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Lindos, Sujos e Malvados

Gossip Girl, o seriado mais sexualmente subversivo da televisão, mostra as últimas pessoas nos Estados Unidos que vivem como em um glamuroso conto de fadas

Por Jason Gay Publicado em 13/04/2009, às 12h01 - Atualizado em 22/01/2013, às 17h28

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LIBERTINOS
(A partir da esquerda): Chace Crawford (Nate), Taylor Momsen (Jenny), Blake Lively (Serena), Penn Badgley (Dan), Leighton Meester (Blair), Jessica Szohr (Vanessa), acima, e Ed Westwick (Chuck) - TERRY RICHARDSON
LIBERTINOS (A partir da esquerda): Chace Crawford (Nate), Taylor Momsen (Jenny), Blake Lively (Serena), Penn Badgley (Dan), Leighton Meester (Blair), Jessica Szohr (Vanessa), acima, e Ed Westwick (Chuck) - TERRY RICHARDSON

"Sério, em toda entrevista alguém me pergunta: ‘Você é mesmo amiga da Blake?’", desabafa Leighton Meester. É uma tarde fria em Nova York e Meester, 22 anos, atriz que interpreta a cruel Blair Waldorf, está sentada em uma mesa do La Bottega, um restaurante italiano próximo ao Meat Packing District, em Manhattan. Ela usa um suéter cinza, jeans e óculos de aro grosso preto, do tipo que com certeza seria motivo de piada para a rica e esnobe personagem que encarna em Gossip Girl. “É claro que você não é amiga da Blake”, responde Blake Lively, agarrada a Meester. Um turbilhão de cabelos louros vestido em um suéter azul claro, Lively, também de 22 anos, faz Serena van der Woodsen, melhor amiga de Blair Waldorf e rebelde regenerada que serve como termômetro oscilante da moral no seriado. “Somos muito próximas. Somos amigas”, confessa Meester. “Não consigo imaginar qualquer motivo para que as pessoas pensem o contrário.”

Certo, mas todo mundo sabe que toda vez que um seriado com elenco predominantemente feminino faz sucesso, começam os boatos de ódio entre as protagonistas. Por exemplo, Grey’s Anatomy. As mulheres devem perseguir umas as outras em volta da mesa de operação, empunhando bisturis. As de Desperate Housewives? Uma envenena o Botox da outra. E as de Sex and the City? Costumam se espancar usando seus massageadores Hitachi Magic Wand.

Não seria um caso de sexismo? Porque o trio de atores de Gossip Girl – Penn Badgley, 22, Chace Crawford, 23, e Ed Westwick, 21 – também foi catapultado ao estrelato e se tornou sensação, mas ainda assim escapou quase ileso da onda de fofocas – tirando o rumor previsível de que são todos gays. “Claro”, diz Lively. “Você nunca ouve alguém dizer que Ed e Penn têm inveja um do outro. Mas garotos podem ser tão competitivos quanto garotas.” “Os caras só pensam em seus próprios cabelos”, afirma Meester. “E nas sobrancelhas”, complementa Lively, balançando um garfo.

Ainda assim, é bom fazer parte de Gossip Girl. No mundo fora do La Bottega, Nova York está implodindo, vítima de uma catástrofe financeira causada por ela mesma. Ex-investidores do mercado financeiro agora entregam pizzas e as verdadeiras socialites do Upper East Side escondem suas compras da Hermés em sacolas de supermercado com medo de serem vistas gastando tanto em tempos tão difíceis. Mas, como insetos preservados em âmbar, Gossip Girl mostra um mundo de fantasia em que jovens não veem a menor diferença entre pagar US$ 18 em um drinque ou 700 em sapatos de salto assinados pelo estilista Christian Louboutin. Não que elas não sintam os efeitos da crise vez ou outra. “Estava na Barney, onde tinha uma venda especial de sapatos”, explica Lively. “Havia esse par de botas que queria já há um tempão. E tinha um de outra cor. Uma mulher chegou para mim e disse: ‘Nem ouse comprar outro par de botas com a economia do jeito que está. Você devia se envergonhar’. E eu pensando: ‘Não acredito que ela está me dando uma bronca’.”

