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Charli XCX compõe um retrato de uma juventude inquieta em quarentena com How I’m Feeling Now [REVIEW]

Ao lado dos fãs, a cantora pop criou, produziu e lançou o quarto disco da carreira durante o período de isolamento social contra o coronavírus

Julia Harumi Morita | @the_harumi Publicado em 23/05/2020, às 11h00

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Capa do disco How I'm Feeling Now (Foto: Reprodução / Instagram)
Capa do disco How I'm Feeling Now (Foto: Reprodução / Instagram)

Após o mundo reconhecer a pandemia do coronavírus e anunciar quarentenas generalizadas, Charli XCXaproveitou o cenário caótico, antes provocado esteticamente pelas noites em clubes, que tomou o mundo em proporções totalmente inesperadas para criar um material inédito e circunstâncias únicas. E o resultado foi uma obra sonora colaborativa capaz de expressar as emoções de uma juventude inquieta sem perspectiva de voltar para as ruas.

No dia 6 de abril, a artista anunciou o novo projeto por meio de uma chamada online no Zoom com os fãs. De acordo com a CNN, Charlidisse que a criatividade dela está ligada à  positividade, por isso, o novo disco feito em tempo recorde era uma resposta para o período de isolamento social.

Ao longo dos três outros discos de estúdios e quatro mixtapes, a cantora britânica de 27 anos explorou diferentes dimensões da vida agitada e digitalizada, tão familiar para ela e os ouvintes que a acompanham. 

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E How I’m Feeling Now não surpreende ao caminhar pela mesma temática. Sim, nós conhecemos bem o universo de Charli, mas, de alguma forma, a cantora ainda consegue nos conquistar com hits de uma geração, como “Boom Clap”, “Vroom Vroom” e “Boys”.

Se no último disco, Charli (2019), a cantora fez uma aposta ousada em inúmeras parcerias com grandes artista da cena pop e indie, desde Lizzo até Haim, neste novo álbum ela se reinventou ao abrir o processo criativo para os fãs, que produziram artes, aprovaram demos, escolherem a ordem de lançamentos das músicas e contribuíram com imagens para clipes.

How I’m Feeling Now não poderia ser mais sincero ao se apresentar como um momento, algo sem início ou fim que só pode ser percebido pelos sentidos. Em “Pink Diamond”, a artista nos convida a apagar as luzes, fechar os olhos e deixar nossos corpos dançarem ao som dos sintetizadores caóticos.

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Charliquer ir com tudo, mas é impossível quando todas as noites parecem as mesmas. A melhor opção é festejar com as próprias memórias dentro de casa e encantar caras pelas câmeras - afinal, por que desperdiçar a beleza?

Em seguida, a cantora se volta para o amor, em específico a relação de idas e vindas que viveu por cerca de 6 anos. Como uma festa com altos e baixos, “Forever” e “Claws” são o momento em que você pega o copo de bebida, vai para varanda ouvir a música de longe e pensa sobre um amor vivo pelos pensamentos, o qual durará para sempre. 

Então Charlivolta ao pop açucarado e convencional em “7 Years” e “Detonate”, fortemente presente no último disco, e lembra das memórias dos tempos pré-covid-19 vividas ao lado da única companhia segura nesses novos tempos. 

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O caminho de volta para casa já não é uma preocupação e as horas se perdem como os dias dos dois últimos meses em “Enemy”. Um pouco mais próximos, um pouco mais bêbados, a cantora percebe a própria vulnerabilidade nos olhos do parceiro e não consegue escapar dos questionamentos sobre si mesma.

Este diálogo interno continua em “I Finally Understand”, desta vez, mais confiante. A artista canta: “Meu terapeuta disse que eu me odeio demais / Você me diz que está tudo bem / Me deixe chorar e abraçar isso”.

Hipersensíveis, os sintetizadores voltam despreocupados em “C2.0” e flertam com o trap em “Party 4 U”. E depois de uma onda de aplausos, Charlidecide levar o fim do disco novamente para o ápice energético da primeira canção. 

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Sem opções, a artista desabafa sobre o tédio de ver televisão e a oscilação de emoções em “Anthems”. Os prazeres fúteis e preciosos também são celebrados: os amigos, as viagens, festas e o calor dos corpos.

“Encarando o esquecimento / Todos os meus amigos são invisíveis / 24 horas por dia, sinto falta de todos eles / Eu posso chorar como uma cachoeira / Sinto medo quando me sinto sozinha [...] Eu quero hinos / Madrugadas, meus amigos, Nova York / Eu durmo, quero acordar novinha em folha”, canta. 

As últimas pinceladas são destinadas a uma melancolia crescente, que explode pela uma última vez e antes de ser abandonada como um eco. Com poucas palavras, Charlidá nomes às músicas e aos próprios pensamentos dispersos pelo único ambiente ao alcance dela, um retrato afetivo de uma juventude inquieta na quarentena.


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