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Guns N’ Roses atrasa somente 25 minutos, faz cover de The Who e mostra os grandes hits em Belo Horizonte

Banda liderada por Axl Rose se apresentou como atração principal do festival mineiro Planeta Brasil

Pedro Antunes Publicado em 23/03/2014, às 03h20 - Atualizado em 26/03/2014, às 18h34

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Guns N’ Roses em Belo Horizonte - Carlos Hauck/Divulgação
Guns N’ Roses em Belo Horizonte - Carlos Hauck/Divulgação

Talvez tenha ficado perfeitamente claro o humor que há no título acima, senão, aqui vai a explicação: o pouco atraso é, no mínimo, uma situação curiosa nos anos recentes de Guns N’ Roses, principalmente nas últimas passagens pelo Brasil. O relógio marcava 20h55 deste sábado, 22, ou seja, 25 minutos após o horário estipulado pela produção do festival Planeta Brasil para o início da apresentação que encerraria o evento, com Axl e companhia. De repente, as luzes do palco principal, o palco Rock, acenderam-se e os primeiros riffs das guitarras surgiram de surpresa. Pessoas correndo, outras olhando para o palco espantadas. Espere aí, o Guns já está começando? E o atraso de duas horas?

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Não é maldade ou excesso de crítica, os atrasos de Axl são históricos e já folclóricos. No Rio de Janeiro, na última quinta-feira, 22, primeiro show desta turnê com nove datas no país, foram quase duas horas de espera. Deve até ter alguém que foi à Esplanada do Mineirão, área que rodeia do estádio localizado na Pampulha, em Belo Horizonte, e se decepcionou por não poder se vangloriar aos amigos: “Fiquei quatro horas esperando o Guns subir ao palco”. Não, não foi dessa vez, amigão.

A atração principal do festival era também maioria nas estampas de camisetas daqueles que compareceram ao festival – segundo a produção, o número de ingressos comercializados passou de 20 mil. Versões oficiais da peça de roupa saíam por salgados R$ 100 em alguns pontos de venda.

As outras atrações vieram para engordar o evento, mas não trouxeram maiores novidades – com exceção dos atrasos, que chegaram a uma ou duas horas, em alguns casos. Criolo tocou o repertório de Nó Na Orelha, com espaço para o novo single; Frejat uniu a turnê de versões com canções próprias; B-Real, do Cypress Hill, mostrou faixas da banda. E o reggae foi representado pela californiana Slightly Stoopid e a brasiliense Natiruts.

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A grande surpresa da noite, com exceção do pouco atraso do Guns, foi a presença ilustre de Fred como baterista do Raimundos. Logo que foi anunciado pelo vocalista Digão, o músico foi ovacionado pelo público, o segundo maior do festival, a olho nu, atrás apenas do headliner. Esse foi o grande retorno de Fred, ainda que em uma participação especial, cobrindo o lugar do atual titular das baquetas, Caio, cuja ausência, justificada por Digão, se deu após “uma tragédia familiar”.

Era evidente que faltava a Fred algum entrosamento com Canisso (baixo) e Marquim (guitarra), principalmente nos altos e baixos das canções, mas não fez feio. E o Raimundos mostra estar se agigantando de novo, após o lançamento do disco Cantigas de Roda.

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A maior crítica dos fãs hardcore, que perseguiram a banda no fim dos anos 1980 e no início da década seguinte, é que a banda hoje parece ser uma “cover de si mesma”. A tecla foi batida tantas vezes que até se tornou jargão jornalístico – daqueles que devemos evitar, aliás. O Guns passou por mudanças, isso é óbvio. Do time de 1991, somente sobrou Dizzy Reed, o mais aplaudido pelo público ao ser apresentado, diga-se de passagem. Mas Axl montou um time bastante azeitado e, principalmente, que o reconhece como líder da banda.

Talvez Axl se sinta mais confortável rodeado por Reed (teclado), Tommy Stinson (baixo), Chris Pitman (teclado), Richard Fortus (guitarra), Ron “Bumblefoot” Thal (guitarra), DJ Ashba (guitarra) e Frank Ferrer (bateria) do que jamais esteve com Slash e companhia. No palco – quando está nele, porque o vocalista passa parte do show no backstage –, Axl atua como um maestro, direcionando e comandando a banda, que só se vê mais solta nos solos e jams que entrecortam a apresentação inteira.

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Apesar de todas as lendas que foram criadas em torno do que se tornou Axl Rose após a debandada geral do grupo e o prometido e longamente gestado disco Chinese Democracy, é possível perceber o quão bem ele se sente no palco, fazendo seus passinhos de dança característicos, arremessando o suporte para o microfone (neste show, foram duas vezes) e, digamos, cantando.