Gossip Girl, baseado em uma série de livros para adolescentes escrita por Cecily von Ziegesar, é um drama televisivo criado por, e com produção executiva de, Josh Schwartz e Stephanie Savage, que já tinham trabalhado juntos em outro drama teen, The OC. Enquanto a antecessora seguia os passos de um grupo de garotos banhados pelo sol, despejando melancolia pelas praias da Califórnia, Gossip Girl é ambientado em um terreno mais volátil e venenoso: escolas particulares no Upper East Side, em Manhattan. Os personagens, a maioria privilegiados da Park Avenue, frequentam duas escolas – Constance Billard (para garotas) e St. Jude (para garotos) – separadas apenas por um pátio arborizado. Serena (Lively) é a ex-garota mais popular da escola, que desapareceu misteriosamente do campus e, ao retornar, encontrou a despeitada ex-melhor amiga, Blair (Meester), ocupando seu antigo posto. Há rapazes de boa índole como Dan Humphrey (vivido por Badgley), carinhas bonitas como Nate Archibald (Crawford), víboras carismáticas como Chuck Bass (Westwick), irmãos precoces como Jenny Humphrey (Taylor Momsen) e Eric van der Woodsen (Connor Paolo), pais tarados, uma criada polonesa ocasionalmente explorada (Zuzanna Szadkowski), e uma narradora cuja identidade é desconhecida (e que dá nome ao seriado). Mas nada disso importa – o que os fãs realmente adoram é o tom assumidamente decadente: jovens lindos esbanjando dinheiro, vestindo-se fabulosamente, apunhalando uns aos outros, aprontando em suas limusines, cheirando cocaína e enchendo a cara como versões adolescentes de Peter O’Toole. Gossip Girl é praticamente revolucionário em sua opção de não moralizar nada. Há poucas personagens puramente boas ou más, nada de sermões dados pelos pais (que costumam ser mais desajustados do que os próprios filhos) ou lições de moral no fim do episódio. Na série, “Gossip Girl” é o nome de um site de autora anônima que relata diariamente os escândalos de Constance Billard e St. Jude. Todos se mantêm antenados com a página virtual via mensagem de texto – quem está traindo Serena, quem tem um meio-irmão secreto, quem fumou haxixe. É como o novo observador da vida adolescente – o que não está em algum blog ou se não foi comentado por mensagem de texto é porque não aconteceu.

E é também a tecnologia o que, em parte, explica porque Gossip Girl é mais que um sucesso qualquer na TV. Em média, um episódio atrai cerca de 3 milhões de telespectadores nos Estados Unidos (segundo o Instituto Nielsen), mais ou menos um quarto da audiência que acompanha Jennifer Love Hewitt e seus contatos com o além em Ghost Whisperer. Os executivos da CW, a rede que exibe Gossip Girl, colocam a culpa dos baixos índices no inadequado sistema de medição, que não inclui as pessoas que assistem em grupos, online ou baixando episódios do iTunes, em que a série frequentemente é vista em primeiro lugar. “A gente acorda, vê o relatório da audiência e pensa; ‘Nossa, é muito pouco’”, reconhece Schwartz – nativo de Providence, Rhode Island –, que lançou The OC quando tinha apenas 26 anos. “Mas, quando você ouve as pessoas falando do programa, estranha. A reação à série parece muito maior do que a audiência.”


A verdade é que ou você ama ou odeia Gossip Girl. Se ama, então é louco por ele. A mania pelo seriado não pode ser medida por números – está mais para algum tipo de obsessão. E ninguém gosta mais disso do que as estrelas da série, que se mudaram em massa para Nova York no verão de 2007 e, segundo Lively, moram “em um raio de cinco quarteirões de distância uma da outra”, no centro de Manhattan. Todos se tornaram parte de um experimento metassocial: jovens lindos vivendo em Nova York interpretando jovens lindos vivendo em Nova York. “Às vezes fica difícil perceber onde acaba o show e começa a realidade”, admite Schwartz. “Cheguei no set um dia e um cara enorme, de mais de 1,90 m veio na minha direção. Não lembrava de nenhum personagem assim no roteiro”, conta Jessica Szohr, 24, ex-modelo de uma loja de departamentos de Wisconsin que faz a descolada namorada de Nate, Vanessa Abrams. “Aí ele me disse: ‘Sou seu guarda-costas’. Então viramos uma esquina e havia centenas de meninas.”

