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O mamilo e o estrago que foi feito: o declínio de Janet Jackson pós-Super Bowl

A carreira de Justin Timberlake foi retomada depois que ele pediu desculpa por expor o mamilo da cantora, mas a senhorita Jackson nunca se recuperou do “acidente de figurino”

Hillary Crosley Publicado em 05/02/2018, às 12h36 - Atualizado às 12h45

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Janet Jackson e Justin Timberlake - AP
Janet Jackson e Justin Timberlake - AP

Em 2004, eu fui uma das milhões de pessoas sortudas que viram em tempo real quando o seio de Janet Jackson saiu para fora da blusa dela pelas mãos de Justin Timberlake. A imagem que mostrou o mamilo dela coberto por uma jóia foi visível apenas por um segundo, mas esse “nip slip” [como eles chamam quando uma mulher deixa o mamilo escapar para fora da roupa] teve um impacto extremo no show do intervalo do Super Bowl por anos. Com exceção de Prince tocando “Purple Rain” na chuva, os produtores estavam seguindo o caminho seguro com as lendas do rock (Paul McCartney em 2005, Rolling Stones no ano seguinte, Bruce Springsteen e The Who logo depois). A diversão contemporânea havia acabado ali e tivemos que aturar a lenta morte pública de Janet Jackson, superstar negra do pop. E por que? Por um duvidoso “acidente de figurino”? [O termo original, que ficou conhecido no mundo todo, é “wardrobe malfunction”, que seria um mau funcionamento do figurino].

Desde a chegada de seu primeiro estouro, em 1986, o single e álbum Control, Jackson reinou como uma força da natureza da indústria musical. Ela desafiou os limites da música com vídeos complexos, como "Rhythm Nation" (1989), e desafiou normas sexuais com o picante "Any Time Any Place". Janet até mesmo foi capa da Rolling Stone EUA, sem blusa, usando apenas as mãos do então-marido Renee Elizondo para se cobrir.

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O poder dela como celebridade começou a decair com o lançamento de All for You (2001), época quando deixou de trabalhar com sua coreógrafa de longa data, Tina Landon. Mas aquilo que já tinha estabelecido com discos e músicas de sucesso ajudou a cantora a manter sua marca. Madonna, Mariah e Janet dominaram a música pop no início da década passada enquanto iniciantes como Britney, Ashanti e Beyoncé ficaram nas periferias, fazendo o que podiam.

Em casa, Janet era a segunda maior estrela da família real do pop, os Jackson, logo depois de seu irmão mais velho, Michael. Mas depois que seu seio deu um alô a quase 89 milhões de telespectadores e, possivelmente, se tornou uma inspiração para a criação do YouTube, a estrela do pop foi injustamente crucificada. Timberlake, um artista solo relativamente novato tentando se livrar das raízes de integrante de boy band — e o cara que de fato expôs o seio de Janet – pediu desculpa publicamente e cortou laços com Janet, mesmo depois de ela ter ajudado a carreira dele, aparecendo em seu primeiro disco, Justified. Talvez o fato de ter pedido desculpa logo tenha salvado Timberlake de se queimar. Ou talvez a sociedade já tivesse começado uma caça às bruxas com Janet porque ela é uma mulher negra nos EUA, e por mais que a gente tente excluir a questão das raças da nossa vida, estereótipos e as conseqüências prejudiciais deles nos atormentam.

No livro Sister Citizen, a Dra. Melissa Harris-Perry escreve que mulheres negras estão o tempo todo tentando ficar em pé e retas em uma sala entortada por estereótipos e fatores sócio-econômicos que podem colocá-las em desvantagem. Janet pode ter pensado que o escândalo todo [apelidado de Nipplegate, uma referência a Watergate] tenha sido apenas um “acidente de figurino”, mas o flash de nudez foi além disso: ela tinha, sem querer, começado um clichê sinistro a respeito da sexualidade de mulheres negras — a ideia de que mulheres negras são seres sexuais irracionais que precisam ser controlados e detidos. Janet aceitou a culpa do Nipplegate sozinha — todo mundo associado com a produção afirmou que não sabia de nada e, após um pedido de desculpa vago, Timberlake nunca mais falou sobre o assunto.

O álbum seguinte de Janet, Damita Jo, quase não tocou nas rádios e teve seus vídeos exibidos tão pouco na MTV que muita gente presumiu que ela tivesse sido banida da empresa que tinha produzido o infame show do Super Bowl. A CBS tomou uma multa de US$ 550 mil e cortou laços com a MTV. Enquanto Jackson queimava profissionalmente na fogueira, o disco de 2012 de Timberlake chegou ao topo das paradas e ganhou o Grammy - apesar de muitos na comunidade afro-americana terem ficado chateados com o cantor por ele até mesmo ter ido à premiação, depois que Jackson foi basicamente desconvidada dela por ter se recusado a pedir desculpa durante a cerimônia.

Anos depois, Timberlake admitiu que estava errado de ter desertado Jackson – e ela própria chegou a entregar que não era essa a atitude que esperava de um amigo. Mas àquela altura já não importava mais. Janet, a estrela global, adorada por causa de “If” e Poetic Justice, agora era odiada por causa do Nipplegate de 2004.

Hoje em dia, Jackson provavelmente é mais conhecida por fãs do ator Tyler Perry graças a seus papeis na cinessérie Por Que eu Me Casei?. Em 2013 ela anunciou – ou talvez tenha sido quando a mídia descobriu – que ela estava casada com o bilionário do Qatar Wissam Al Mana. Tenho certeza de que está vivendo uma vida boa. Fico feliz por ela, mas como uma fã olhando para o passado, fico triste e brava. A mulher que ajudou a construir o mesmo trono onde está Beyoncé é lembrada não por sua glória, mas por sua tragédia. E isso não está nem perto de ser justo.

Em 2018, Justin Timberlake voltou ao palco do Super Bowl, praticamente sem sentir nenhum tipo de impacto devido à polêmica de 14 anos atrás. Janet Jackson até voltou a lançar músicas, mas recentemente enfrentou problemas de saúde.

***Texto assinado por Hillary Crosley (do site o site Jezebel), publicado originalmente em 2014