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Por que gostamos tanto de teorias da conspiração? [ANÁLISE]

Mesmo que bizarras, algumas teorias têm diversos adeptos - e isso pode ter consequências ruins

Camilla Millan I @camillamillan Publicado em 23/11/2020, às 07h00

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Montagem de Michael Jackson (Brittain Landmark Media Punch / IPX), Beyoncé (Divulgação) e Kenu Reeves (Evan Agostini Invision / AP)
Montagem de Michael Jackson (Brittain Landmark Media Punch / IPX), Beyoncé (Divulgação) e Kenu Reeves (Evan Agostini Invision / AP)

Michael Jackson e Elvis Presley não morreram. Paul McCartney, na realidade, não está mais entre nós. A viagem do Homem à Lua é uma farsa. Por mais bizarras que sejam, teorias da conspiração são compartilhadas todos os dias - e por isso é preciso ter cuidado com o que você acredita.

Além de teorias engraçadas, algumas dessas hipóteses controversas não falam sobre Elvis ou Michael, mas negam questões essenciais para o exercício da democracia e da vida em sociedade.

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Mesmo que contenham informações absurdas, não paramos de consumir esse conteúdo, que encontramos principalmente nas redes. Um estudo científico realizado pelo King's College London, chegou ao resultado de que o YouTube é a principal fonte dessas teorias, seguido pelo Facebook. 

Dessa forma, a todo tempo passamos por conspirações sobre política, saúde, cultura e sociedade - e a pandemia de coronavírus deixa ainda mais evidente os perigos dessas insinuações. 

Em entrevista com a psicóloga Marleide Rocha, a Rolling Stone Brasil se debruçou sobre o interesse em teorias da conspiração:

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“Tem a ver com a tentativa de explicar as incertezas e complexidades do mundo ou de determinado assunto que provoca ansiedade. De certa forma, a explicação para algo que se tem dificuldade em aceitar pode promover uma diminuição dessa ansiedade. Nesse sentido, elas tem mais a ver com a dificuldade em lidar com o  “incômodo” que determinado assunto provoca”, disse a profissional.

Conspiração e cultura pop

A cultura pop é o local onde encontramos algumas das teorias da conspiração mais populares. O famoso “Elvis não morreu”, “Michael Jackson está vivo” e “Beyoncé Illuminati” são alguns exemplos. 

Como explicou Rocha, as conspirações têm ligação direta com a dificuldade de aceitar alguma informação, assim como de explicar algo complexo que causa ansiedade. Um exemplo é a tragédia ocorrida em 25 de junho de 2009, data da morte de Michael Jackson.

Ídolo mundial, a morte do Rei do Pop foi um choque, e pegou todos de surpresa, forçando as pessoas a lidarem com a situação. Contudo, a dificuldade de aceitar a verdade leva a outra questão: as teorias. Diante das incertezas, criam-se justificativas.

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“As teorias da conspiração tem a ver com crenças pessoais e a busca por padrões e  regularidades. A desconfiança sobre determinado tema faz com que justificativas sejam  criadas em torno dele. Os argumentos dizem respeito à crença de um grupo, por isso se torna muito fácil disseminar a história que acaba se tornando uma teoria da conspiração”, explicou a psicóloga Marleide Rocha

Outro ponto se tratando de cultura pop é o engajamento. Tais teorias da conspiração geram ainda mais interesse pelos artistas contemplados por elas. Em algum lugar do mundo, publicam um vídeo do que seria Michael Jackson se disfarçando em um aeroporto: Pronto. Aumentam as vendas de discos e o compartilhamento de conteúdo do músico.

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Por isso que, na cultura pop, as teorias são recebidas de forma mais leve e divertida. No entanto, é preciso estar ciente de que quando se trata de outras áreas, a conspiração pode ter consequências piores. 

De onde vem esse interesse?

Sabe-se que o ser humano é (e sempre foi) curioso. O mórbido é um dos temas que mais chamam a atenção - e isso não faz de alguém louco. Como Harold Schechter diz no livro Serial Killer: Anatomia do Mal," não há sociopatas o bastante nos EUA para justificar a bilheteria nacional de US$ 300 milhões de dólares de O Silêncio dos Inocentes (1991)".

Diferente de serial killers, as conspirações nem sempre são 100% mórbidas. Elas podem ter um fundo engraçado, como provar a substituição de Avril Lavigne ou a imortalidade do ator Keanu Reeves.

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Ok, normalmente conspiração está ligado à morte (ou imortalidade) de alguém - pelo menos na cultura pop. Contudo, conspirações também expõem que o Ataque às Torres Gêmeas foram planejadas pelos Estados Unidos, e que o Homem não foi à Lua - tudo teria sido gravado em estúdio.