Não que os adolescentes reais considerem o seriado uma transcrição literal da realidade. “Os pais podem pensar: ‘Meu Deus, a vida da minha filha é assim?’”, admite Anna, jovem estudante de uma escola particular, em uma das locações do seriado, a Madison Avenue. “Mas ninguém faz baladas daquele jeito.” Uma das amigas de Anna explica ainda melhor: “Ninguém pode tanto”. A poucos metros dali, Meester está parada na 73rd Street, chapéu marrom, jaqueta xadrez, uma bolsa vermelha Isabella Adams e um belo par de sapatos de salto Pour La Victoire. As duas garotas tentam espiar.

- “Não é ela.”

- “É a dublê de corpo.”

- “Não, é ela.”

Um suspiro preenche o ar gelado quando surge a própria rainha Blair (Queen B, como é conhecida na tela) com seus cachos e suas roupas estilosas. Meester parece ter nascido para interpretar uma futura socialite do Upper East Side. Mas a trajetória que a levou de desconhecida a Gossip Girl lembra muito um radical e improvável conto de fadas. Em pessoa, ela é casual e despretensiosa, mais simples e debochada que a temperamental Blair – “Leighton é quase um moleque”, conta Crawford. “Ela sabe se divertir.” O único vestígio de sua privilegiada personagem é um anel em formato de coração que pertence a Blair, mas que ela usa o tempo todo porque morre de medo de perder.

Quando era criança, leighton meester suspeitou que havia algo diferente a respeito de seu nascimento. Tinha ouvido fragmentos de conversas entre parentes com o passar dos anos, mas ninguém tinha dito nada explicitamente a ela até um dia em sua escola na cidade de Marco Island, Flórida. “Uma colega veio: ‘Sei de uma coisa sobre você’, relembra Meester. “Ela me levou ao banheiro e contou: ‘Você nasceu na cadeia’.” “Na hora, mandei se foder”, conta rindo. “Nem sabia o que significava ‘se foder’. Assim que vi minha mãe de novo, perguntei se tinha nascido na cadeia.” Tecnicamente, não. A mãe de Meester, bem como sua tia e avô, foi presa por tráfico de maconha no começo dos anos 80. A acusação alegava que o grupo tentava trazer da Jamaica para os Estados Unidos mais de meia tonelada da droga. O pai de Meester também foi condenado por posse. Sua mãe, Connie, pegou dez anos na penitenciária federal do Texas – na época, já estava grávida de Leighton. “Ela cumpriu parte da pena enquanto estava grávida”, diz a filha. Mas, quando Connie estava pronta para dar à luz, foi movida para outro setor e teve Leighton em um hospital, em abril de 1986. Três meses depois, voltou à prisão e Leighton foi viver com sua avó. Connie seria solta mais tarde, após cumprir 16 meses de cárcere. “É tão excitante que devia virar filme”, roteiriza Meester. “Ela tinha praticamente a minha idade quando foi presa.”

Os pais de Meester, que entraram no ramo imobiliário depois da prisão, se divorciaram quando ela tinha 6 anos. Assim, ela viveu entre a casa da mãe e do pai, atuando em um teatro local em Marco Island nesse meio tempo. Sua carreira começou a deslanchar aos 10 anos e sua mãe arranjou uma entrevista com um caçador de talentos que trabalhava para agências de modelos e de produções artísticas em Nova York. Não demorou até que ela e seus dois irmãos mudassem para Nova York. “Fomos morar em um lugar chamado Park Terrance”, conta. “Achávamos que ia ser chique. Mas foi assustador. Havia ratos mortos. A gente tinha medo de abrir os armários, podia muito bem ter um corpo lá dentro.”


Depois de uma breve tentativa de educação paroquial (“Eu e a escola católica não combinávamos. Tinha que usar sutiã e mocassim. Odiava”), Meester entrou para a Professional Children’s School, especializada em ensinar crianças destinadas ao showbiz e conseguiu papéis em comerciais e uma breve participação em Lei e Ordem, interpretando a amiga de uma vítima. Quando estava pronta para ingressar no ensino médio, a família arrumou as malas novamente rumo a Los Angeles. Lá, Leighton estudou na Hollywood High e, mais tarde, na Beverly Hills High (quando perguntam onde ela morava, aponta: “Sabe a favela?”). Àquela altura os papéis começavam a aparecer, em séries como 7th Heaven e 24 Horas. Mais tarde, ela participou de uma paródia de filme de terror, Drive Thru – Fast Food da Morte, com seu futuro companheiro de série, Badgley. “Fazíamos dois amigos chapados”, conta. Quando fez o teste para Blair em Gossip Girl, no começo de 2006, o diretor de elenco não ficou convencido. “Eles diziam que eu era muito doce para interpretar a personagem”, relembra ela. Havia outro problema também: Meester era loira. “Eles falavam: ‘Seja chata e legal, feia e bonita, jovem e velha, estúpida e esperta, inocente e vagabunda, loira e morena. Consegue ser todas essas coisas?’” Quando os produtores pediram que fizesse um teste como Serena, ela recusou. “Às vezes você não consegue pegar um papel, independentemente do esforço que faça”, admite Meester. “Mas aquele era meu. Sentia isso. Uma parte de mim já estava pronta para assumir Blair e mudar para Nova York. Já tinha vencido todos os obstáculos que me apareceram na vida.”

