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Criolo - Um Em Um Milhão

Por Gustavo Silva Publicado em 09/08/2011, às 14h53

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<b>SÓ MAIS UM NA MULTIDÃO</b> Criolo é fotografado na avenida Paulista, em São Paulo, em julho - Ignácio Aronovich
<b>SÓ MAIS UM NA MULTIDÃO</b> Criolo é fotografado na avenida Paulista, em São Paulo, em julho - Ignácio Aronovich

Leia abaixo um trecho da matéria publicada na edição 59 da Rolling Stone Brasil, nas bancas a partir de 9 de agosto

"Aqui tem um bando de louco, louco por ti, Corinthians." O chamado às armas da torcida ecoa algumas vezes por um Pacaembu que, apesar do frio invernal da noite de quarta-feira, reúne uma massa de quase 30 mil alvinegros, divididos entre vascaínos de um lado e os torcedores do clube mandante em 90% do estádio. Andrés Sanchez, presidente do Corinthians, cara de poucos amigos, fuma um cigarro atrás do outro a cinco bancos de distância. Adriano, o Imperador sem trono, sem jaqueta e sem frio, também está na área reservada - e demarcada como tal nos assentos - à comissão técnica. Ao meu lado, está um dos loucos do bando. A jaqueta bordô do Timão o protege da baixa temperatura e cobre a camisa do time que ganhara de presente da Nike pouco antes, personalizada com um nome: Criolo.

Os figurões parecem não chamar a atenção dele. As reações ao jogo são contidas. As palmas são batidas de forma quase aristocrática e, emulando um técnico com os movimentos, indica para onde os jogadores deveriam se deslocar em campo, tocar e receber - mas tudo de forma sutil. Algo parece conter Criolo que, em um passado não muito distante, aquecia-se para os jogos em frente ao estádio com duas maria-moles (uma bebida de boteco, mistura barata de conhaque e Contini), churrasquinho e pernil.

"Hoje, o dia é dele", ele aponta para o pai, sentado ao nosso lado. Seu Cleon, cabelos brancos, barriga da vivência de 61 anos, "um negro lindo, de traços fortes", segundo o próprio filho, é um homem de poucas palavras, seguro de si e dono da situação. Ele também veste a camisa com o nome artístico do filho Kleber Cavalcante Gomes nas costas, assim como uma funcionária da Nike, que modificou o gênero da palavra e tornou-se a "Criola". "As pessoas às vezes vão aos shows e pintam as camisas com meu nome. É uma corrente do bem", o rapper diz, emendando uma de suas expressões recorrentes: "É muito louco isso tudo".

"É digno? Não é fruto de roubo ou de sacanagem? Então eu aceito a ajuda", Criolo reflete sobre a própria situação atual, contando com suporte em diversas frentes. A dentista - que lhe extraiu os dentes do siso e um molar podre - cobrou apenas o valor do material utilizado. O apartamento onde mora (pelos próximos 30 dias) no luxuoso bairro central de Higienópolis é de uma amiga, que o convidou para partilhar a residência sem custos. A assessora de imprensa se encantou de tal forma com o trabalho dele que quis agenciá-lo, mesmo que não recebesse por isso.

No campo, o goleiro Julio César está solidário aos adversários. Toma um gol no primeiro chute, mas o Corinthians vira o jogo e faz dois antes dos primeiros 45 minutos. O arqueiro continua a dar sustos e emoções no segundo tempo, mas a vitória vem, junto com a liderança do campeonato. Com razão, Criolo havia profetizado, como corintiano legítimo e como artista na estrada há 23 anos: "Vai ser sofrido".