente Jonas Brothers disse à Rolling Stone o quanto admirava Elvis Costello, e nós, como uma Make-a-Wish Foundation do rock, nos oferecemos pra colocá-lo num tête-à-tête com seu herói. Numa tarde em Los Angeles, Jonas e Costello - ambos vestindo calças pretas e botas de couro da moda - se conheceram num estúdio de gravação em Hollywood, onde conversaram sobre tudo desde composição de música a Radiohead, passando pela condição de ídolo adolescente. Nitidamente fascinado, Jonas manteve a compostura enquanto Costello, 54, esteve sentado de frente pra ele, mas quando a conversa acabou e Costello saiu, Nick suspirou, balançou a cabeça pra lá e pra cá e apenas disse: "Que incrível". Depois, Costello elogiou Jonas usando as palavras "atencioso e curioso" e o chamando de "companhia interessante". Mas acrescentou: "Já reclamei desse lance de ele ser mais bonito do que eu".

Nick Jonas: Quantas bandas você teve antes do The Attractions?

Elvis Costello: Antes de eu ser bom o suficiente pra me considerar um profissional, eu só participei na verdade de duas bandas. Quando eu saí da escola, estava numa banda com quatro caras, e em seis meses nós éramos uma dupla. O cara que cantava - ele era o dono do microfone, era o único motivo de ele ser o vocalista -, a gente se livrou dele rapidinho. Depois eu fui morar em Londres e me juntei com uns caras que gostavam do mesmo tipo de música que eu. Nós dividimos uma casa por algum tempo - era como fazer parte do The Monkees. Depois veio o The Attractions, eu já tinha lançado meu primeiro disco, e a gravadora disse: "Agora você precisa fazer uma turnê". Então eles montaram o The Attractions depois de fazer testes. Tivemos muita sorte, poderíamos ter feito audições por anos a fio e nunca ter esbarrado em caras tão bons.

NJ: O fato de a banda ter sido formada por meio de testes foi um problema?

EC: Bom, nós não crescemos juntos. Obviamente é muito diferente porque vocês são irmãos. Meus quatro meio-irmãos tocaram juntos numa banda por muitos anos, então eu sei mais ou menos como é. Quando você está numa banda, isso te faz crescer, porque você tem muitas experiências que uma pessoa da sua idade que não sai da própria vizinhança não teria. Você fica famoso e faz viagens, e se fica muito famoso, nem pode sair do seu quarto no hotel. Tipo, eu sei as cenas que vocês causam quando aparecem. Já vi na TV.

NJ: Tem que se acostumar - é um choque pra nós. Às vezes é um tanto frustrante, mas pra maioria dos casos nós temos uma boa equipe pra nos ajudar a manter as coisas em ordem. Quanto a fãs, o grande problema é quando elas vão à nossa casa. Aí, sei lá, acho que é meio estranho pra qualquer um.

EC: Eu nunca passei por coisas tão extremas, apesar de a gente ter sido uma típica banda pop por algum tempo. Em 1978, todas as músicas que lançamos na Inglaterra viraram hit. Há pouco tempo, minha mãe encontrou numas gavetas umas revistas adolescentes antigas com uma foto da Debbie Harry, do Blondie, uma do Sting, e lá estava uma foto minha [risos]. Era difícil levar a sério na época, eu simplesmente achava aquilo absurdo demais.

NJ: Eu estou lendo um livro agora sobre você - Complicated Shadows: The Life and Music of Elvis Costello.

EC: Meu Deus.

NJ: E ele fala sobre a primeira música que você compôs.

EC: "Winter" era o nome. E era em Mi menor. Você logo vê que eu saí de cara mandando uma música bem alegre.

NJ: Isso existe gravado em algum lugar?

EC: Não, eu tinha 13 anos nessa época, e as gravações mais antigas que eu tenho são uma ou duas músicas de quando eu tinha uns 17. O que eu normalmente fazia - não sei se você faz isso - era compor num caderno. Eu ainda faço assim. Você enche um caderno inteiro e pensa: "É, daquele caderno dá pra tirar umas três ou quatro músicas". E você? Como faz?

NJ: Eu guardo muita coisa no computador, mas uso o celular também. Pra mim, digitar no meu computador é às vezes o jeito mais conveniente de fazer as coisas, porque eu não tenho muito tempo. Eu tenho que anotar rápido. Então, quando estamos no estúdio, eu posso passar as letras pros meus irmãos.

EC: Ah, é? Eu escrevi uma música um tempo atrás assim - na verdade com a Rosanne Cash e o Kris Kristofferson. Ele mora no Havaí, e ela em Nova Iorque, e eu estava em Vancouver. Ela disse: "Eu tenho um trechinho de música. Você quer ver se podemos escrevê-la juntos?" Então ela escreveu um verso. Eu escrevi o outro. E foi como uma corrente. Você nunca, assim, acorda no meio da madrugada e pensa num verso?

NJ: Sim, direto. "S.O.S." na verdade foi composta assim.

EC: De vez em quando você pensa: "Estou muito cansado. Devia levantar e anotar essa, mas eu vou lembrar de manhã". Anote, sempre - não tem coisa mais torturante do que não ter anotado e pensar: "Eu sei que pensei num verso, mas não faço idéia do que era". Eu tenho um caderno ao lado da cama, e aprendi a escrever no escuro, então se um verso me vem à cabeça eu nem preciso acender a luz pra escrevê-lo.

NJ: Normalmente as letras vêm primeiro, e depois a melodia?