Meester foi contratada, e enquanto a personagem de Lively, Serena, capturou a maior parte das atenções iniciais, Blair Waldorf emergiu como a mulher forte do seriado. Bufando com seus cachos e saltos, ela é um poço de energia, mas Meester conseguiu colocar certa vulnerabilidade na personagem – o que a eleva alguns degraus acima da megera televisiva padrão. Blair se diverte abusando dos novatos (suas cenas nos degraus da escola junto com suas parceiras de saia estão entre os melhores momentos de Gossip Girl), mas por trás dessa barreira de aço há uma jovem frágil que deseja as coisas que a maioria das outras garotas também quer: pais atenciosos, uma boa faculdade e um namorado que responda suas mensagens de texto (o próprio namorado de Meester, o ator Sebastian Stan, tem um papel recorrente em Gossip Girl – o encrenqueiro Carter Baizen). Meester aprecia a ironia de interpretar uma princesinha do Upper East Side – é uma transformação tão ao estilo de Frank Capra que talvez o próprio escritor tivesse dificuldade em aceitá-la. “Me fez o que eu sou”, Meester diz sobre sua história. “Não quero usar drogas. Não quero precisar começar de novo um milhão de vezes. Pode parecer brega, mas sinto que cada dia é uma bênção”, prossegue. “Poderia ter me tornado uma pessoa diferente. Milagres acontecem. Pode não ser o seu destino, mas pode vir a ser o de seu filho, e é assim que minha mãe se sente.”

Ao contrário de meester, blake Lively, de uma família de Burbank, Califórnia, tem raízes profundamente fincadas no show business. Seu pai, Ernie, é um típico ator com cara de policial que trabalhou em séries como Os Gatões e Turner & Hooch; sua mãe, Elaine, agencia e ensina atores mirins – e suas quatro irmãs também atuam. Ainda assim, Blake evitou entrar no ramo. “Seria óbvio demais”, confessa. Sua vida não tinha nada de glamurosa. “Houve uma época em que ela era chamada de Baby Spice”, lembra o irmão de Lively, Eric, de 27 anos. Mas o sonho de Lively era estudar na Stanford University. A rigorosa rotina acadêmica que ela descreve lembra muito a do tipo de estudante interpretada por Reese Witherspoon em A Eleição (1999): grêmio estudantil, coral, treinos de cheerleader (ela chegou a recusar um papel em Meninas Malvadas, de 2004, porque já tinha marcado viagem para um acampamento de cheerleaders no mesmo período, conta o irmão). Quando Lively tinha 15 anos, ela e Eric foram escondidos passar um mês na Europa. “Fomos para Londres, Paris, Roma, Florença, Colônia, Bruxelas”, diz ela. Todos os dias, o irmão perguntava a ela sobre seu futuro. “Tinha medo da hora do almoço porque sabia que Eric ia fazer a mesma pergunta, de novo”, recorda Lively. Um ano depois, ela já estava fazendo testes e não muito depois disso, conseguiu o papel da jogadora de futebol Brigdet no hit juvenil Quatro Amigas e um Jeans Viajante (2005). Além da sequência do filme, Lively estrelou recentemente alguns longas independentes, como Elvis & Anabelle (2007) e The Private Lives of Pippa Lee – ainda por estrear – onde interpreta uma jovem a caminho de um colapso nervoso.

