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Estrela Solitária

A tristeza infinita e a redenção improvável de Billy Corgan, o último integrante original do Smashing Pumpkins

Por Brian Hiatt Publicado em 17/11/2010, às 12h54

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Billy Corgan posa em Beverly Hills, onde mora na maior parte do tempo. "O desafio nos últimos dez anos tem sido sobreviver", diz. "Há dias em que você se sente esquecido" - KRISTIN BURNS
Billy Corgan posa em Beverly Hills, onde mora na maior parte do tempo. "O desafio nos últimos dez anos tem sido sobreviver", diz. "Há dias em que você se sente esquecido" - KRISTIN BURNS

Sem contar o que ele fez com a própria carreira, Billy Corgan nunca tentou o suicídio. Até recentemente, houve muitas manhãs nas quais ele acordava com uma escolha cabal: "Vá tomar café da manhã ou vá se matar". Felizmente, ele nunca tentou, porque o fundador do Smashing Pumpkins sempre foi o menos preguiçoso dos heróis do rock alternativo dos anos 90 e provavelmente teria conseguido logo na primeira vez. "Nunca cheguei perto de tentar", diz Corgan, com uma segurança honesta. "Porque tentar seria como dizer 'Vou morrer', e não algo como 'É um pedido de ajuda'." De alguma forma, toda a discografia do Pumpkins era um longo pedido de ajuda, transmitindo a dor residual de Corgan de uma infância cheia de abuso e negligência. Ele não estava de brincadeira quando dizia "Deus é vazio como eu" (trecho da música "Zero"). Só que os anos 90 acabaram, o Pumpkins terminou e a vida dele ficou bem pior. Preso em um relacionamento torturante com uma velha namorada, ele ainda lamentava a morte da mãe, ocorrida em 1997, enquanto sua banda implodia em uma novela sinistra e junkie. Corgan caiu em uma depressão sem fim e enfrentou ataques de pânico debilitantes.

Então, Billy Corgan - cuja banda fez Siamese Dream e Mellon Collie and the Infinite Sadness, discos que definiram uma era - descobriu que a nova década não tinha lugar para ele. Lançou três álbuns, cada um uma tentativa contraditória de se redefinir - e todos fracassaram. Em uma manhã ensolarada de fevereiro, em Beverly Hills, Corgan está sentado na cabana à beira da piscina, transformada em estúdio de gravação de um amigo, ponderando sobre esses problemas. Até que começa a rir. "Isso é engraçado", diz em sua voz nasalada e ressonante. "Onde é que a história feliz começa?" Ele pode estar prestes a descobrir. Corgan começou a lutar por seu legado - como o único membro restante do Smashing Pumpkins, está novamente fazendo música digna do nome da banda, e também começou a escrever um livro sobre sua trajetória pela espiritualidade idiossincrática da Nova Era, que, acredita, salvou sua vida e sua sanidade. "Quando tudo foi esmigalhado, a única coisa que restou foi virar para Deus e dizer 'Me ajuda a organizar isso'", diz.

"Comecei a rezar. Estava desesperado, não queria morrer e percebi que Jesus, Maria e Buda haviam estado ali o tempo inteiro." Ao mesmo tempo, ele teve seu primeiro encontro com a fama comercial, no nível "estrela de sites de fofoca", por causa de uma amizade (ou talvez romance) com Jessica Simpson. O músico se diverte com a atenção, mas passa tempo suficiente na internet para estar ciente de que os blogueiros o tratam como um mote para piada, uma relíquia. "Faço parte da conversa sobre os melhores artistas do mundo? Minha resposta é sim, claro", afirma, refutando a situação.

Embora tenha uma casa em Chicago, Billy Corgan passa boa parte de seu tempo na propriedade de um amigo em Beverly Hills, o produtor e baterista Kerry Brown - ex-marido de D'Arcy Wretzky, ex-baixista do Pumpkins (nem Corgan nem Brown falam com ela desde o final dos anos 90). Corgan é praticamente um membro da família - os filhos de Brown o chamam de tio Billy. "É uma situação estável", diz Corgan. Ele vai a jogos de basquete, e eles acham sua presença muito mais impressionante depois que a cara dele apareceu no game Guitar Hero. No momento, Corgan olha para um quadro branco apoiado em uma estante, onde escreveu cerca de 50 títulos de músicas em letras maiúsculas: "The Dauphine", "As Rome Burns", "Blurricane", "Fate the Lonely Actor". Ele compôs e fez gravações demo de todas essas músicas nos últimos meses - e gravou e liberou duas até agora, como downloads gratuitos: "A Song for a Son", uma canção épica ao estilo do Led Zeppelin, e a barroca e um tanto pop "Widow Wake My Mind". Corgan decidiu que o álbum tradicional está morto, então está disponibilizando uma coletânea de 44 canções - Teargarden by Kaleidyscope - uma faixa por vez, pela internet. Quando concluir um grupo de quatro músicas, ele as lançará por sua própria gravadora, como disquinhos lindamente embalados, sendo que o primeiro está programado para o segundo semestre.

