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40 anos sem Alfred Hitchcock, o homem que marcou a ascensão e queda da Era de Ouro do cinema

O Mestre do Suspense viveu quase 50 anos da sétima arte - e tem referências para todo o período

Yolanda Reis Publicado em 29/04/2020, às 19h48

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Alfred Hitchcock e Kim Novak no set de Vertigo, 1958 (Foto: Divulgação / Paramount via Wikicommons)
Alfred Hitchcock e Kim Novak no set de Vertigo, 1958 (Foto: Divulgação / Paramount via Wikicommons)

Alfred Hitchcock cresceu em uma Londres cheias de inovação da virada do século XX. Nasceu em 1899, poucos anos depois do cinema dar os primeiros passos com a invenção do cinematógrafo pelos irmãos Lumière e alguns meses antes do incrível Viagem à Lua do ilusionista genial Georges Méliès. O menino não sabia, mas seria um dos maiores nomes da arte que tanto o impressionava quando criança. 

Hitchcock chegou ao cinema quase por acaso. Educado em engenharia, trabalhou medindo cabos para uma companhia telefônica. Detestava o trabalho, e conseguiu migrar para a área publicitária da empresa, onde expressava toda a sua imaginação plástica em montagens. Aos 20 anos, o então artista plástico viu uma oportunidade tentadora. O estúdio Famous Players-Lasky (hoje Paramount Pictures) precisava de alguém para fazer pôsteres para filmes. Levou alguns esboços e foi contratado imediatamente. Sua habilidade era impressionante, e não demorou para começar a trabalhar em cenários e ajudar nos roteiros.

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A primeira direção concreta foi fruto do infortúnio. Hugh Croise, diretor de Always Tell Your Wife, adoecera e não conseguiria terminar o projeto. O produtor Seymour Hicks perguntou se Hitchcock não estaria interessado em finalizar. Embora seja responsável por boa partes das filmagens, o nome dele nem chegou a aparecer nos créditos. Era 1923, e o jovem tinha agora dois filmes no portfólio, pois dirigira Number 13 (1922) - embora esse tenha sido ignorado quando o roteiro perdeu-se e as fitas foram derretidas, pois o nitrato de prata nelas valia mais do que o trabalho do diretor anônimo.

Mas estava feito. Hitchcock era, agora, um diretor de cinema digno de brilhar na Era de Ouro. Depois de Always Tell Your Wife e antes do fim da década de 1920, lançou 12 longa metragens - incluindo Blackmail(1929), o primeiríssimo filme falado da Grã-Bretanha. O resto do século XX foi igualmente produtivo, e o cineasta carrega nas costas a direção de 53 filmes (o último, Family Plot, de 1976) que são referência de todas as décadas do cinema americano.

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Pupilo do Suspense

Alfred Hitchcock tinha dois irmãos mais velhos. Seu pai era verdureiro, e extremamente rígido e obcecado pela ordem - a ponto de mandar o caçula ser preso pela polícia quando tinha uns quatro ou cinco anos por “ser uma criança má.” Na escola, recebeu educação igualmente controladora. Estudava no St. Ignatius College, colégio jesuíta especializado em carregar a mão nas punições. Hitchcock odiou cada segundo lá, como explicou na autobiografia com seu nome:

 "O método de punição, é claro, foi muito dramático. O aluno devia decidir quando ir para a punição imposta a ele. Devia se dirigir para a sala especial onde estava o sacerdote encarregado de aplicar a punição. Era algo como ir para a sua execução. Eu acho que foi mau. Eles não usavam o mesmo tipo de cinto que assolavam as crianças em outras escolas, era um de borracha."

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Toda a questão do bem e mal, pessoas boas ou ruins, porém, fascinaram-no durante os anos seguintes. Levavam-no a testar limites de modo subversivo. Era o típico fanfarrão do colégio, embora não fosse nunca uma pessoa realmente malvada, pois limitava-se a travessuras como jogar ovos nas janelas dos sacerdotes. Só para provocar, mesmo.