No começo, Lively não queria ser uma Gossip Girl. “Não quero fazer um seriado e ter a obrigação de dedicar seis anos da minha vida a um único personagem’”. Mas as fãs de Quatro Amigas e um Jeans Viajante praticamente a empurraram para a TV. Schwartz e Savage notaram que as adolescentes que frequentavam os fóruns da internet achavam que Lively ficaria perfeita como Serena. Os produtores a convenceram, assegurando que Gossip Girl jamais se transformaria em um dramalhão. “Aí, Stephanie contou a ela as roupas que iria usar”, confessa Schwartz, “e ela aceitou”.

Nos livros, Serena é a típica garota de classe alta, mas Lively lhe deu um ar mais gentil e uma vibração californiana (Schwartz admite que uma das suas preocupações no início era se Lively conseguiria “pegar o clima de Nova York”). Em seus incessantes embates com Blair, seu oscilante relacionamento com Dan Humphrey e mesmo no fim da primeira temporada, quando revela que deixou que um rapaz morresse após uma balada regada à drogas, Serena é o tipo de personagem com quem as pessoas conseguem se identificar (tanto quanto é possível se identificar com alguém que tem um meio-irmão bilionário e que passa as férias dançando na Argentina). A atriz conta que faz Serena “um pouco mais boba. Mas é porque sou assim” (“Ela também usa mais Chanel”, entrega Meester).

O sucesso de Gossip Girl fez de Lively um alvo perfeito para os tablóides, o que não parece incomodá-la. “Prefiro que inventem mentiras sobre mim em vez de contarem a verdade, porque a verdade é a única coisa que tenho”, diz ela, embora a verdade a seu respeito seja o fato de que está saindo com Badgley há mais de um ano. Enquanto isso, Gossip Girl elevou seus status de ícone estilístico a níveis jamais vistos desde que Sarah Jessica Parker calçou seus pares de Manolo Blahniks em Sex and the City. “Fiquei chocada quando recebi um bilhete escrito a mão por Giorgio Armani”, conta ela antes de acrescentar que sua capa na Vogue “parece falsa”. “Toda vez que vejo, penso ‘Não pode ser uma Vogue de verdade’”. Lively dispara seu sorriso sul-californiano. “Me sinto como se estivesse enganando todo mundo.”


"Me dá outra monkey, por favor?” Já passa das dez da noite da segunda-feira e o grupo de rapazes de Gossip Girl – Penn Badgley, Chace Crawford e Ed Westwick – se espreme em volta dos restos de três hamburgueres de peru no Half King, um abarrotado pub na vizinhança de Chelsea, em Nova York (“Podiamos ter ido ao Rawhide”, brinca Badgley, se referindo ao famoso bar gay na mesma rua). A bebida do momento é a Golden Monkey, uma cerveja estilo belga com um teor alcóolico nada discreto. “Não desrespeite a Golden Monkey”, diz Crawford. Um cliente começa a circular em volta da mesa dos rapazes, em silêncio, como quem tenta cercar uma presa. Ele fica por ali por cerca de meio minuto até resolver falar. “Desculpe interromper, mas assisto bastante o seriado de vocês”, comenta. “Minha namorada me fez gostar do programa e eu queria dar os parabéns. Vocês fazem um ótimo trabalho.”

“Não acho que tenha sido mesmo a namorada dele”, admite Westwick. “É assim que a maioria dos caras é”, emenda Badgley. “‘Ah, sim, minha namorada...’” Mas Crawford admite: “É um bom álibi”. Esta noite há um certo ar de nostalgia com relação aos primeiros dias de Gossip Girl, um tempo em que ninguém se importava com quem estava saindo com quem e um momento em que Perez Hilton ainda não tirava sarro dos rapazes por suas “caras de gay”. Já faz quase dois anos que o elenco chegou a Nova York, mudando-se para o Gramercy Park Hotel (“Era como um acampamento de férias”, conta Savage) sem ter ideia do enorme fenômeno em que tudo aquilo se transformaria mais tarde. “Amo muito essas pessoas”, anuncia Westwick. “É quase como se fossemos órfãos que se encontraram no mesmo orfanato.

