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Em turnê, Rodrigo Amarante troca mainstream no Brasil pelo underground na América do Norte

Ainda sem o aguardado disco solo, o ex-Los Hermanos excursiona com Devendra Banhart e Fabrizio Moretti, do Strokes; saiba como foi o show em Montreal nesta semana

Alinne Rodrigues, de Montreal Publicado em 07/06/2013, às 15h47 - Atualizado às 17h55

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Rodrigo Amarante em show nos Estados Unidos - Guillermo Prieto do IROCKPHOTOS, tirada no Pappy and Harriet's
Rodrigo Amarante em show nos Estados Unidos - Guillermo Prieto do IROCKPHOTOS, tirada no Pappy and Harriet's

Deveria ter começado pelo Brasil, mas a turnê solo de Rodrigo Amarante estreou nos Estados Unidos. O que era para ser no mês de abril, em Recife, aconteceu em maio, em Aspen, no Colorado, e Cavalo, o primeiro disco solo do hermano, ganhou versão ao vivo em 14 palcos norte-americanos e canadenses até chegar a Montreal, onde a Rolling Stone acompanhou o show na última quarta-feira, 5.

Os ingressos antecipados esgotaram-se um mês antes da data. Não por Amarante, que conseguiu uma boa projeção internacional com a banda Little Joy, mas por Devendra Banhart. Depois de um colaborar no novo álbum do outro (o de Devendra, Mala, foi lançado recentemente), decidiram sair juntos dividindo o palco e compartilhando a banda: Fabrizio Moretti (The Strokes), Todd Dahlhoff (Electric Guest) e Josiah Steinbrick (The Moor) se revezam entre guitarras, baixo, sintetizadores e bateria.

Às 20h15, os fãs de Devendra já enchiam o centenário e intimista Virgin Mobile Corona Theatre, no centro de Montreal. Foi a essa hora que o brasileiro entrou no palco, de calça social, blazer de ombreiras e a indefectível barba. Em silêncio, pegou um violão pequenininho e começou a cantar "Irene": "Saudade, eu te matei de fome/ e tarde eu te enterrei com mágoa/ se hoje eu já não sei teu nome/ teu rosto nunca me deu trégua".

O lamento seguiu sem refrão, de um só fôlego, curto, e roubou o coração da plateia de Quebec. "Rodrrigô Amarrantê", como se apresentou ao público, puxando um sotaque em francês, foi ovacionado de primeira. "Vous êtes très gentils" ("vocês são muito gentis", em tradução livre), agradeceu. "I'm Ready" manteve o clima trovadoreiro do show, com letra em inglês e português.

A terceira canção do setlist foi "Evaporar", que encerra o álbum do Little Joy, reconhecida por alguns no Corona. Ainda sozinho, Rodrigo recebeu reforço de Moretti, Dahlhoff e Steinbrick para o backing vocal. O trio entrou no palco correndo, se reuniu em torno de um microfone, cantou e saiu imediatamente, fazendo graça. Eles estavam se divertindo, não há dúvida, e o público também.

Enquanto Amarante conferia a afinação do violão, os músicos assumiram as posições. Moretti tocou teclado e sintetizador, a bateria ficou com o baixista Dahlhoff, e o baixo, com o guitarrista Steinbrick. "Nada é em vão/ no espaço entre eu e você/ (...) Quando eu vejo você/ me olhando assim/ vendo em mim/ o que eu vejo em ti", cantou Amarante em "Nada". Letra bonita, arranjos de piano e violão com jeito romântico, um "nanana" no meio e um assovio: um hit completo e irresistível.

Ainda sem falar muito com o público, ele emendou a já conhecida "O Cometa", que chegou a apresentar na turnê mais recente com o Los Hermanos. Os multi-instrumentistas assumiram os postos originais, trocando de posição de novo na música seguinte, "Mon Nom", um quase-rock em francês com sintetizador e cowbell.

O ponto alto do show foi "Maná", primeira faixa finalizada e divulgada de Cavalo. O clima tropical esquentou a noite da primavera canadense. Amarante colocou os gringos pra dançar (e tocar) a mistura tão brasileira. Com um "saravá!", partiu para a despedida, "The Ribbon", sozinho no palco.

Foram oito músicas e 30 minutos de show. Depois de fazer parte de uma das bandas mais importantes da última década no Brasil, Amarante dá um reset na carreira e recomeça como artista de abertura e músico de apoio, e está muito bem. Se no próprio show ele pareceu meio tímido e pouco falante, ao lado de Devendra se soltou. Tocou clarinete, sintetizador e até fez dancinhas malucas com a guitarra em punho. Conquistou pela simpatia.

O show com Devendra

O freak folk que tornou Devendra Banhart conhecido está sumindo. Em Mala, ele deixa o clima hippie para trás e passeia com desenvoltura por todas as camadas que pode ter a música indie. “Caetaneia” de monte – o vocal de "Golden Girls", que abre o show, é uma amostra – e “amaranteia” um tanto também. Ao ouvir as músicas de Cavalo e Mala, é possível perceber como um artista influenciou o outro. "Mi Negrita", também no repertório, é uma que Rodrigo compôs em parceria.

Para não deixar passar em branco, Devendra parou o show e agradeceu Amarante pela turnê, esse cavalheiro que ele ama muito, com quem trabalhou bastante e que logo, logo, como ele disse, lança um disco. "Abram os olhos e os ouvidos", brincou. Ao final de uma hora e meia de show, o quinteto era só alegria. Cruzando o palco para sair de cena, Amarante se despediu do público com empolgação e de Devendra com um tapa no traseiro.

Sem Cavalo e com máquina de escrever

A turnê começou mesmo sem o disco de Rodrigo Amarante, Cavalo, que permanece inédito. De merchandising, só um pôster minimalista da turnê, com os nomes dos álbuns, Cavalo e Mala, e dos músicos.

Para os fãs brasileiros acompanhando a perna norte-americana, uma lembrança diferente é poder datilografar em uma folha de papel almaço amarelada o nome e o e-mail para Amarante. Escrita na própria máquina de escrever (veja foto), a mensagem dele: "Thank you for listening. Use L for 1. 2 is sticky but works. Leave your name and email address and I'll send you some music. Be gentle and slow. No need to pound it. Use Å for @" (Obrigado por ouvir. Use L para 1. 2 é grudento, mas funciona. Deixe seu nome e email, e eu te mando umas músicas. Seja gentil e devagar. Não precisa apertar com força. Use Å para @). Cobrindo a marca da máquina, havia um adesivo de etiquetadora vintage com o nome Rodrigo Amarante.

A parte engraçada é que, mesmo com tantas recomendações, a máquina de escrever já não funcionava direito. O papel ainda era o do show de Vancouver, que aconteceu no último 26 de maio. Sabendo disso, o músico deixou uma outra folha amarelada de almaço onde escreveu "Rodrigo", o local e a data. Avisou à moça do bar que quem fosse procurar o disco do cara que abriu pro Devendra Banhart deixasse o e-mail ali. É o underground de novo, com um pouco mais de pompa, claro, mas com a simplicidade e o conforto do anonimato que seriam impossíveis em casa.

Nesta sexta, os músicos se apresentam em Boston. Depois passam por Washington, Filadélfia, Nova York e partem para a Europa, começando em Dublin, no dia 26 de junho, e terminando em Lisboa, dia 3 de agosto. A turnê volta para Los Angeles em 24 de agosto e promete chegar ao Brasil até o fim do ano. Ainda demora, mas vai valer a pena esperar.