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Sabotage

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Lucas Brêda Publicado em 20/11/2016, às 23h57 - Atualizado em 26/11/2016, às 22h56

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“Seja um Mártir, às vezes um Luther King, um Sabotage”, cantou Mauro Mateus dos Santos em uma das demos gravadas no início de 2003 para o seu nunca finalizado segundo disco. O verso, que ganha vida em “Canão Foi Tão Bom”, soa assustadoramente simbólico depois do assassinato do rapper, em 24 de janeiro daquele ano. Mesmo antes de morrer, Sabotage parecia saber que seu nome teria o peso de um embaixador. A faixa sobressai em Sabotage, álbum póstumo preparado durante mais de uma década com base nas gravações deixadas pelo artista, contendo colaboração apenas de nomes que trabalharam com ele em vida.

O disco sai como um exercício de imaginação: são 11 canções que embalam com batidas e arranjos cheios de frescor as ideias musicais e a poesia quase atemporal de Sabotage (referências como à novela O Clone ou à personagem Tiazinha são choques de passado em meio a rimas inacreditavelmente atuais). A mente musical libertina de Sabotage – fã de Sandy & Junior, Wu-Tang Clan e Chico Buarque – é explorada sem pudor, do trap gangsta robusto de “Mosquito” (assinado pelo Tropkillaz, do DJ Zegon, um dos produtores de Rap É Compromisso, único disco cheio lançado em vida por Sabotage) ao samba de “Maloca É Maré” (Daniel Ganjaman, Instituto), passando pelas guitarras de “Superar” (DJ Nuts) e pela balada “O Gatilho” (Ganjaman, Instituto).

O álbum atinge o pico de intensidade em “País da Fome”, que, na mão do DJ Cia (RZO), ganha o subtítulo e o gancho “Homens Animais”, referência direta ao trágico fim do rapper. Ele se afoga em confissões, encarando o medo (da morte, do “zé povim”) e a falta (da mãe e do irmão, ambos falecidos). Faz isso com sinceridade surpreendente, até desabar em um cantar chorado e desamparado. É o momento mais cru e vulnerável já registrado do herói do Canão.

Entre ganchos já icônicos – “Superar é só para superstar”, de “Superar”, e “Mega como o Sonic: Fatality”, de “Levada Segura” – e um flow habilidoso, Sabotage troca rimas com Dexter, Rappin’ Hood, Lakers, DBS, Sandrão (RZO) e até com o norte-americano Shyheim, afiliado ao Wu-Tang Clan. Em “O Gatilho”, BNegão faz referência ao presidente Barack Obama e resume um sentimento unânime ao confessar saudades das “ideias avançadas” de Mauro Mateus.

Sabotage nasce grandioso, correndo riscos necessários e se equilibrando entre uma mera homenagem e uma expressiva obra de arte. É uma chacoalhada na imaginação, trazendo a assinatura do mestre que transformou a própria comunidade em conceito, colorindo a mente daqueles a quem nunca foi dado o direito de sonhar.

Fonte: Sabotage Prods. Arts