Como de hábito, o músico acordou por volta das 7 da manhã, em seu pequeno quarto de loft, perto da piscina e comeu uma omelete, embora queira emagrecer. Há alguns anos, ele estava totalmente abatido, mas agora voltou a ter a cara de bebê que tinha nos anos 90 - exceto pela barba rala e grisalha que cultiva - e está mais ou menos com a aparência que tinha no clipe de "1979". "Na verdade, estou gordo agora, mas não uso essa palavra porque tenho muitas amigas e elas ficam chateadas comigo", diz. Embora tenha se afastado da medicina ocidental (e das drogas) há uma década, ele afirma ter vários problemas de saúde, incluindo envenenamento por mercúrio, arsênico e chumbo. Acredita que seus pulmões foram prejudicados quando morou em Lower Manhattan, depois dos atentados de 11 de setembro de 2001. Tem desidratação "crônica, médica", é alérgico a álcool e tem tornozelos fracos, que protege com tênis Air Jordan de cano alto.

Corgan recentemente construiu um estúdio dos sonhos em Chicago, com equipamentos da Motown e o tipo de mesas de mixagem usado pelo Pink Floyd e pelos Beatles. Para pagar, fez uma hipoteca do passado, aceitando uma quantia que, presume-se, esteja na casa dos milhões para vender os direitos de "Today" - o primeiro sucesso do Smashing Pumpkins - para um comercial da Visa. Ele não pede desculpas pela venda de uma música que chama de "sagrada", argumentando que isso conclui sua independência do sistema de grandes gravadoras. "Enquanto eu estava fincando a bandeira branca na ilha do independente, todos passaram por mim, incluindo todas as bandas independentes que licenciavam suas músicas", afirma. "Percebi que estava vivendo nos anos 90, ainda seguindo todos aqueles códigos. O Pete Townshend me disse: 'Quem se importa? E daí que Mary Lou perdeu a virgindade no banco de trás do carro ouvindo essa música? Qual é a diferença entre vendê-la no iTunes, em um CD ou por meio de um comercial?'"

Em vidas passadas, Billy Corgan foi um monge - pelo menos foi o que videntes lhe disseram. Essa ideia faz sentido para ele, que lida com problemas usando o trabalho solitário, e até já tentou o celibato. Além de escrever o livro sobre suas crenças, que parecem se centrar em uma versão altamente pessoal (e de Nova Era) sobre o cristianismo - ele mal leu a Bíblia, recomendando um livro de 1907 chamado O Evangelho Aquariano de Jesus, o Cristo no lugar dela. Ele também comanda o que parece ser um ministério virtual em um novo website chamado Everything from Here to There. Recentemente, publicou no site uma série de cinco partes chamada "How to Put Your Good Anger to Use" (Como usar sua raiva boa). Corgan adota a ideia de que estamos indo em direção a um cataclismo, ou pelo menos a uma grande mudança vibracional, em 2012. Ele questiona o que realmente existe na composição da vacina H1N1 e teme que os Estados Unidos estejam a caminho de um colapso econômico no estilo da União Soviética. Se você o estimular, ele inicia monólogos extensos sobre esses assuntos, usando muito a palavra "sistema" enquanto desenha padrões no ar com suas mãos gigantes - mas, quando pressionado para dar detalhes, retrai-se: "Não quero ser um herói morto", diz. Ele também passou muito tempo trabalhando com videntes e curandeiros. "Fui ver um xamã", conta. "Ele colocou as mãos em mim e chorei como um bebê durante uma hora. Foi como em um funeral ou algo assim, quando a dor é tão imensa que parece sair pelos seus pés. Ele estava identificando coisas que precisavam ser lamentadas, e falou até do cachorro que eu tinha quando criança - e o descreveu perfeitamente."