O britânico Westwick quase ficou fora de Gossip Girl. Schwartz e Savage amaram o ator, que tinha participado de filmes como Invasão de Domicílio (2006) e Filhos da Esperança (2006), mas ele quase não conseguiu seu visto de trabalho em tempo de participar do piloto. A emissora pediu que os produtores considerassem outros atores, mas eles preferiram esperar. Eventualmente o visto saiu e Westwick se tornou o irresistível anti-herói de Gossip Girl, o tipo hedonista capaz de roubar qualquer cena com apenas três palavras sussurradas: “Sou Chuck Bass”. Seu personagem é muito mais proeminente na série de TV do que nos livros, onde é descrito como um bissexual imoral que anda por aí com um macaco de estimação chamado Sweetie empuleirado em seu ombro. “Nos livros ele é quase uma caricatura”, admite Cecily von Ziegesar, a autora. “Mas adoro Chuck na TV. Ed é um grande ator.”

Westwick, que declarou ter inspirado seu sotaque esnobe em Carlton Banks – personagem de Alfonso Ribeiro em Um Maluco no Pedaço (1990) – conta que a transição não foi das mais fáceis. “Quando vim para os Estados Unidos, me senti um idiota”, confessa. “Havia tantas coisas que nunca tinha feito. Nunca tinha comido sushi. Nem sabia o que era um calamari”. “Você não sabia lavar roupa”, interrompe Crawford. Texano educado, com uma biografia que faria Andy Warhol desmaiar – ex-modelo, pai dermatologista, uma irmã que foi Miss Missouri em 2008 –, Crawford era o bonitão da vez, o rosto pontuado pelos olhos azuis feito sob medida para as páginas do MySpace. “Não sabia mesmo lavar a porra da roupa!”, avisa Westwick.

Westwick e Crawford dividem um bagunçado apartamento não muito longe do Half King. Pelo menos os boatos dizem que era bagunçado. Crawford afirma que o lugar anda muito bem arrumado. Westwick se gaba de ter pintado seu banheiro recentemente e de ter dado fim a seu santuário de fotos de Jim Morrison.

Quando Gossip Girl começou, rumores circulavam dizendo que os dois eram mais do que colegas de apartamento. “Totalmente rídiculo”, interrompe Westwick. “É engraçado, porque amo muito esse cara”, diz apontando com a cabeça para Crawford. “Morreria por esse porra. É meu irmão. Mas, por Deus, gostamos tanto de mulher que chega a ser ridículo. A questão é, o que a gente pode fazer a respeito?”, prossegue Westwick. “Fomos jogar sinuca, tomamos uma cerveja e nunca mais tocamos no assunto”, conta Crawford. “Agarramos mulher em público”, diz Westwick. Crawford e Badgley explodem de rir. Trata-se de uma referência um tanto direta aos amassos pouco discretos que Westwick deu em Drew Barrymore depois de um show do Kings of Leon no fim do ano passado. “Foda-se, transaria em público”, provoca Westwick. “É algo na minha lista que ainda falta fazer. Bem, na verdade já fiz, mas ninguém viu. Não foi tão público quanto George Michael”. “Chega de bebida para você”, retruca Crawford. “Ah, para”, salienta Westwick. Ele ergue sua garrafa. “Golden Monkey, não me abandone!”

Bradgley ri. Do elenco masculino, ele é o veterano, depois de passar por séries de vida curta como The Bedford Diaries, Do Over e The Mountain. Assim como Lively, Badgley precisou ser convencido a assinar contrato. “Desconfiava muito de televisão”, conta. “Mas Stephanie e Josh sabem como caminhar na fronteira entre a integridade criativa e o tino comercial”.


Seu personagem, Dan Humphrey, é o mais perto da plebe que Gossip Girl é capaz de chegar – um angustiado pretendente a escritor que sente repulsa e fascínio pelos colegas da alta roda. Enquanto qualquer outro ator poderia ter interpretado Dan como um homem comum e sem graça, Badgley conseguiu injetar um ofensivo ar de sabe-tudo. Apelidado na internet de “Lonely Boy” (“Garoto Solitário”) por seus colegas de classe, Dan é um lutador capaz de se sujeitar a qualquer coisa para atingir a fama literária. “Dan era para ser aquele cara atrapalhado, nerd, que acha que nunca estará no mesmo nível das outras pessoas, mas Penn decidiu torná-lo um tanto arrogante”, conta Lively. “Como se fosse mais esperto que seus amigos mimados”. Ela diz que Badgley, às vezes, se incomoda com isso. “Ele fica: ‘Por que Dan é tão pretensioso?’ e a resposta é ‘Porque você fez isso com ele! É tudo culpa sua!’”

