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Resenha: LCD Soundsystem retorna com jams incríveis e tratando de medo e morte

Banda de punk-disco de Nova York volta do hiato de cinco anos com o disco American Dream

Rob Sheffield Publicado em 01/09/2017, às 19h37 - Atualizado às 23h50

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James Murphy durante show do LCD Soundsystem no Lollapalooza Chicago de 2016 - Amy Harris/Invision/AP
James Murphy durante show do LCD Soundsystem no Lollapalooza Chicago de 2016 - Amy Harris/Invision/AP

The time has come, the time has come, the time has come today. O LCD Soundsystem finalmente retornou de um misterioso hiato de cinco anos que eles nunca conseguiram explicar exatamente, apesar de terem feito um importante documentário (Shut Up and Play the Hits) para isso. Do jeito que as coisas costumam ser em termos de términos de banda no rock, era tão provável quanto a sexta despedida de Cher.

James Murphy e sua trupe de saqueadores punk-disco de Nova York não desperdiçam um momento no soberbo American Dream. O novo álbum da banda é um conjunto de músicas insaciável, expansivo e enlouquecedoramente engraçado, sobre como uma vida inteira de boas intenções e trabalho duro pode ir por água abaixo e virar uma bagunça. Nos Estados Unidos de 2017, não é apenas uma questão para roqueiros de meia-idade.

O LCD Soundsystem está brincando com a história ao fazer músicas novas, já que eles acabaram depois de três dos melhores álbuns do século: o debute lotado de hits de 2005, o grandioso apogeu em Sound of Silver, de 2007, e a magistral despedida em This Is Happening, de 2010. É uma discografia sem falhas que qualquer um teria se esforçado para não manter intocada. Mas American Dream está no mesmo nível. James Murphy cava fundo nos escombros que vê ao redor, tanto política quanto emocionalmente, mesmo que a mensagem dele para o país seja a mesma que a mensagem dele para o espelho: “Você é péssimo no quesito autopreservação.”

Murphy não faz coisas do tipo “Drunk Girls” ou “North American Scum” aqui – sem sacadinhas leves e inteligentes para os ganchos. Em vez disso, American Dream tem dez faixas complexas: um apressado eletro-funk espremido na duração oldschool de CD (70 minutos), resistentemente insistindo para que você invista tempo para pegar todos os detalhes.

O LP vai do tecladinho abafado e do cantar melódico de “Oh Baby” à batida extremamente 1985 de “I Used To”. “Other Voices” raspa no Talking Heads, com um rabisco de guitarra a la Adrian Belew e um rap da maga dos teclados Nancy Whang, que canta: “Isso é o que está acontecendo e está te deixando louco/ Ouvi isso, ouvi isso e soa como os anos noventa.”

O coração de American Dream é o groove de quatro músicas que passa por “How Do You Sleep?” e “Tonite” e cresce até as duas faixas anteriormente lançadas como singles (e tocadas no Saturday Night Live), “Call the Police” e “American Dream”. Não são apenas as quatro melhores canções do álbum: elas fluem juntas como um amálgama de 28 minutos sobre os terrores da vida adulta em tempos perigosos.

“How Do You Sleep?” é Murphy gritando em “modo Bono” sobre algum tipo de traição pessoal (“Você me avisou sobre a cocaína/ E aí mergulhou de cabeça”). “Tonite” é uma sátira animada do (gênero) disco, com a letra: “Estes filhos malvados dos fabulosos/ Rifando edições limitadas de tênis”. Mas o LP também encara a mortalidade, com Murphy interrompendo seu desabafo para dizer: “Oh, querido deus, soo como minha mãe.”

“Call the Police” surge como algo da “era-Brian Eno” de David Bowie, com batidas motorik e tinidos de guitarras, com Murphy tentando diagnosticar a doença que vê em toda a cultura: “Espalha-se como um vírus e entra na nossa pele/ O primeiro indício nos divide, o segundo está se mudando para Berlim.”

“American Dream” sumariza tudo com uma balada tipo Kraftwerk ao mesmo tempo cômica e bizarramente comovente, em que Murphy canta sobre como envelhecer pode parecer uma constante viagem de drogas. O álbum chega ao fim com “Black Screen”, um lamento eletrônico de 12 minutos de um homem de meia idade lendo e-mails antigos e tentando lembrar-se dos amigos, da carreira e da vida inteira como se fossem algo mais do que sinais em uma tela brilhante. O fim é um solo de piano pitoresco e à moda antiga – um toque humorístico que é também extremamente aflitivo.

Ao contrário de outros roqueiros em certa idade, Murphy nunca soa como se estivesse preso à sua juventude perdida – talvez pelo fato de que já tinha mais de 30 quando o LCD Soundsystem ganhou destaque. Quinze anos atrás, no clássico single de estreia, “Losing My Edge”, Murphy basicamente inventou sozinho uma categoria: a Geração X reclamar de jovens que nem eram “millennials” ainda, só mais jovens e bonitos e inteligentes e legais e... que saco esses caras.

Ele zombou dos típicos habitantes do Brooklyn que frequentavam escolas de arte, cheios de “nostalgia alheia pela década de 1980, da qual eles não se lembram” (“Losing My Edge” soa ainda mais engraçada e esquisita agora que estamos em meio a uma onda de nostalgia alheia dos anos 2000). Em certa altura de “Tonite”, ele faz uma educada perguntinha: “E o que é que você faz mesmo?”, e entrega a resposta em meio a uma viagem de distorções: “Ah, eu sou um lembrete, um veterano manco da inquisição da loja de discos… com meu próprio ar desfalecido de divagações de meia-idade.”