Quando era criança, Billy Corgan tinha um olhar irritantemente intenso, encarando os adultos com tanta frequência que eles reclamavam para seus pais. Em sua opinião, esse era o primeiro sinal do que acredita serem suas habilidades espirituais. "Eu os estava lendo psiquicamente - só não sabia o que era isso", explica. "Estava coletando informações, observando sua linguagem corporal ou lendo-os. Eu achava que todo mundo era assim." Ele era um garoto solitário e traumatizado, nascido em um mundo de disfunção e vício. Seu pai, William Corgan, era um guitarrista de blues e R&B viciado em heroína. Sua mãe teve um colapso nervoso e o abandonou quando tinha menos de 5 anos. Mais tarde, enquanto o pai estava na estrada, Corgan diz que sofreu abusos físicos de uma madrasta.

Seu passado toca o presente: em 1º de janeiro de 2008, a polícia de Tampa, na Flórida, encontrou seu pai, aos 60 anos, inconsciente dentro de um carro, com uma agulha de heroína no braço esquerdo. Não pela primeira vez, Corgan ajudou o pai, tirando-o da cadeia e pagando pela reabilitação. "Billy salvou a minha vida muitas vezes", diz o velho Corgan. "Extrapolei minha cota de chances, acabei com elas algumas vezes. Cresci em um lar sem amor ou emoção - isso meio que fica com você, que acaba passando isso para os filhos, e esperamos que, desta vez, tenhamos quebrado a corrente." Billy passou tempo suficiente na terapia para saber que não foi por acaso que criou uma nova família disfuncional no Pumpkins. Ele se cercou de viciados, de Wretzky e o baterista Jimmy Chamberlin à ex-namorada e colaboradora Courtney Love. Ele tentou romper cada uma dessas relações. "Se amo alguém, olho para o outro lado", diz Corgan. "E fico ali para tentar livrá-los do vício. Talvez por causa do meu pai eu tenha aprendido a fazer isso desde cedo." Ele trabalhou com Courtney em músicas para o novo álbum do Hole, mas não quer mais saber da cantora - e se ela lançar essas músicas, o que aparentemente fará, "vai ser um problema imenso, porque não dei permissão", diz. "Não me interessa apoiá-la de maneira alguma. Com pessoas assim, você nunca para de jogar coisas pelo abismo."

Corgan costuma frequentar o Polo Lounge, um ponto clássico da velha Hollywood dentro do Beverly Hills Hotel, e, quando nos encontramos ali para um almoço no dia seguinte, ele está mais bem humorado. "É impressionante quem já vi aqui", diz com um entusiasmo sincero. "Uma vez vim para uma reunião sobre meu livro e estavam Katie Holmes, Lindsay Lohan, Nicole Kidman." O músico chega com o homem de 61 anos que tocou baixo em suas demos recentes - Mark Tulin, da banda de garagem dos anos 60 Electric Prunes. Com a saída de Chamberlin, em março de 2009, o Smashing Pumpkins se tornou um conceito em vez de uma banda, deixando Corgan livre para tocar com quem quisesse. Ele encontrou seu novo baterista, Mike Byrne, que tem 20 anos (e cara de 12), por meio de um teste. Tulin e Byrne se tornaram próximos, com o jovem fazendo o mais velho gostar do rock independente - do tipo que seu chefe não suporta. Corgan diz as palavras "Animal Collective" como se deixassem um gosto ruim na língua.

O líder do Pumpkins encontrou Tulin depois de se envolver com um culto, o Source Family, que nos anos 70 gerou sua própria banda psicodélica, Ya Ho Wa 13. Depois de ler um livro sobre o grupo - cujas crenças se baseiam levemente na Cabala, entre outras fontes-, Kerry Brown convidou um de seus membros, Sky Saxon (líder da lendária banda de garagem The Seeds, que morreu no ano passado) para ir ao estúdio. "Ele veio com os membros do Family e todo o circo espiritual veio e se mudou para cá", conta Brown. Ele e Corgan foram adotados pelo grupo, que lhes deu novos nomes: Brown é Stargate Aquarian, Corgan é Samuel Aquarian. Existem várias horas de gravações de Corgan fazendo jams com o Ya Ho Wa 13 e Brown está tentando descobrir como lançá-las.

No final dos anos 90, o Smashing Pumpkins tinha sido reduzido a Corgan mais "dois viciados e um cara que me odiava, e eu o odiava". O não viciado era o guitarrista James Iha - o único músico além de Corgan a ter créditos de compositor nos álbuns da banda. Da forma como Corgan conta, Iha o irritava muito ao agir de forma hostil e, depois, insistir que não havia nada de errado. A baixista D'Arcy - que parecia estar ali mais por ser cool e ter bom gosto do que por algum talento musical em particular - já tinha deixado a banda na época em que Corgan a desfez. Agora, ele gostaria de ter lidado com tudo de forma diferente. "Em vez de terminar a banda, eu deveria era ter expulsado o James", desabafa Corgan. Por e-mail, Iha dá sua visão sobre o assunto: "Em nossa banda sempre houve quatro opiniões e perspectivas diferentes. Escolho me lembrar dos bons momentos".

