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Mariana Aydar cria obra de arte minimalista no DVD Pedaços duma Asa, que serviu também para ajudar a processar uma separação difícil

Registro emocionante de shows filmados em São Paulo trazem as músicas de CD lançado pela cantora em 2015

Antônio do Amaral Rocha Publicado em 01/11/2017, às 11h47 - Atualizado em 02/11/2017, às 13h54

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Mariana Aydar - Divulgação
Mariana Aydar - Divulgação

Tudo começou com o convite do produtor Marcio Debellian, que desenvolvia o projeto “Palavras Cruzadas” unindo música e artes plásticas. Ao ser convidada a participar, Mariana Aydar teve a ideia de interpretar músicas compostas pelo também artista plástico Nuno Ramos. Dessa aproximação surgiu o quarto disco da cantora paulistana, Pedaço duma Asa, lançado em 2015, e, agora, de um DVD de mesmo nome, com registros de shows realizados entre 2014 e 2016.

Além do conteúdo do CD, o DVD dirigido por Simone Elias vem enriquecido com mais cinco canções, entre elas “Samba da Brisa” (Mariana Aydar e Letieris Leite), “Vem na Voz” (Nuno Ramos e Mariana Aydar) e “A Flor e o Espinho” (Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito). Dois clipes em preto e branco de “Samba Triste” e “Saiba Ficar Quieto”, lançados anteriormente e dirigidos por Mihay Vetyeym, completam o material.

Nas faixas ao vivo, chama atenção a excelência da instrumentação mínima, composta somente por contrabaixo, guitarra, cavaquinho e percussões e ao lado da qual a voz de Mariana funciona como a harmonia no conjunto. Entre os músicos participantes estão Duani Martins (percussão, baixo e cavaquinho), Guilherme Held (guitarra), Bruno Marques, Abuhl Junior, Dennys Silva (percussões), Magno Vito (baixo), Marcelo Miranda (percussão e baixo), Mauricio Badé (percussão) e Letieres Leite (flauta).

O conteúdo do DVD, que poderia ser descrito como “uma obra de arte minimalista”, traz ainda bastidores de ensaios, depoimentos de Nuno Ramos e Marcio Debellian e, em tom confessional e altamente emocional, uma conversa entre o multi-instrumentista Duani e Mariana que acaba por revelar o alto grau de doação envolvido no trabalho (e durante a qual Mariana vai às lágrimas).

O CD Pedaço duma Asa, agora registrado em DVD, parece ser uma inflexão na sua carreira, levando em conta os seus três discos gravados [Kavita, Peixes Pássaros Pessoas e Cavaleiro Selvagem Aqui te Sigo].

Sim, Pedaço Duma Asa foi uma paixão avassaladora que passou longe de qualquer estratégia de carreira, veia comercial ou decisão racional, para ir fundo nesse mergulho profundo e artístico. Sempre fui apaixonada pelas composições do Nuno Ramos, mas por serem muito específicas não conseguia gravá-las nos meus álbuns (apesar de ter gravado algumas). Com o convite do Marcio Debellian para o projeto “Palavras Cruzadas”, vi que era a grande oportunidade que eu tinha de mergulhar nesse universo.

Atualmente você tem focado sua carreira no forró e no samba, bem distinto de Pedaço duma Asa, que tem um clima denso e minimalismo nos arranjos. Como foi o processo para chegar nessa performance?

O samba e o forró sempre estiveram muito presentes na minha vida. Apesar de ser um ponto fora da curva, musicalmente Pedaço duma Asa é bem coerente com o que eu vinha fazendo. Desde Cavaleiro Selvagem eu e Duani buscávamos um som “afro-mântrico”, que tivesse a batida forte dos tambores afro-brasileiros, mas que também tivesse essa profundidade meditativa. O nosso encontro com Letieres Leite nessa época reforçou e concretizou essa vontade, por isso a presença dele agora no documentário. Sinto que, musicalmente, Pedaço duma Asa é a continuação de Cavaleiro..., mas mais minimalista.

Eu também vinha compondo bastante para um próximo disco, mas tudo ficou suspenso por esse chamado, essa paixão que me pegou. As minhas composições já estavam nascendo nordestinas, forrozeiras, então sinto que meu caminho agora é o mesmo no qual eu vinha antes de Pedaço duma Asa. Voltei a mexer nessas composições e nessa alma forrozeira que me acompanha desde criança.

No DVD, chamam atenção os afetos, a extrema sensibilidade nas conversas, as emoções e até as lágrimas, em um momento comovente do registro.

Esse é um disco muito forte para mim. Ele veio depois que virei mãe. Isso me transformou em todos os sentidos. Como cantora, como artista, me deu coragem, garra, aberturas, foi quando realmente nasceu minha veia compositora. Foi quando senti que realmente tinha virado mulher, pois sempre me achei muito menina. Durante o processo desse documentário, eu me separei de Duani, meu parceiro há mais de 10 anos, pai da minha filha, parceiro musical que eu amei e amo muito. Tudo isso está documentado, tanto nas palavras quanto nas emoções, choros, risos, na minha voz, no próprio disco, no meu corpo, solidão, coragem. Foi muito difícil o processo da separação, muito mesmo, mas a arte é tão linda e tão misturada que me ajudou a transformar tudo isso.

Os registros se deram a partir de dois shows específicos. Quais as diferenças entre os dois?

Os dois cenários foram concebidos pelo Nuno e pelo Clima para os primeiros espetáculos do “Palavra Cruzada”. O primeiro cenário foi o do Saci. Nuno não queria nenhuma projeção ou algo do tipo e me disse que o que tinha visto de mais legal de arte ultimamente era uma estátua viva de Saci no centro do Rio. Fomos atrás, e realmente é incrível. Já para São Paulo, no Sesc Vila Mariana, ele quis mudar para o conceito dos 365 girassóis. Essa primeira fase era com uma banda. Depois, quando resolvemos gravar o disco, aparamos muitas arestas musicais e colocamos também alguns elementos, como teclados e baixos synth, dando um tom mais moderno. Voltamos para estrada com outra banda e já com a experiência do primeiro palco e com o disco gravado, o que para mim foi incrível – sempre quis um disco que nascesse no palco para amadurecer no estúdio e voltar para os palcos! Portanto, os shows gravados para o DVD foram o primeiro, no Sesc Vila Mariana, em 2014, e o último, no Sesc Pinheiros, em 2016. Esse registro finaliza um projeto lindo e corajoso na minha carreira. Na verdade, eu já estava compondo minhas canções “pós-brisa-nordestina” e agora estou de novo nessa estrada.