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O saudoso Lou Reed desafiava a música sem medo e como poucos

É corriqueiro vermos músicos desafiando a moda, mas poucos têm coragem e competência para fazer isso com a música em si

Miguel Sokol | Ilustração: Gabriel Góes Publicado em 30/06/2015, às 19h32 - Atualizado às 19h42

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Brincadeira do Copo
Brincadeira do Copo

Você vê um copo com água até a metade e enxerga que ele está meio cheio ou meio vazio? Difícil adivinhar, mas se o famigerado copo for o disco Lulu, do Lou Reed em parceria com o Metallica, é fácil: todo mundo vê um copo absolutamente vazio. O álbum foi achincalhado pela crítica: “Lulu chega ao inimaginável fundo do poço”. “Não é apenas a pior coisa que cada um dos envolvidos já fez, é candidato a pior de todos os tempos.” “Soa como o amigo bêbado do seu pai recitando pornografia enquanto toca uma velha fita do Metallica.”

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A sentença estava dada, o disco do Lou Reed com o Metallica estava condenado a apodrecer na prateleira dos maiores erros musicais da história. Estava! Pois na última cerimônia do Hall da Fama do Rock, Laurie Anderson, viúva de Lou, fez uma revelação no discurso de indução do marido. Ela contou que David Bowie, reservadamente, lhe afirmou: “Lulu é a obra-prima do Lou”.

Há quem aposte que a afirmação do Bowie seja uma sacanagem, a última dele com Lou. Outros preferem acreditar que se trata somente do prazer de discordar da unanimidade. Eu duvido e me pergunto: o que David Bowie viu no Lulu? Viu o que de mais corajoso e raro um músico pode fazer, David Bowie viu em Lulu um músico desafiando a música.

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É corriqueiro vermos músicos desafiando a moda. Outro dia, Rihanna não apareceu vestida de gema de ovo no MET Gala? E a Lady Gaga, que trajou um histórico vestido de carne? Se as duas hipoteticamente se trombassem, eu chamaria a trombada de steak tartare fashion. Também é corriqueiro vermos músicos desafiarem o marketing, vide a camiseta contra a homofobia que Tyler, The Creator criou: um símbolo neonazista com as cores do arco-íris. Músicos desafiam o marketing, a moda, o status quo e até governos. Mas poucos têm coragem e competência para fazer isso com a música em si.

Lou Reed desafiava. Em 1975, ele quase acabou com a própria carreira com Metal Machine Music, álbum duplo com quatro faixas feitas de puro barulho. O disco gerou críticas ainda mais destrutivas que as de Lulu, sendo que a preferida de Lou terminava assim: “Músicas recomendadas: nenhuma”.

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Por que diabos alguém realiza algo assim? Porque alguém precisava realizar, oras! Segundo Lou, “agora que está feito, qualquer coisa pode ser feita”. Quem procurar um disco convencional em Metal Machine Music ou Lulu simplesmente não vai encontrar, mas, para nossa sorte, há gente como Bowie, que olha para um copo com água até a metade e não vê copo nem água, vê arte.