Talvez, algumas pessoas realmente acreditem nisso, mas uma forte suposição é de que, na realidade, as conspirações sejam apenas mais interessantes que a verdade: “Somos  seres muito curiosos e gostamos de fantasiar. As teorias da conspiração exploram muito essas duas características. As histórias fantasiosas acabam se tornando mais interessantes do que a  história real”, disse Marleide Rocha

Além disso, alguns grupos são mais suscetíveis a cair nessas hipóteses controversas. Em entrevista à BBC, a professora de psicologia social na Universidade de Kent Karen Douglas explicou: 

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"Os jovens tendem a acreditar mais do que os mais velhos nas teorias conspiratórias. E as pessoas com um nível de educação mais elevado têm menos probabilidade de acreditar nelas". Ainda, a professora explicou a ligação das teorias com a tendência política: "Pessoas nos extremos — tanto à direita quanto à esquerda — tendem a acreditar fervorosamente nelas, ao contrário da ideia geral de que as teorias da conspiração são domínio da direita".

Mais do que um perfil sobre quem pode ou não cair em conspirações, fala-se sobre algumas situações que levam a pessoa a teorizar ou acreditar nessas informações: “Elas parecem atrair pessoas quando necessidades psicológicas importantes delas não estão sendo atendidas: a primeira está relacionada ao conhecimento e à certeza. A segunda está relacionada à necessidade de segurança e a terceira, de se sentir bem consigo mesmo”, disse Douglas

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Para além do motivo dessas teorias, precisamos refletir até que ponto a conspiração deixa de ser engraçada ou divertida, tornando-se um problema para a sociedade.

Os perigos da conspiração

Apesar de algumas teorias serem entendidas como inofensivas, conspirações envolvendo política, saúde e sociedade podem ser nocivas para a democracia e para o debate público. Seja o terraplanismo ou o movimento anti-vacina, os perigos de algumas conspirações são inegáveis. 

Em 2013, foi publicado no "British Journal of Psychology" um estudo de Daniel Jolley e Karen Douglas sobre as consequências dessas teorias. Segundo os pesquisadores, a exposição a conspirações diminui a probabilidade de a pessoa se envolver no processo político, em comparação com alguém que é exposto à informação que refuta teorias de conspiração.

Diante da pandemia de Covid-19, as problemáticas das conspirações ficaram ainda mais evidentes. Outro estudo publicado pela  revista britânica Royal Society Open Science revelou a ligação entre as conspirações e o movimento anti-vacina, além da consequência direta com a pandemia.

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Segundo a Folha de Pernabuco, “a informação falsa de que a pandemia de covid-19 ‘é parte de um plano para impor a vacinação mundial’ foi considerada confiável por 22% dos mexicanos, 18% dos participantes irlandeses, espanhóis e americanos e por 13% dos britânicos”. 

A psicóloga Marleide Rocha também falou sobre os problemas que envolvem as teorias: “Elas são ruins sempre que impedem discussões, fomentam discursos de ódio e estimulam  a violência. Podem destruir reputações de pessoas e de instituições. As teorias da conspiração sempre existirão e é provável que a gente acredite em muitas delas ao longo da vida. Fantasiar é bom, mas não podemos tirar os pés da realidade,  principalmente se isso representar um risco para a nossa vida e os nossos sistemas.”

Conspirações e fake news

A pandemia escancarou ainda mais as fake news - e a ligação com as conspirações é inegável. Surgem teorias sobre a criação do vírus visando o lucro com a venda de uma vacina, que foi espalhado pelos governos da China ou dos Estados Unidos, ou que pode ser disseminado por meio do sinal 5G.

Ainda, durante a pandemia, as conspirações de que governos estão aumentando o número de mortos divulgados também é uma realidade. Muitas pessoas questionam a veracidade das informações e saem às ruas sem máscaras para pôr a hipótese à prova. 

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Em momentos de incerteza, as teorias aumentam exponensialmente - e as fake news tomam conta das redes sociais: “Infelizmente, períodos de instabilidade e de incertezas, como o que enfrentamos atualmente, contribuem para o aumento de teorias e fake news. E é importante que todo cidadão assuma o compromisso  de combater a desinformação e defenda a liberdade da imprensa”, explicou Marleide Rocha

Em entrevista para a BBC, Stephan Lewandowsky, professor de psicologia cognitiva da Universidade de Bristol, no Reino Unido, falou sobre as fake news: "Qualquer situação assustadora na qual as pessoas sintam que estão perdendo o controle de suas vidas tornará algumas delas suscetíveis a teorias da conspiração."

"Nos Estados Unidos, por exemplo, as teorias da conspiração aparecem toda vez que há um tiroteio em massa, como o que ocorreu na Sandy Hook Elementary School (2012). Elas aparecem um ou dois dias depois e duram bastante tempo. E uma pandemia é o caso supremo de algo que assusta as pessoas e as deixam em dúvida", continuou Lewandowsky.

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Atualmente, tais fake news alcançam proporções muito grandes - o que pode levar a medidas drásticas. Se teorizam sobre as antenas 5G transmitirem Covid, ateiam fogo nelas. Se a conspiração fala sobre máscaras fazerem mal a saúde, param de usá-las, expondo-se à pandemia.

Em momentos de incerteza, é difícil saber no que acreditar, mas é preciso fazer um esforço para se apoiar nas informações verdadeiras. Ferramentas de checagem de dados existem, e os jornalistas explicam quais notícias, na realidade, são fake. Por isso, não se deixe levar pelas conspirações, por mais atraentes que sejam.

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