Após o fim de “Knockin' on Heaven's Door”, famoso cover de Bob Dylan, ele para de cantar, levanta a cabeça e abre levemente os braços, como se para receber os aplausos e saudações que vinham da plateia. O sujeito gosta de estar ali, acima de tudo, mantendo a máquina que é o Guns funcionando – mais ativa nos palcos do que nos estúdios, muitos fãs podem argumentar, e com razão.

Duas situações mantêm a banda neste estado vegetativo, respirando por aparelhos. Ainda que o grupo seja capaz de levar aquelas 20 mil pessoas ao Mineirão, e isso é um grande mérito, a falta de material novo com qualidade e a ausência de uma identidade própria nova transformam a apresentação em uma turnê solo de Axl, com destaque para os hits e pouco retorno para as canções do único disco lançado nos últimos tempos, Chinese Democracy, já nas prateleiras há seis anos. Se a banda não vai para o estúdio, se não lança material novo, não terá como manter uma evolução aceitável – tome como exemplo a bem-sucedida carreira do Metallica, que tem dez anos a mais de estrada, e conseguiu levar 65 mil pessoas ao Morumbi, em São Paulo, neste mesmo sábado.

A voz de Axl também já não tem um décimo da qualidade exibida em Appetite for Destruction (1987), G N' R Lies (1988), Use Your Illusion I (1991) e Use Your Illusion II (1991). Ninguém poderia esperar que tivesse, não há gogó que aguente os abusos pelos quais Axl o fez passar no início da carreira, no palco e, também, fora dele, mas parece claro que o vocalista canta os hits e exibe algum vigor vocal em momentos bastante específicos.

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No início, com uma sequência de “Chinese Democracy”, “Welcome to the Jungle”, “It's So Easy”, “Mr. Brownstone” e “Estranged”, a voz estava sofrível. As três guitarras pareciam, propositalmente, construir um muro sonoro, abafando os vocais de Axl e tornando-o quase um backing vocal. Foi só com “Live and Let Die”, outra cover, desta vez do Wings, banda criada por Paul McCartney após os Beatles, que ele aparece de verdade.

É como se o show fosse dividido também em solos vocais. Não por acaso, nos momentos mais intimistas, quando Axl não tem todo aquele aparato por trás, ele é aplaudido pelos fãs, como nas performances solo a que cada integrante tem direito ao longo das duas horas e trinta minutos de show.

O que não quer dizer, contudo, que a apresentação é desastrosa. O Guns de 2014, ao vivo, é tão competente quanto qualquer um poderia esperar. Canções do Chinese Democracy definitivamente ficam abaixo do esperado, inclusive em resposta do público. “Catcher in the Rye”, melodicamente mais pop, parece ter causado certo efeito, mas nada estimulante.

Enquanto isso, “Sweet Child O' Mine” foi capaz de fazer o chão da Esplanada do Mineirão vibrar assustadoramente. Outros hits executados, como “You Could Be Mine”, “November Rain”, “Don't Cry”, “Nightrain”, “Patience” e o encerramento, com “Paradise City”, foram também explosivos e fortes o bastante para manter o público sempre interessado e vibrante durante toda a apresentação. A surpresa do dia ficou por conta de uma versão inédita no Brasil, “The Seeker”, do The Who, que começou a ser tocada pela banda em alguns shows em 2012.

Veja só, o Guns lançou uma coletânea há 10 anos chamada Greatest Hits. As dez primeiras canções do álbum são as mesmas que ainda fazem mais sucesso com os fãs ao vivo, e estão citadas acima, em um roteiro repetido neste sábado, em Minas Gerais. Outro detalhe importantíssimo: todos os hits têm, no mínimo, duas décadas de vida. Ainda é cedo para que o Guns viva do passado. Ao menos, em território mineiro, a banda já não promoveu uma daquelas esperas gigantescas. Isso, sim, foi uma das surpresas mais agradáveis que Axl poderia proporcionar aos mineiros.

A banda segue na maior turnê já feita no Brasil, dividida em duas passagens, entre março e abril. Depois de passar por Rio de Janeiro e Belo Horizonte, o grupo vai para Brasília (Ginásio Nilson Nelson, dia 25), São Paulo (Parque Anhembi, dia 28), Curitiba (Estádio Dorival Britto, dia 30), Florianópolis (Music Park, dia 1º de abril) e Porto Alegre (Pavilhão da Fiergs, dia 3). O Guns visita Argentina, Paraguai e Bolívia, e retorna para tocar no Recife (Chevrolet Hall, dia 15 de abril) e Fortaleza (Centro de Eventos do Ceará, dia 17).