Quando o Smashing Pumpkins ressurgiu, em 2006, a formação era Billy Corgan, Jimmy Chamberlin e alguns contratados. Eles gravaram um álbum pesado, Zeitgeist, que se concentrava nos aspectos mais metálicos e brutais do som do grupo - era como se Corgan estivesse punindo os fãs por quererem a volta da banda. "Algumas das músicas que não usamos para o Zeitgeist soam como o Smashing Pumpkins clássico - são quase baladas, grandes hinos de rock", conta. "Eu as escuto e penso 'Que diabos estava fazendo?'' Quando Chamberlin e Corgan caíram na estrada em uma turnê que supostamente comemorava os 20 anos da banda, no final de 2008, os fãs começaram a ter a mesma dúvida que Corgan. Vestido em roupões longos e brilhantes, os músicos faziam shows de quase quatro horas de duração, preenchidos por uma cover de 25 minutos de "Set the Controls for the Heart of the Sun", do Pink Floyd. Os fãs iam embora enquanto Billy Corgan os xingava.

Depois disso, Corgan demitiu Chamberlin - embora o baterista sugira, sem muita empolgação, que possa ter se demitido. Antes de se tornar pai, há sete anos, Chamberlin era viciado em heroína - e foi demitido pela primeira vez em 1996, depois que o tecladista Jonathan Melvoin morreu durante uma festa com ele. Agora o baterista está sóbrio, mas Corgan está convencido de que seu caráter não mudou, e que ele é "não saudável." "Jimmy é um ser humano destrutivo e pessoas destrutivas quebram coisas", afirma Corgan. "Não me vejo atingindo os níveis mais altos de minha criatividade se não estou saudável, e se tenho pessoas não saudáveis ao meu redor." Depois que Billy disse a Jimmy que ele estava fora, o baterista "descarregou", lançando 20 anos de insultos acumulados. "Então, pensei: 'Dane-se'", lembra Corgan. Chamberlin fica paralisado quando ouve a história que foi contada por Corgan. "No meio da última turnê, o Billy disse que era culpa do agente, depois que era culpa da banda, e, mais tarde, que era culpa dos fãs", diz o baterista. "Sim, no passado fui um ser humano destrutivo. Era viciado e maluco, mas assumi o controle da minha vida. Em um plano maior, isso não muda mais nada. São alguns discos de ouro e um punhado de dinheiro. E daí? Tenho esposa e filhos, sou totalmente feliz."

Insone há muito tempo, Billy Corgan raramente dorme mais de seis horas, mas tem sonhos vívidos e constantes. "Tive um sonho incrível há mais ou menos um mês: estava em uma catedral imensa", conta. "Estava olhando um coro de luzes angelicais, e era uma cena linda de luz e cor, mas eu estava de fora, assistindo. Eles estavam cantando uma música e era algo sobre alegria. Gravei o verso e ainda posso usá-lo." Parece significativo que, no sonho, Corgan estava de fora, assistindo: mesmo com toda sua busca, ele ainda está infeliz "na metade do tempo". "Olha, se a sua mãe enlouquece e desaparece quando você tem quatro anos e você acaba em um lar com uma situação abusiva, isso acaba com sua cabeça", diz. "Não conheci ninguém que tenha tido circunstâncias semelhantes à minha e seja normal. Tive 25 anos para entrar nos eixos e ainda não consegui." Corgan não entra em muito detalhes sobre suas aventuras espirituais - está guardando para o livro, em que espera poder colocá-los no contexto adequado. Quando pressionado para elaborar sua alegação de habilidades psíquicas, fica irritado. "Consigo levitar até a casa da Jessica Simpson, não é suficiente?" Na maior parte do tempo, diz: "Acredito no pensamento meditativo constante. Você tem de praticar o amor-próprio - e o perdão." Indico que esse tipo de conversa o deixa aberto para mais gozações - as pessoas podem chamá-lo de um astro do rock velho e esquisito e que adotou o charlatanismo da Nova Era. Ele dá de ombros. "Somos descartados quando não precisam mais de nós, simplesmente nos jogam no lixo e nos trazem de volta para nos espremer mais uma vez para outra história de guerra." Billy Corgan pausa para respirar. "Mas se você quiser escolher uma coisa na qual sou fraco, quero meu trabalho colocado onde pertence", diz. "É a única coisa da qual meu ego não se desfaz. Quero o que me é de direito, não quero estar de fora só olhando."