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Como Grey Daze, primeira banda de Chester Bennington, reviveu vocalista em Amends: "Ele tinha muito orgulho da música"

Sean Dowdell foi o melhor amigo de Chester, e o conheceu bem antes do Linkin Park - quando o músico era só um 'menino magricela' - do começo ao fim, a banda que tinham juntos lançou um CD novo com músicas antigas de Bennington

Yolanda Reis Publicado em 21/07/2020, às 07h00

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Greydaze (Foto: Anjella At Sakiphotography)
Greydaze (Foto: Anjella At Sakiphotography)

Em 20 de julho de 2017, na ocasião do seu 41 aniversário, Chester Bennington se matou. A voz do Linkin Park calou-se, enforcada. Três anos depois, a morte ainda instiga fãs lamentosos de um dos vocalistas mais lembrados do rock. Ainda causa, também, dor na família e nos amigos. Mas estes conseguem, agora, dividir a lamúria com a saudade. As memórias dolorosas podem se intercalar àquelas que os fazem sorrir. E boas lembranças podem ser revividas.

Pelo menos, nesse caminho segue Sean Dowdell. Foi um dos melhores - e mais antigos - amigos de Chester. Quando o conheceu, contou em entrevista à Rolling Stone Brasil, Bennington estava longe de ser a figura cheia de tatuagens e cabeça raspada que nos é familiar. Aliás, nem estava no mundo da música. Era só “um menininho miúdo, pesava uns 45 quilos, cabelinho enrolado, óculos… Parecia um nerdão.” Dowdell achou difícil acreditar que aquele carinha, dois anos mais novo que ele, estivesse ali para os testes de vocalista de sua banda post-grunge. Não combinava.

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Mudou rapidamente de ideia. Tão logo Chester começou a cantar, Dowdell se impressionou. “Ficamos completamente chocados, e pensamos ‘p*** m****, esse cara é bom.’” Logo pediram para ele integrar o Grey Daze(que por breves momentos se chamou Sean Dowdell and Friends?). Eram músicos bons de verdade, garante Dowdell, mas não duraram o suficiente para fazer um sucesso estrondoso. Gravaram uma demo em 1993, e mais dois discos até Chester sair do grupo em 1998, deixar Arizona para ir morar em Los Angeles e entrar no Linkin Park.

O trabalho com Sean e com Grey Daze, feito antes da internet, acabou no limbo de uma produção pré-internética. Salvo um ou outro áudio aqui, quase ninguém ouviu o trabalho de Bennington além do Linkin Park durante algumas décadas. Até que os músicos tiveram uma ideia: trazer isso à tona com uma coleção das faixas favoritas dos dois.

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O bom filho ao Grey Daze torna

Quando Chester saiu do Grey Daze, a amizade com Sean Dowdell esfriou um pouco. Mas, na virada do milênio, já voltaram a ficar amigos. Uma banda juntos não deu certo, mas isso não significava o fim dos negócios: os dois seguiram administrando o Club Tattoo [empresa de piercings e tatuagens], faziam jingles, entre outros. Também jogavam basquete juntos, iam para a academia, viajavam, cantavam...  E conversavam.

Muitos anos de amizade depois, em 2016, veio a ideia de relembrar os velhos tempos e fazer uma festa de aniversário para o Club Tattoo. “Costumávamos fazer eventos gigantescos. Nós dois subíamos no palco, na frente de milhares de pessoas, era divertido,” relembrou Dowdell. “Não fizemos por anos, e começamos a falar sobre isso. [Chester] me disse: ‘Sabe, na próxima festa, devíamos reunir o Grey Daze.’ Eu disse: ‘Ok.’”

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Só tinha um “problema técnico”: Chester estava na estrada, viajando numa turnê do Linkin Park. Os dias dele eram praticamente contados. Combinaram de fazer um show no segundo semestre de 2017, então. Só não anteciparam o frênesi da nostalgia da indústria. Tão logo anunciaram esse primeiro show, vieram as ligações de dezenas de cidades do mundo inteiro, todos querendo um horário do Grey Daze.

Mas o timing era perfeito: dava tempo da banda se preparar para uma turnê de verdade. Tinham mais de 30 faixas gravadas durante os anos 1990. Tiveram a ideia de escolher uma dúzia para um CD, dar uma “modernizada” (e profissionalizada) nos instrumentos, tirar alguns clichês da época em que foram gravadas, e deixar tudinho digitalizado. Seria o melhor disco dos últimos tempos de sucessos do passado.

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No começo de 2017, então, Sean Dowdell foi para os estúdios gravar a bateria. Com ele, Mace Beyers (baixo) e Cristin Davis (guitarra). Quanto a Chester, não sabiam bem como fazer, por causa da turnê com Linkin Park. Pensaram na produtora viajar com ele e arranjar tudo - mas ela não era a pessoa mais organizada dali, e não parecia uma escolha muito acertada. Então, ponderaram a alternativa de esperar o fim da turnê e voltar aos estúdios só então.

Nada disso chegou a acontecer. Três dias antes da data marcada para as gravações de voz - e dois meses antes do fatídico show de retorno, -  Chester Bennington se suicidou.

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O Renascimento de Grey Daze

A morte de Chester pegou todos de surpresa. O luto pelo músico foi enorme, tanto entre a família e amigos quanto com fãs. Linkin Park ficou mais de dois anos sem falar em música (anunciaram, em abril deste ano, um novo projeto). Grey Daze congelou o renascimento. Ficaram em cinzas durante bastante tempo. Passaram-se alguns meses antes de Dowdell reavivar a centelha: “Acordei e pensei que queria terminar o disco que começamos juntos, e mostrá-lo para todo o mundo. Conhecia a vontade dele, Chester tinha muito orgulho da música, assim como eu. Conversei com o resto da banda, [eles concordaram].”

