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Sonhando Devagar

Kassin

JOSÉ FLÁVIO JÚNIOR Publicado em 06/09/2011, às 15h39 - Atualizado em 13/09/2011, às 14h49

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Sonhando Devagar
Sonhando Devagar

Produtor solta seu primeiro CD solo quebrando todas as regras

Presente no título e em várias faixas deste primeiro disco de Kassin depois da dissolução do + 2, o sonho inspira também a primeira constatação desta resenha. É um sonho, quase uma alucinação, que um álbum como este seja lançado com pompa e circunstância, que figure no espaço mais nobre da seção de críticas da Rolling Stone e ganhe destaque em todos os veículos que interessam na mídia nacional. Certamente, não houve nem haverá outro trabalho tão inusitado recebendo o mesmo tratamento em 2011.

Isso se dá pelos parâmetros galgados por Kassin como produtor. O carioca de 37 anos virou uma espécie de queridinho das cantoras nos últimos anos. De Adriana Calcanhotto a Thalma de Freitas, de Vanessa da Mata a Mallu Magalhães, de Thais Gulin a Ana Carolina, todas quiseram e levaram a produção dele – que, em tempos recentes, também deixou sua marca em álbuns de Graforréia Xilarmônica, Autoramas, Caetano Veloso e Jorge Mautner, só para citar alguns. Sua carreira como músico e produtor começou nos anos 90, com a banda Acabou La Tequila, uma referência para o Los Hermanos, com quem Kassin também trabalhou nos últimos dois CDs. Atualmente, ele ajeita o oitavo disco da Nação Zumbi.

Só imaginar que os acima citados escutarão Sonhando Devagar já é um delírio. Ana Carolina tentando entender o tecnogay com guitarra cítara presente em “Sorver-te”, Thais Gulin atravessando o solo ruidoso de “Em Volta de Você”... É inevitável supor que várias ideias que Kassin pode ter tido dificuldade de aplicar nos discos de seus produzidos pintam lépidas e faceiras em Sonhando Devagar. E que muitas cantoras vão pensar duas vezes antes de chamar Kassin para comandar seus próximos álbuns levando em conta as demências registradas aqui. Vale fazer a ressalva de que Sonhando Devagar está longe de ser uma obra hermética, de um experimentalismo impenetrável. As dez faixas claramente soam pop aos ouvidos de Kassin. E soarão da mesma forma para quem aceita ritmos e levadas díspares num mesmo disco, não se assusta com termos chulos salpicados aqui e ali, curte passagens barulhentas e, o mais importante, consegue apreciar uma canção interpretada por um vocalista que não seja um canário. A deficiência de Kassin ao microfone pode muito bem se transformar em algo charmoso. Basta entrar na onda.

Para entrar na onda, aliás, Sonhando Devagar oferece uns óculos 3D ao comprador. Da capa ao encarte, toda a arte deve ser apreciada com o artefato, o que revela a vontade do autor de trazer o ouvinte para o seu universo, não de afastá-lo. A tipografia que salta aos olhos é do ilustrador e músico gaúcho Diego Medina. Sua escolha não sedeu ao acaso. Quem conhece a produção musical de Medina reconhecerá influência de alguns de seus projetos – Os Massa, Senador Medinha, Doiseu Mimdoisema – no álbum de Kassin.

Outra mumunha de Sonhando Devagar é que a ordem das faixas foi definida pelo guru Carlos Eduardo Miranda. Ele optou por um começo mais tranquilo, com músicas radiofônicas como “Fora de Área” (que remete a Cardigans e todas aquelas bandas dos anos 90 que buscavam inspiração nos 60), um meio intrincado, em que o destaque é a exuberante “O Que Você Quiser”, lançada em arranjo bem diferente por Toni Platão há 11 anos no álbum Calígula Freejack e cuja letra pode ser lida como uma carta de intenções do produtor Kassin para seus contratantes, e um desfecho totalmente sem noção, marcado pelo eletrofunk “Calça de Ginástica”, do memorável verso “Eu quero transar com você no banheiro de paraplégicos”.

Este 2011 está se mostrando claudicante para a música brasileira. Alguns artistas estão se achando importantes demais e são hypados à exaustão. Outros marcham na direção oposta, deixando-se vencer pelo desleixo e desinteresse. Faltava mesmo um Kassin para confundir tudo. Isso mostra que o sonho não acabou.

Fonte: Coqueiro Verde