Mesmo depois de tantas tentativas frustradas na TV, Badgley se espanta com a trajetória de Gossip Girl. Ele conta que uma vez foi ao restaurante do Palace Hotel com Lively e notou que no cardápio havia um item chamado “Gossip Girl Grilled Cheese“ (Queijo Grelhado Gossip Girl). “Então sugeri: ‘Vocês deviam chamá-lo só de Gossip Grill’. Eles levaram o menu, reimprimiram e me devolveram. Os caras mudaram a porra do nome do prato na hora. Foi um daqueles momentos em que você para e pensa, ‘Ok’.”

Todos os rapazes do elenco sabem como é isso. A atenção dada às suas vidas pode se tornar muito intensa: Crawford saiu um tempo com a cantora de country Carrie Underwood e Westwick foi pego beijando a coestrela da série, Szohr, em um jogo dos Knicks. A vida de ídolo teen tem prazo de validade e dar o próximo passo como ator pode ser uma manobra muito complicada. São poucas as pessoas capazes de entender a posição em que eles estão. “Falei com Jason Priestley uma vez”, lembra Crawford, se referindo ao ícone de Barrados no Baile. “Sabia que ele costumava sair com a irmã de Blake? Blake era pequena e costumava tentar beijá-lo.” “Eu mato ela”, brinca Badgley. “Jason me disse: ‘No fim das contas você olha para trás, entende o que aqueles anos significaram e sempre vai ter um sentimento de nostalgia’.” “Exato”, diz Badgley. “Nosso ideal é continuar nossas carreiras como estrelas. Mas, independentemente do que venha a acontecer, jamais estaremos nessa mesma situação de novo.” “Isso até a próxima temporada”, corrige Westwick.

Haverá uma terceira temporada de Gossip Girl, conforme a CW anunciou com grande alarde. Em maio, Schwartz e Savage colocarão no ar o primeiro episódio de uma série derivada, ainda sem nome, baseada na Hollywood dos anos 80, mostrando a adolescência da mãe de Serena, Lily van der Woodsen. Com a primavera chegando no hemisfério norte, o elenco está pronto para uma pausa merecida. O calendário deles é brutal – infindáveis cenas em locações externas e filmagens até tarde da noite em um estúdio que costumava abrigar o seriado Família Soprano, no Queens.

As gravações terminam em abril e as férias estão sendo planejadas, papéis no cinema estão sendo estudados e alguns atores estão ansiosos por lançarem suas carreiras musicais. Meester tem um álbum de eletro-pop quase pronto, Westwick (que tem uma banda no Reino Unido chamada Filthy Youth) está louco para voltar a tocar e Taylor Momsen está terminando seu disco pela Interscope Records. “É um álbum de rock radical”, diz a atriz, que fará 16 anos em julho. “Não é o que as pessoas esperam.”

Por quanto tempo Gossip Girl irá durar? Os rapazes dizem que estão efetivamente contratados por sete anos, embora haja a chance de renegociar depois de três. Savage não parece muito propenso a esticar o seriado por décadas (como a antiga série Bonanza), brincando ao dizer que o lema de Schwartz para o sucesso na TV é: “Viva rápido, morra jovem e deixe um belo cadáver”. “Sete anos é bastante tempo”, conta Badgley. “Quatro é um bom número”, diz Crawford.

A verdade é que o mundo dourado em volta de Gossip Girl está em ruínas na vida real. Será que Chuck passará a comprar seus lenços em liquidações? Serena será obrigada a sobreviver à base de Gossip Grill? “Bom, por causa dos cortes no orçamento, Blair vai ter que nos deixar”, brinca Lively. “Todas as cenas dela serão filmadas em Ohio.” “Ela vai ter que esconder as compras dela na Hermés em saquinhos de supermercado, para disfarçar”, diz Meester. Schwartz e Savage acreditam que Gossip Girl conseguirá manter seu espaço como fantasia moderna. “Romeu e Julieta não viveram um amor proibido por causa de uma crise no mercado imobiliário”, diz Savage. Mas talvez Gossip Girl devesse se render a estes tempos de economia, ao menos para manter as aparências. E se Serena e Chuck se mudassem para uma bela suíte em um hotel mais barato, como o Holiday Inn Express, por exemplo? “Seria muito legal!”, diz Meester. “Mas só por um episódio.” Lively, por sua vez, não tem tanta certeza. “Não acho que as pessoas iriam assistir Gossip Girl se morássemos no Holiday Inn Express.”