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Gilberto Gil, Lobão, Maria Gadú, Lupicínio Rodrigues e outros artistas cantando o tempo

Redação Publicado em 12/03/2012, às 11h42 - Atualizado às 12h27

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Gilberto Gil foi um dos responsáveis pela difusão da cultura digital - Reprodução/Site Oficial
Gilberto Gil foi um dos responsáveis pela difusão da cultura digital - Reprodução/Site Oficial

Por Cláudia Boëchat

De todas as canções que falam de tempo, uma é a minha preferida. Parece que Gilberto Gil a escreveu para mim. Cada verso soa como um recado para mim. Pretensiosa, não é? Pois é. Infelizmente, porém, não tive essa sorte. Gil escreveu a música para o mundo. Creio que ela fala a todos, e cada um sente a canção de um jeito próprio.

“Cada Tempo em seu Lugar” (Gilberto Gil), gravada em 1989:

Cada tempo em seu lugar

Preciso refrear um pouco o meu desejo de ajudar

Não vou mudar um mundo louco dando socos para o ar

Não posso me esquecer que a pressa

É a inimiga da perfeição

Se eu ando o tempo todo a jato, ao menos

Aprendi a ser o último a sair do avião

Preciso me livrar do ofício de ter que ser sempre bom

Bondade pode ser um vício, levar a lugar nenhum

Não posso me esquecer que o açoite

Também foi usado por Jesus

Se eu ando o tempo todo aflito, ao menos

Aprendi a dar meu grito e a carregar a minha cruz

Ô-ô, ô-ô

Cada coisa em seu lugar

Ô-ô, ô-ô

A bondade, quando for bom ser bom

A justiça, quando for melhor

O perdão:

Se for preciso perdoar

Agora deve estar chegando a hora de ir descansar

Um velho sábio na Bahia recomendou: "Devagar"

Não posso me esquecer que um dia

Houve em que eu nem estava aqui

Se eu ando por aí correndo, ao menos

Eu vou aprendendo o jeito de não ter mais aonde ir

Ô-ô, ô-ô

Cada tempo em seu lugar

Ô-ô, ô-ô

A velocidade, quando for bom

A saudade, quando for melhor

Solidão:

Quando a desilusão chegar

Sabe o que é curioso? É que Gil compôs essa canção com sentimentos bem diversos dos que desperta em mim e em uma realidade completamente diferente. Olha o que ele escreveu em seu site sobre a música:

"Um autorretrato autocrítico.

O começo versa sobre a atuação política no mundo; a ilusão de que a transformação pode ser feita segundo o seu lema, sua imagem; de que ela não é um processo lento, contraditório, cheio de altos e baixos e de vaivens, ao invés de um escorrer no tempo; e o fato de que muitas vezes ela é imperceptível, misteriosa, e o afã humano de que ela seja algo dominável é uma panacéia, coisa das ideologias. Muito a ver com eu ter ido para a política, tentar dar uma contribuição, como gratificação egoísta de desejo.

Eu tinha passado pela Secretaria de Cultura, tentado a Prefeitura, vivido dois anos intensamente conflituosos da vida política em Salvador. Estava na Câmara quando compus a música. Há nela um tom de lamento de “The Fool on The Hill”: o homem solitário, na montanha, apreciando o mundo louco; louco, também, de vê-lo e ser parte dele.

Na segunda estrofe, outra autocrítica: à mania de bondade. E na última, à irracionalidade do ímpeto como algo de eficácia indiscutível; à pretensão de que do impulso decorra tudo que se quer (ali, também, uma referência oculta a Caymmi: 'Um velho sábio na Bahia').

“Cada tempo em seu lugar”: pra passar mais uma vez essa ideia de indissociabilidade do tempo-espaço, de que eu gosto muito.”

Depois que ouço essa canção, imediatamente me ocorre uma outra do Gil sobre o tempo (aliás, ele deve ter diversas sobre esse tema), gravada em 1984: “Tempo Rei”.

Ouça na interpretação de Lobão:

E, nesse tema, não poderíamos deixar de citar “Oração ao Tempo” (Caetano Veloso), gravada em 1979 e regravada por um monte de gente.

Na interpretação de Maria Gadú, é trilha de abertura da novela global A Vida da Gente:

Mudando de linha, vamos para “Esses Moços, Pobres Moços”(Lupicínio Rodrigues). Belíssima. Um clássico da música popular brasileira. Lupicínio nasceu em Porto Alegre em 1914 e morreu um mês antes de completar 60 anos. Essa canção fala do passado.

Lupicínio fez uma outra no mesmo estilo, em parceria com Alcides Gonçalves, que Elis Regina, como sempre, colocou na lista das canções que devem ser ouvidas com atenção especial. A história é também dramática. Se a letra fosse ‘um tom acima’ poderia ser um tango...

Aqui está “Maria Rosa”, gravada por Elis em 1974:

Paulinho da Viola compôs “Sinal Fechado” em 1969 e parece que foi hoje, quando a correria urbana nos rouba o tempo de conversar como se deve, sem pressa. Veja a interpretação de Chico Buarque e Maria Bethânia:

Como se fosse uma continuação dessa música, Aldir Blanc e João Bosco compuseram “Transversal do Tempo”, que ganhou fama também na voz de Elis, em 1977. Tanto que ela se apresentava juntando as duas músicas. Por ser Elis, vale a repetição. Sempre. Ouça a canção em um show em Lisboa:

O mundo de trás para frente. Chico criou a primorosa “Futuros Amantes”, gravada em 1993, que não podemos deixar de ouvir.

Mudando totalmente de estilo, vamos ouvir Rita Lee e Paulinho Moska. Em “Baila Comigo”, gravada em 1980, a roqueira fala de seus desejos para o fututo e, em uma balada, canta que quer morrer bem velhinha assistindo de camarote quando a bomba estourar. Eu também.

Paulinho Moska, por sua vez, canta “O Último Dia”, feita em parceria com Billy Brandão em 1995. Pinta um cenário absolutamente livre, do jeitinho que eu gosto. Ouça as duas:

E você? O que fará se o mundo se acabar mesmo em 2012? Já pensou nisso? E as lembranças do passado que te atormentam? Se pudesse faria tudo diferente?

Ah, vamos parar com esse ‘papo-cabeça’ e cantar, cantar e cantar para os males espantar. “É melhor ser alegre que ser triste, a alegria é a melhor coisa que existe, é assim como a luz no coração...” Mas essa é uma outra história...

Para falar com Cláudia Boëchat, escreva para cboechat@uol.com.br