EC: No começo as letras vinham antes, depois tudo vinha junto. Depois por algum tempo era primeiro a música, e eu mudei tudo de novo. Eu conheço um monte de grupos agora, eles fazem primeiro a música. Fazem uma faixa completa.

NJ: A gente já teve algumas vezes um tipo de percepção musical que mandava primeiro trabalhar e colocar as letras depois. Mas na maior parte das vezes eu acho que a gente compõe tudo ao mesmo tempo.

EC: Você não acha que se consegue tocá-la na guitarra, a música já está pronta?

NJ: Total. Eu normalmente percebo isso se eu pego uma faixa e tento escrever uma melodia pra ela, nada de criativo acontece.

EC: Porque o processo já está bloqueado.

NJ: Como você faz quando antes de um refrão você usa as mesmas palavras no primeiro e no segundo verso? Porque com os meus irmãos é assim, às vezes a gente simplesmente diz: "Ah, isso soa bem aqui também".

EC: Eu não vejo nada de errado nisso. Algumas músicas bastante simples e repetitivas são muito eficientes. Eu já escrevi um monte de letras, e sou meio que conhecido por sobrepor imagens, mas isso não significa que eu não goste de canções que sejam muito simples. Mais ou menos como uma pessoa de cabelos lisos gostaria de ter cachos, e vice-versa, sabe?

NJ: Nos últimos, sei lá, dez anos, tem algum álbum pop que você se surpreende por ter gostado de verdade?

EC: Eu sempre disse que a coisa mais difícil do mundo é fazer um hit com uma música boa. Eu consigo pensar em muitas dessas canções pop ditas fabricadas que são ótimas. A Motown era muito programada no jeito de fazer as coisas, mas eles tinham compositores brilhantes. E há melodias realmente lindas em canções do Radiohead. Algumas pessoas são frustradas porque o Radiohead não vai fazer seus álbuns soarem convencionais. A maioria da boa música é assim. Um álbum não se parece com o outro. As melhores coisas foram criadas a partir de surpresas.

NJ: Pode crer. Tem um grupo, The Zutons, eles são ingleses, e as músicas deles nos fazem cantar junto. Eu queria poder, tipo, pegar as habilidades de composição deles pra mim por uns dias.

EC: Você sabe, os Beatles eram uma banda pop quando surgiram. Mas eles não se agarraram ao que tinham feito. Eu me lembro de ouvir "Paperback Writer" no rádio quando eu tinha 10 ou 12 anos, e foi muito chocante. Eu pensei: "Que tipo de música é essa?" Mas já na semana seguinte, eu não conseguia mais viver sem aquele disco. Todos que fazem música pop têm a oportunidade de fazer isso, e com um público enorme. Esse é um grande desafio pra vocês: ver o quanto vocês conseguem direcionar as pessoas pras coisas que vocês gostam, e não sejam persuadidos a continuar fazendo a mesma música. Se ser um pop star é a sua ambição, você está fadado a se decepcionar. É sensato pensar que as menininhas que gostam de vocês hoje vão acordar um dia e se sentir constrangidas por terem gostado, porque então elas vão se sentir mais refinadas.

NJ: Fazem muito essa pergunta - "Como vocês vão conseguir manter o seu público, e como vão se manter famosos?" Eu acho que o lance é ter sempre o processo de criação nas mãos, e tentar estar igualmente envolvido na produção. Eu acho que isso vai nos ajudar a ter uma carreira longa.

EC: A melhor coisa pra conduzir vocês a isso é um amor genuíno pela música, que, pelas suas perguntas... você tem curiosidade por música. De cara pareceu estranho ouvir que você tinha intimidade com a minha música, mas aí eu pensei que, quando eu tinha a sua idade... quantos anos você tem?

NJ: Quase 16, faço em duas semanas [Nick nasceu em 16 de setembro de 1992].

EC: Seria muito fácil pra mim bancar o cínico e dizer: "Ah, um moleque desses não tem como saber nada da minha música". Mas eu ouvia os álbuns dos meus pais quando tinha essa idade, e foi assim que eu aprendi. Carreira musical é vocação. É como se você tivesse nascido assim, e não tem o que fazer. Eu falo, eu sou o terceiro em quatro gerações de músicos na minha família, e você vem de uma família de músicos também.

NJ: É. Meu pai era músico - tocava piano e cantava. E é legal a gente se relacionar nesse nível.

EC: Eu acredito sinceramente que se não tivesse tido sorte alguma, ainda assim eu estaria tocando. Às vezes você tem que simplesmente dizer pra si mesmo que a música é mais importante do que as recompensas da fama. Mas isso é outra conversa. Vocês têm que aproveitar o que está acontecendo agora. A primeira vez que me pediram um autógrafo, eu retruquei: "Por que você acha que quer meu autógrafo?"

NJ: Eu na verdade fiz meio que a mesma coisa. Eu tinha sete ou oito anos e estava fazendo um espetáculo na Broadway. Um moleque, amigo de família, veio e pediu um autógrafo, e eu falei: "Você é meu amigo! Por que está me pedindo um autógrafo?"

EC: Eu era desconfiado do sucesso, e isso era uma bobagem. Eu era imaturo. Eu levei muito tempo pra me entender com o fato de que os outros me olhavam diferente porque eu compunha canções. Agora eu vejo que perdi muito tempo me debatendo com isso e provavelmente deixei passar muitas situações em que eu deveria simplesmente ter dito: "Aceita". É gostoso, não vai durar pra sempre, e eu vou ser um cara de sorte se no final disso tudo eu ainda souber o que eu quero.

Matéria publicada originalmente na edição 1064 da Rolling Stone EUA

Tradução: Leandro Pereira