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O e-Conto de Fadas dos Livros Digitais

Como as práticas da Amazon estimularam o mercado brasileiro de livros digitais a inventar uma solução

Por Cirilo Dias Publicado em 11/05/2011, às 16h14

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ILUSTRAÇÃO: ANDRÉ BERGAMIN
ILUSTRAÇÃO: ANDRÉ BERGAMIN

Quando Jeff Bezos, ceo da Amazon, anunciou que a terceira geração do Kindle vendeu mais do que o último livro da saga Harry Potter, foi o suficiente para muitos brasileiros se gabarem em fóruns e sites especializados de terem encomendado o e-reader mais famoso do mundo, mesmo esgotado e com previsão de entrega a perder de vista. Mas, para empresários daqui, a história de sucesso do Kindle não é tão bonita quanto a Amazon gosta de propagandear. Segundo Sergio Machado, presidente da editora Record, quando a gigante norte-americana anunciou, em 2009, que venderia seu reader no Brasil, ela procurou as principais editoras brasileiras para negociar a venda de formatos digitais durante a Frankfurt Book Fair, o maior encontro editorial do mundo, que ocorre anualmente na Alemanha. E foi aí que uma série de problemas começou a se revelar.

O que mais chamou a atenção foi o fato de a Amazon vender os livros abaixo do preço de mercado. "A longo prazo, isso vai ser um problema. Aconteceu isso com a música e os artistas foram obrigados a voltar a fazer shows. No caso dos autores de livros, eles não têm essa opção", explica Machado. Contatada, a Amazon não respondeu ao pedido de comentário da Rolling Stone Brasil.

Outro a engrossar o coro contra a Amazon é Mauro Palermo, diretor da Globo Livros. "Eles causaram um malestar muito grande ao impor comissões altíssimas ao mercado editorial. Em vez de editoras e autores olharem para o Kindle como mais uma plataforma para distribuir conteúdo e ganhar dinheiro, eles passaram e encará-lo como uma ameaça. Os editores brasileiros evidentemente tomaram precauções." A solução foi imitar a iniciativa do mercado editorial espanhol e reunir editoras brasileiras para criar uma única grande associação administradora de todo o processo de produção, venda e distribuição de livros digitais. Assim nasceu a Distribuidora de Livros Digitais (DLD), uma união de Record, Objetiva, Sextante, Rocco, LPM e Planeta, que pretende prestar serviços a outras editoras e lojas virtuais que quiserem se aventurar no mercado de e-books. Ainda segundo Machado, "o sistema deverá ser implantado em todas as grandes lojas virtuais brasileiras". "Ainda está em fase de testes nas livrarias Saraiva e Cultura", explica. "Estamos preparando mais livros e a previsão é que o acervo seja maior do que o existente nessas duas livrarias."

Apesar de também criticar a atitude da Amazon, o presidente da livraria virtual Gato Sabido (especializada em vendas de livros digitais), Carlos Eduardo Ernanny, tem dúvidas a respeito da DLD. "Nosso e-reader é aberto, pode ler livros de praticamente todas as livrarias digitais do mundo, menos os da Amazon. As editoras da DLD já tem alguns livros disponíveis em duas outras livrarias, cedendo conteúdo de forma individual, mas continuam negando e-books para a Gato Sabido. Requisitamos há mais de um ano. É no mínimo interessante trabalharmos com mais de 100 editoras, termos o maior acervo digital do Brasil, sermos a única livraria 100% digital e, mesmo assim, não termos esses e-books para venda."

Mas o grande problema do mercado brasileiro ainda está na quantidade de ereaders disponíveis no mercado - e seus respectivos preços. Importar um Kindle sai aproximadamente R$ 600, enquanto os brasileiros Positivo Alfa (Positivo) e Cooler (Gato Sabido) não custam menos de R$ 700. E aqueles que esperam uma nova experiência de leitura, com personagens saltando na tela e interatividade, podem se frustrar. Os títulos mais lidos e vendidos ainda são reproduções dos livros físicos. Mauro Palermo revela que os leitores preferem o texto estático. "O problema é que - além da produção ser bastante complexa - são poucas as pessoas que possuem conhecimento para desenvolver para essas plataformas, o que acaba elevando demais o custo." A previsão para que o mercado editorial comece a colher os frutos dos investimentos é longa: entre 5 e 10 anos. "Quem investe em livros digitais hoje não está ganhando nada", diz Palermo. Mas uma coisa é certa: 2011 é o ano digital, em que todo mundo vai mergulhar de cabeça no negócio, como alerta o diretor da Globo Livros: "Quem não se preparar, pode começar 2012 com muitos problemas".