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Análise: Sem sal, filme Capitã Marvel faz estúdio regredir 11 anos

E isso não é necessariamente ruim para a produção estrelada por Brie Larson, é somente decepcionante

Pedro Antunes Publicado em 07/03/2019, às 07h50

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Capitã Marvel (Foto: Divulgação / Marvel Studios)
Capitã Marvel (Foto: Divulgação / Marvel Studios)

Carol Danvers se construiu protagonista dos quadrinhos da Marvel Comics aos pouquinhos. De uma origem a outra, de Ms. Marvel a Capitã Marvel. O fato é que muitos outros personagens usaram a alcunha até a chegada de Danvers, desde a criação de Stan Lee e Gene Colan, estreada em 1967. Depois de Danvers, tudo mudou, contudo.

Figura tão importante das HQs na atualidade, Carol representa todas as transformações pelas quais os quadrinhos mainstream passaram pelos últimos anos. É o início de uma tentativa de equilibrar os pesos entre protagonistas masculinos e femininos. Enfim, as mulheres não são destaques somente pelos uniformes decotados.; estavam frente a frente com os figurões.

Não é a toa que na segunda edição da Guerra Civil, evento da Marvel que divide seus heróis em dois lados antagônicos, tem dois líderes: de um lado, Tony Stark, queridinho dos cinemas, no outro, Carol Danvers, a Capitã Marvel.

Isso tudo para dizer que Capitã Marvel, o filme, era o longa certo para o Marvel Studios marcar também uma virada na sua estética de produção em massa. O rolo compressor de filmes de ação com encapuzados há tempos se abriu para novos gêneros de cinema.

Veja, como por exemplo, a psicodelia de Doutor Estranho, o humor safado de Homem-Formiga, o clima de espionagem em Capitão América: Soldado Invernal, as aventuras espaciais coloridas de Guardiões da Galáxia e Thor: Ragnarok, ou ainda a excelente união entre ação e temática social de Pantera Negra.

Mas são 11 anos de Marvel Studios. Os filmes citados acima são os destaques, mas há outros que passaram que não fazem falta na memória. Caso de Capitão América: O Primeiro Vingador, ou o primeiro Thor. Até mesmo Homem de Ferro, longa responsável por dar início a tudo isso, em 2008, que é aquilo que podemos chamar de filme-fundação.

Tudo foi construído a partir dele. O que hoje é o Universo Cinematográfico da Marvel nasceu do ataque sofrido por Tony Stark, vivido por Robert Downey Jr, no longa de 2008. Ele construiu uma armadura para evitar que estilhaços chegassem ao seu coração e se tornaria, assim, o primeiro herói dessa nova fase da Marvel nos cinemas.

O filme de Jon Favreau carregava obrigações demais no lombo. Entregou-as com as com eficiência. Mas não é um filme com "assinatura". Ainda há um engessamento em Homem de Ferro. Percebemos isso hoje, com olhares vindos 11 anos depois e cientes daquilo a ser erguido a partir daquele momento.

A Marvel ainda tateava  o cinema, depois de experiências fracassadas de seus heróis realizadas por outros estúdios - vale lembrar, ou esquecer, dos dois filmes do Quarteto Fantástico - e os acertos, como foi o caso dos dois primeiros longas da trilogia de Homem-Aranha, de Sam Raimi. A Marvel tentava achar o seu tom, o que só se deu, de fato, em 2012, com Os Vingadores, o primeiro filme com a reunião dos principais heróis da franquia.

E, com isso, chegamos ao título desse artigo que, certamente, tem repercutido muito negativamente entre esse seleto grupo de "comentaristas de Facebook que só leem os títulos das matérias".

Capitã Marvel, interpretada por Brie Larson, é sem sal porque não tem tempero qualquer. Soa como Homem de Ferro, o primeirão, como um grande prólogo escrito para justificar a existência da personagem em aventuras melhores (espero!), mas que ali não condiz.

Não entendam mal. Queríamos muito amar Capitã Marvel, como ocorreu com o importantíssimo Pantera Negra. A expectativa era alta, afinal. Trata-se primeira heroína a estrelar um fime do estúdio, intepretada por uma ganhadora do Oscar (Brie Larson ficou com a estatueta pelo filme O Quarto de Jack).

Os trailers prometiam uma aventura espacial e colorida. Acontece que tudo acaba mais cinza do que se esperava - e entenda isso nos sentidos literal e metafórico.   

É um novo passo para o Marvel Studios, afinal. Cachês dos principais heróis do estúdio são elevados e os holofotes precisam achar novas estrelas. A aposta é alta em Brie Larson e sua Carol Danvers, tendo em vista toda a representatividade que ela traz, e Pantera Negra, esse, sim, um filme de origem com pegada autoral e importância para o cenário atual - não é por acaso que foi indicado ao Oscar.

A aventura de Danvers, contudo, tem muita relação com Stark. Não diretamente, na personalidade, porque ela não é marrenta como o Homem de Ferro, muito menos rica ou gênia da tecnologia. Carol é uma piloto de aviões militares, mas também uma humana presa no meio de uma guerra entre duas raça alienígenas, os Kree e os Skrulls - nem tente quebrar demais a cabeça para entender qual é vilão e qual é mocinho nessa história.


O público é levado pela história por Carol Danvers e Nick Fury, um incrivelmente rejuvenescido digitalmente Samuel L. Jackson. Ela tenta se reencontrar com seu passado depois de ter ido parar no espaço para aprender a lidar com seus poderes (ela dispara raios poderosos das mãos).

Já Fury tenta se manter nos eixos depois de descobrir que os humanos não estão sozinhos no universo, que uma das raças alienígenas tem a capacidade de se transformar em qualquer pessoa e lidar com a fofura de um gatinho laranja chamado Goose.

Mas é compreensível, contudo, o movimento mais conservador. Essa coisa de "fazer a  Marvel regredir 11 anos" ao deixar suas inovações para trás e voltar ao básico como nos tempos da estreia de Downey Jr. Há muitos riscos envolvidos e uma nova geração de heróis e filmes por vir.

A questão, apressados, não é a qualidade do longa em si. Capitã Marvel é tão delicioso quando uma batata frita sem sal. Falta um tempero para que o filme se torne marcante em si.