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“Ela foi muito julgada”, diz diretor de novo documentário sobre Whitney Houston

Nick Broomfield conta como se apaixonou pela cantora ao fazer o filme Whitney: Can I Be Me, que sai nos Estados Unidos este mês

Jason Newman Publicado em 15/08/2017, às 20h01 - Atualizado às 20h57

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Whitney Houston - AP
Whitney Houston - AP

Um ano atrás, o veterano cineasta Nick Broomfield percebeu que algo estava errado. Há cerca de três meses na pós-produção de Whitney: Can I Be Me, novo documentário dele sobre a vida e a morte de Whitney Houston, ele estava sentado na sala de edição e se viu “em completo desespero.”

No estado bruto, o filme era em essência um compilado de especialistas opinando sobre a influência e o legado da cantora – uma “reportagem jornalística”, na definição de Broomfield. No entanto, ele nota: “Eu estava sentindo meu coração emocionado com a história”. O diretor se recusou a mostrar o corte à BBC, que financiou a produção do longa com o Showtime. “Eu destruí completamente o filme.”

O que era necessário, ele percebeu, era uma mudança radical de direção. “Ela de alguma maneira não estava lá”, diz o diretor de 69 anos, falando da casa dele, em Sussex, Inglaterra. “Então, troquei os editores e decidi que íamos colocar a voz de Whitney o máximo que pudéssemos. Queríamos contar a história pelos olhos dela. E logo que a mudança foi feita, me vi despedaçado. Eu conseguia sentir o espírito da Whitney.”

Construído por uma combinação de entrevistas originais, material de arquivo e imagens captadas pelo codiretor Rudi Dolezal, Whitney (sem previsão de lançamento no Brasil, mas com estreia marcada para o fim deste mês nos Estados Unidos) é uma visão íntima da vida da cantora. O documentário, contudo, também explora os diversos fatores que levaram à morte dela e traz uma abordagem mais abrangente acerca intersecção entre raça e mercado na indústria da música.

Além disso, ao contrário de outro documentários musicais de Broomfield, entre eles Biggie & Tupac e Kurt & Courtney, o diretor não é mostrado e raramente é ouvido, deixando os amigos, família, associados da gravadora e companheiros de banda da cantora celebrarem uma vida tanto quanto lamentar uma morte.

Rolling Stone: O quão familiar você era com Whitney Houston – e qual era seu plano inicial para o filme – quando você começou?

Nick Broomfield: Acho que não havia bem um plano. Não sabia muita coisa sobre Whitney Houston, mas o que originalmente me interessou foi quando eu ouvi que as empresas de música da época tinham uma divisão entre negros e brancos. Uma das primeiras pessoas com quem conversei foi [o funcionário da Arista Records] Kenneth Reynolds, que disse que ela era cuidadosamente preparada para ser aceita pelas massas e pelo público branco. Eu realmente nunca pensei muito sobre o aspecto racial de Whitney Houston, mas isso foi algo que estava no cerne da história. Na prática, aquelas pessoas pensaram que ela era alguém que não ela. Eles eram alimentados por uma certa imagem. Toda vez que ela não correspondia à expectativa daquela imagem, ela era então severamente julgada. Era uma situação insuportável.

O filme mostra a desaprovação da família em relação a amizade entre Whitney e Robyn Crawford, e você disse que eles estavam tentando “obliterar a memória dela a partir das visões próprias de Whitney”. Você acha que a recusa de alguns membros de participarem do seu filme aconteceu devido ao endeusamento de Robyn?

Absolutamente. E quando você vê o filme, percebe o porquê. Porque ela era o anjo no ombro de Whitney e era só quando Robyn saía que as coisas começavam a ficar absolutamente fora de controle. Ela merecia esse reconhecimento. Robyn era eficiente: ela era a força que guiava e mantinha tudo no lugar, sempre colocando Whitney em primeiro lugar, nunca tentando se aproveitar da relação delas. Ela é a heroína, de certa forma, do filme. Admiro-a.

O espólio de Whitney denunciou este filme anteriormente. O quão agressivo eles foram? Eles pediram para pessoas não participarem do filme?

Eles foram muito agressivos. Kenneth Reynolds recebeu um e-mail e uma ligação dizendo: “Não queremos que você participe do filme. Estamos fazendo nosso próprio filme com um time vencedor de Oscar [o diretor de O Último Rei da Escócia, Kevin MacDonald, está trabalhando em um documentário concorrente] e gostaríamos se você não se intrometesse. E sabemos que você está ajudando Nick Broomfield a falar com outras pessoas e não queremos que você faça isso.”

A profundidade da relação entre Whitney e Robyn parece o subtexto em que o filme se apoia conforme a história vai sendo contada.

Sim, isso absolutamente verdade. Eu não acho que você precisa fazer um grande caso disso. As pessoas continuam dizendo: a [Whitney ] era gay ou não? Acho isso irritante porque, claramente, [Robyn] foi, por muito tempo, o relacionamento mais importante na vida de Whitney, independente de qualquer outra coisa.

Um diretor diferente poderia facilmente ter tido uma abordagem muito mais obscena.

Sim, o que, acho, teria completamente minado o filme. Porque o que você queria era que a humanidade e grandeza de Whitney se sobressaíssem. Havia uma simplicidade e uma naturalidade entre ela e Robyn. Elas eram duas pessoas que se encontraram quando adolescentes. Não era uma coisa obscena; era apenas a coisa mais natural. O mundo fez disso algo indecente e isso foi a primeira coisa que ela foi perguntada em todos esses talk shows. Tenho certeza de que [Clive Davis] não teve a intenção de fazer isso conscientemente, mas ele pegou essa pessoa inocente e fez da vida dela algo absolutamente difícil ao criar algo que não era ela. E, depois, meio que esperar que elas vivessem aquilo [Davis se recusou a participar do filme e, por um representante, recusou-se a comentar esta entrevista].

Uma bomba do filme é um documento emitido pelo guarda pessoal de Whitney, David Roberts, em 1995, alertando o empresariado dela sobre o abuso de drogas e a influência corrosiva das pessoas no entorno dela.

E ele foi demitido por isso. É verdade. Porque tiveram outros que tentavam fazer a mesma coisa, subsequentemente, e também foram demitidos. [As pessoas próximas a ela] Não eram preparadas para cessar os shows e as turnês. Ela estava pegando fogo. Aqueles que estavam fornecendo drogas e escondendo-as em suas vaginas eram os mesmos que ficaram com ela até a morte. E, de acordo com aquele documento, estavam todos usando drogas também. David Roberts realmente se importou. Ele foi punido por dar a cara a tapas.

O que você espera que as pessoas aprendam com o filme depois de assistir?

Acho que é um filme sobre julgamento. Ela foi muito julgada. Às vezes acho possível simplesmente anular uma pessoa. Nós sempre estamos procurando uma razão para não dar uma segunda chance às pessoas e acho que ela foi impiedosamente julgada pelo vício em drogas. Havia muito pouca chance de realmente entender de onde isto vinha e do que se tratava. Eu gostaria que muita gente se sentisse que havia uma maneira completamente diferente de encarar isso tudo.