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Bixiga 70 lança seu álbum mais complexo e avança no amadurecimento criativo

Com influências da Índia, entre outras, Quebra-Cabeça leva a big band para o próximo nível

Henrique Inglez de Souza Publicado em 10/09/2018, às 14h26

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Bixiga 70 - José de Holanda
Bixiga 70 - José de Holanda

Viver de música, no Brasil, é mais que um desafio: é um espinhento teste de resistência. Se for música instrumental, então, vira um ato heroico. Por essas e outras, o Bixiga 70 é uma banda que merece nossa reverência.

Surgida há oito anos, a big band paulistana ganhou respeito no Brasil e exterior, erguendo uma carreira sólida, criativa e duradoura. O mais interessante disso tudo: se manteve alheia a essa realidade cruelmente seletiva.

“Não sei se nos espantamos tanto em relação a isso”, minimiza o guitarrista Cris Scabello. “O Bixiga 70 sempre teve uma aceitação muito boa, desde o princípio. O fato de sermos uma banda instrumental não me parece ter afastado as pessoas de nossa música, dos shows. Mas é curioso, realmente, termos uma aceitação tão grande.”

O novo trabalho, Quebra-Cabeça, é o quarto de uma discografia costurada por grooves setentistas e um multiculturalismo vibrante. As faixas de 2018 vão ainda mais fundo nas influências incorporadas durante as turnês pelo mundo. O resultado é apontado pelos próprios como o mais complexo dos discos lançados. Uma boa razão para tanto está no longo período dedicado à preparação. Por mais de um ano ensaiaram, testaram, conversaram, combinaram partes e refinaram ideias. De forma livre e espontânea. “Isso foi determinante para o grau de complexidade impresso no disco”, aponta Scabello.

O sistema de gravação também teve uma diferença fundamental. Pela primeira vez, cada integrante registrou suas partes separadamente. Antes, o esquema era com todos tocando juntos, ao vivo em estúdio, e suando para que o acerto no take fosse unânime. Agora, o processo foi mais tranquilo, sem essa pressão, o que permitiu um cuidado técnico maior, uma polida mais moderna ao som.

Dividir a produção com Gustavo Lenza (Céu, Curumim, Arnaldo Antunes) fez uma baita diferença. Uma escolha acertada, conforme resume o guitarrista. “É um profissional que todos admiram e respeitam muito. Nos ajudou a construir esse disco de forma bastante importante. O olhar dele sobre o conteúdo foi fundamental para o resultado final. Ele desempenhou um trabalho magnífico.”

O Bixiga 70 avançou em seu amadurecimento criativo. Quebra-Cabeça os coloca um passo adiante. Tem músicas que afagam nossas expectativas, como "Ilha Vizinha" ou "Ladeira", mas também há peculiaridades."Pedra de Raio", "Areia" e "Primeiramente" são exemplos do quão distante miraram seus anseios artísticos. É um repertório que dá gosto chamar de “novo”.

“A música menos Bixiga 70, apesar de ser bastante Bixiga 70, é 'Camelo'”, destaca Scabello. “É bem ‘reta’, sem grandes mudanças, simples.” A gênese dessa faixa veio da música eletrônica. Porém, um inusitado show na Índia, no fim de 2017, rendeu um acabamento ímpar. “Fomos tocar em um casamento em Jaipur, foi uma viagem completamente surreal”, conta. “A música ganhou elementos da percussão de lá, com o nagará e o toque do camelo. Um cara ensinou o Rômulo, nosso percussionista, e acabamos acrescentando essa levada na segunda parte da música, que cresceu bastante.”

O grupo curte uma fase inspirada, mas principalmente marcada pelo desprendimento geral. Se música instrumental, no Brasil, é um ato heroico, esses caras são super-heróis. Afinal, a big band deles conseguiu abocanhar um filão próprio e fazer deste um nicho vivo, aceito e autossustentável. “O público gosta do jeito como tratamos nossa música – como uma oração, um protesto, uma celebração da liberdade, igualdade e democracia. Não é de se espantar que as pessoas se identifiquem com isso e que celebrem conosco tudo o que estamos celebrando”, conclui Cris Scabello.

Quebra-Cabeça marca a estreia do Bixiga 70 pela gravadora Deck. O disco está nas plataformas digitais e lojas físicas, em CD, vinil e cassete.