Todo o jogo de regras, quebras e punições, anos mais tarde, refletiriam-se no trabalho de Hitchcock, como explicou na biografia: "Se você tiver sido educado com os jesuítas como eu fui, esses elementos seriam importantes. Eu me sentia aterrorizado pela polícia, pelos jesuítas, pela punição, por um monte de coisas. Estas são as raízes do meu trabalho."

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Foi nesse período da adoscência, também, que Hitchcock passou a estudar os crimes e a desobediência civil, além de todas as nuancas sociais. Passava o tempo livre entre salas de cinema de Londres, tribunais (para assistir julgamentos criminais e tomar notas) e o Museu do Crime da Scotland Yard, coleção de memorabília da inteligência britânica.

Esses passatempos e comportamento punitivo moldaram muitos aspectos essenciais nos seus filmes. Os protagonistas, muitas vezes, são pessoas inocentes, mas perseguidas pela lei. Ou, então, um criminoso irônico e provocativo. Quase sempre, porém, transgressões - maiores ou menores.

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Em 1940, Hitchcock resolveu ir para o Novo Continente e para a maravilhosa Hollywood, lar de produções estonteantes. Estreou nos Estados Unidos com louvor; Rebecca (1940), tem tudo o que consagrou o cineasta: a trama é puro terror psicológico. Mostra a história de uma jovem mulher, sem nome, que se casa com um viúvo rico, Sr. de Winter. Mas, na casa, a figura de Rebecca, primeira esposa do homem, não esmorece - e faz da vida da recém-casada um verdadeiro inferno.

Foi a primeira prova de Hitchcock como diretor, também, pois quem faz o papel da protagonista é Joan Fontaine; a atriz principal, porém, quase foi Vivien Leigh, namorada de Laurence Olivier, intérprete de Sr. de Winter. O ator passou a detestar a colega de elenco, e tratava-a com frieza. O diretor viu a oportunidade, e pediu para todos no set de filmagens tratá-la da mesma maneira, pois isso refletia o sentimento da personagem na casa. Rebecca foi indicado a 11 Oscar; ganhou Melhor Filme. 

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Mestre do Horror

Depois do multissucesso Rebecca,Hitchcock ganhou espaço para brilhar no cinema hollywoodiano. Nos anos 1940, a indústria local explodia - e boa parte desse sucesso deve-se ao diretor britânico. Naquela época, começou a trabalhar em vários tipos de longa - como a comédia romântica Sr. e Sra. Smithou a temática de guerra de Um Barco e Nove Destinos (embora ainda tenha muitos de seus suspenses).

Mas foram os anos 1950 e 1960 que consagraram o terror de Hitchcock. Seus filmes arrancavam palmas, criavam filas de dar volta no quarteirão da sala de cinema, arrepiavam e impressionavam pelas técnicas inovadoras e as histórias bem montadas tão exclusivas. Ninguém antes usara uma câmera em primeira pessoa (quando a cena é a visão de um personagem); ou desenvolvera uma história pela visão apenas dos personagens.

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No período de 10 anos, Hitchcock, já um grande nome do cinema, construíu um patamar de sucesso inigualável na história do cinema: o título do Mestre do Suspense. Entre 1950 e 1960, lançou (além de outros títulos menores) os clássicos: Festim Diabólico, Sob o Signo de Capricórnio, Disque M para Matar, Janela Indiscreta, Ladrão de Casaca, O Homem que Sabia Demais, Um Corpo que Cai(ou Vertigo) e o seu maior clássico, Psicose. Depois, em 1963, ainda viria Os Pássaros, indubtavelmente um dos seus melhores trabalhos.

Em 29 de abril de 1980, há exatos 40 anos, Alfred Hitchcock morreu de insuficiência renal, aos 80 anos. Muitos dizem que aquela foi, também, a década que começou o declínio irreparável e desenfreado do cinema - mas pode ser só coincidência que a vida dele inteira marcou o melhor período da sétima arte.

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