O primeiro passo foi conversar com a família de Chester. Sean telefonou a Susan e Lee, pais do amigo. “Deram-me a benção.” Então, pediu para Talinda Bentley, viúva. “Ela disse: ‘Você é o melhor amigo dele, confio em você. Sei que ele gostaria de fazer isso.” 

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Banda, pais, esposa. Todos dentro. Estava decidido: Grey Daze faria um disco com os vocais de Chester Bennington, gravados tantos anos antes em Arizona. Amends começava a tomar forma.

Faltavam, porém, consultar seis pessoas importantes para Chester: os filhos. Dowell conhece muito bem todos eles. “Eu estava com Chester o tempo inteiro da nossa vida adulta”. Convidou todos a participarem do projeto. Talinda, mãe dos três caçulas [Tyler, na época com cerca de 12 anos, e as gêmeas Lily e Lila, 7],  não achou que eles tivessem idade suficiente (“respeito e entendo completamente”, comentou Sean). Draven recusou (“acho que a morte do pai ainda estava muito próxima”). Jaime, o mais velho - hoje com 24 anos, - porém, aceitou (“ele disse: ‘É uma oportunidade que só aparece uma vez na vida, quero tentar, com certeza’”).

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Jaime teve dois papéis importantes no disco: gravar os backing vocals (mas sem substituir, em momento algum, a voz do pai, enfatiza Sean) e dirigir alguns dos clipes de Amends. Uma parte bastante importante por dois motivos principais: os vídeos foram uma maneira de mostrar como o objetivo do Grey Daze  é relembrar Bennington; também foram uma maneira perfeita de mostrar quem ele era antes dos gritos, dos vocais poderosos, da fama gigantesca.

“Foi nossa maneira de reconectar os fãs com ele, sob uma luz diferente, levar a música para um caminho diferente do Linkin Park. Isso era parte de Chester, foi da onde ele veio," acredita Dowdell.

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“É perceptível, quando o ouve cantar, que ele levava significado para todas aqueles versos. Dá para ouvir a tormenta emocional dele, a dor, até mesmo a tristeza. Era um dos dons de Chester, conectar as emoções e os sentimentos à sua expressão vocal. Poucos cantores conseguem fazer isso. Podem gritar ou cantar baixinho, e você até consegue acreditar nele. Mas ele tinha habilidade de fazerem ouvir o que ele dizia e conseguir se conectar com dores internas. [Quem ouve] pode até não saber que esses sentimentos existiam, ou como expressá-los, mas pode ouvir Chester cantar sobre isso e dizer: ‘É exatamente como me sinto,’ Ele fazia isso melhor que qualquer outro cantor da geração.”

Amends, lançado em junho de 2020, então, é completamente um tributo a Chester Bennington. São 11 músicas, criadas nos anos 1990 pelo Grey Daze e escolhidas a dedo pelo próprio Chester, pelos colegas de banda e pela família do músico. O disco completa-se com vídeos emocionantes e um documentário de produção. O conjunto é “uma obra-prima,” garante Dowdell.

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“Todas as músicas têm algo de muito especial. Isso é raro nos dias de hoje… Muitas bandas fazem um disco de 12 faixas, duas são boas, o resto é meio que filler. Acredito que realmente não fizemos isso neste disco. Todas têm conteúdo nas letras, um apego emocional. Acho que quem ouvir verá isso… Pelo menos, espero isso. Tenho orgulho do álbum inteiro, não só de uma ou duas músicas.”

A pós-vida de Chester Bennington

Grey Daze reuniu 11 faixas perfeitas para homenagear Chester. Mas, se depender de Dowdell… Não para por ai. Durante os anos na ativa, a banda lançou dois discos e um demo. Ainda existe muito para onde crescer: “Muita gente não sabe, mas temos material o suficiente para mais um, talvez até dois, discos com o Chester. Vamos continuar, pelo menos, até isso acabar. Mas vai demorar alguns anos…”

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Nesse meio tempo, Grey Daze não sabe bem o que fazer. Normalmente, quando uma banda lança um álbum, sai em turnê para divulgá-lo (e esse era o plano inicial de Amends). Mas… Como fazê-lo se o vocalista não está vivo?

“Muita gente me pergunta isso. Existem várias pequenas respostas para isso. A primeira delas: não vamos substituir o Chester. Isso não vai acontecer.”

“As pessoas vêm até a gente e sugerem fazer algo diferente, dizem: ‘Vocês podem fazer algo virtual virtual. Sabe, existem telas especiais e vários elementos para trazer alguém para uma apresentação ao vivo." Falaremos sobre isso, matutar a ideia. Então, talvez, existe a possibilidade que algo assim possa acontecer… Talvez também convidemos outros cantores para um show em tributo, e sobre, Chester. Seria uma homenagem.”

Para quem sente saudades de Chester, então, ouvir Amends é uma boa forma de lidar com a falta. Não podemos mais vê-lo num palco, mas podemos lembrar dele de uma maneira que nem conhecíamos: antes de tudo, quando era pouco mais que o filho do policial, completamente magrela, de óculos, com roupas esquisitas. 

O disco está disponível nas plataformas digitais - e, pelo YouTubee site da banda, é possível ouví-lo enquanto assiste-se aos clipes.