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NFT: como o futuro da venda da arte chegou no Brasil e porque conhecer novo modelo milionário de negócios

Non-Fungible Tokens, ou Tokens Não-Fungíveis, devem mudar o modo de consumo da arte - e André Abujamra e Uno de Oliveira entenderam nova tendência de negócios

Yolanda Reis | @_ysreis Publicado em 06/03/2021, às 10h00

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Frame de Coelhék, obra plástica de Uno de Oliveira e música de André Abujamra
Frame de Coelhék, obra plástica de Uno de Oliveira e música de André Abujamra

O que faz da Monalisa a Monalisa? Simples. É a própria Monalisa.

Não importa o quanto você queira, ou tente, ou pense. É insubstituível. A Monalisa é única. Assim como a Última Ceia, Noite Estrelada, ou Abaporu… Cada peça é una, original, tangível por si só e incomparável a qualquer outra.

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Agora… E uma edição em LP de “Twist And Shout”, a famosa música dos Beatles? Ou uma cópia em CD de  ...Baby One More Time, da Britney Spears? Os trabalhos são únicos, mas a arte tangível, não. Você pode trocar uma unidade de disco por outra - ao contrário de uma Monalisa. Você não a trocará por outra Monalisa.

Tudo isso é para explicar um conceito que você vai ouvir muito falar em breve: NFT, ou Non-Fungible Token. Traduzido: Token Não-Fungível. Explicado: produto criptográfico (praticamente digital) único, não comparável a outro, de existência exclusiva e não “trocável.” É a nova forma de vender arte online.

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Cada vez mais, e de repente, os NTF fazem parte da venda de arte online. Partiu da arte plástica e visual. Ou crypto art (de criptograma, códigos de números feitos ciberneticamente). Popularizou rapidamente. E criaram-se sites especiais para venda.

Agora, chegou na música. Se antes criava-se uma faixa e ela podia ser comprada por quem quisesse, agora, as melodias começam a se tornar NFT. Peças únicas e intransferíveis. O único dono é quem compra primeiro. Ele paga em criptomoedas e recebe um código digital único correspondente à peça em um acordo totalmente digital. Esses códigos são armazenados em “galerias” digitais específicas.

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Nos EUA, há dois exemplos frescos: Grimes e Kings of Leon. Ela fez 10 peças de arte únicas e as vendeu em leilão - um vídeo saiu por US$ 389 mil. Já a banda inovou ao lançar um disco no formato. When You See Yoursel(2021) foi vendido em uma plataforma especial como token e dava direito a “pedaços” especiais, como vinis, passeios ou ingressos. Como uma edição especial-limitada-de-colecionador de discos tradicionais. Mas online. Cada token é um, cada cópia do disco a própria Monalisa.

Então, só para resumir: um NFT é uma peça de arte única e digital, vendida no blockchain com moedas cripográficas. O valor real dela é único - o código dela é apenas dela. E isso traz, pela primeira vez, o valor mais “clássico” da arte para o mundo digital.

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O pioneiro sonoro BR

André Abujamra vendeu, nessa semana, o que deve ser o primeiro NFT musical brasileiro. Foi em parceria com Uno de Oliveira, artista plástico “calejado” em crypto art. Os dois são os orgulhosos criadores do duo animação-e-música Coélhek. É a primeira parte de uma produção de oito tokens, todos com um assunto em comum: o valor do neurônio.

Em entrevista à Rolling Stone Brasil, André e Uno explicaram como, em um bate papo sobre NFT por meio do app Clubhouse, resolveram se unir para encontrar uma maneira de expandir a própria arte e combinar as ideias para trazer tudo para o Brasil. O caminho foi uma reunião de ideias para serem vendidas - e, principalmente, valorizadas -  juntas.

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“Existem zilhões de artistas digitais," comentou Uno. "Para ganhar dinheiro na internet, precisa postar arte, se divulgar, pegar um freela, trabalhar em agência… Mas ganha muito pouco.” Para ele, a cryptoart é uma maneira de, pela primeira vez, dar renome a arte digital da mesma maneira como a clássica é apreciada. “Somos valorizados pela primeira vez! Agora, existe um mercado de colecionador. É muito disruptivo do ponto de vista do artista.”

A venda de NFT como arte abriu portas para artistas expostos na internet há muito tempo. A valorização da arte como arte, como produto tangível, retorna a possibilidade há muito um pouco desesperançosa para o mundo dos pixels e códigos binários: fazer dinheiro.

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Isso começou como tendência visual, e migrou para auditiva. Assim como o pioneirismo da Grimes, André Abujamra percebeu o potencial de, depois de muito tempo em streaming e digitalidades, ganhar dinheiro com o prestígio musical:

“Olha o meu caso: meu último disco, Emidoinã [2020]. Tinha mais de 20 mil visualizações, e o dinheiro recebido pelas plataformas foi ridículo. Pensei: ‘tem algo errado.’ Só o dinheiro que recebi do meu trampo com o Uno - chamo de Unoabu… Em uma noite, ganhei mais que seis meses nas plataformas!”

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Como vender?

Para vender uma NTF, é preciso entrar em uma galeria especializada no blockchain, a troca comercial de criptomoedas, e gerador de contratos para venda de cada um desses tokens. É um caminho árduo e disciplinado e o convite para uma comunidade quase exclusiva. No caso de Uno, foi assim:

“Meu amigo me mostrou isso em dezembro. Não dei bola no começo, e acabei perdendo um mês. Mas aí, já investia em criptomoeda, e percebi como poderia vender arte e ganhar assim. Era um super negócio. Comecei a entender. Isso no final de dezembro, não tinha nada na internet. Precisávamos desbravar.”

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Mas acabou esclarencido: é possível, sim, vender a própria arte em criptomoedas. “Existem vários sites. Alguns precisam de convites, outros não. Comecei a postar nos abertos, me inscrevia, como uma galeria de artes, mesmo.”

Existem, também, os ambientes “nata.” Galerias nas quais você é inscrito, questionado, futricado, analisado ao extremo, até ser aceito e poder entrar. É o caso da Makersplace, onde Uno e André venderam as próprias artes. Quando você entra, é um alívio: “Lá tem colecionadores, gente vendo sua arte, um fluxo grande de dinheiro rodando. É interessante, todo mundo agora quer entrar… Mas é difícil!”

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Lá dentro, no Makersplace, tudo acontece rápido, como percebeu um surpreso Abujamra. “Fiz essa música para o Uno. De repente, fui lá no site dele. Tinha uma oferta de US$ 600 para um quadro dele [cerca de R$ 3,4 mil]. [...] Depois, aumentou para US$ 1,5 mil, de madrugada, o cara destruiu! Alguém do Canadá comprou. No dia seguinte, me deu uma porcentagem. Fui olhar minha conta e ganhei mais de US$ 500!”

(Vale lembrar que, no blockchain, câmbio de valores de moedas criptografadas, o valor não é, oficialmente, o dólar. No caso do Makersplace, as NTF são vendidas em Ethereum. A criptomoeda mais conhecida, hoje, é o bitcoin).

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O futuro

Tanto André quanto Uno veem no NFT o futuro da venda de artes. Principalmente pelo modo como propõe-se: criptomoedas. “É facilitado,” acredita Uno. “Nesse universo, um bem descentralizado, sem ser gerido por uma grande corporação, essas transações são mais fáceis. Um universo de compra e venda de arte digital através de contatos inteligentes do blockchain.”

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André Abujamra Foto: Marcelo Macauê

Então, com compras mais fáceis, a venda também é mais fácil, e a “rotatoriedade” dessas obras faz o potencial de valor aumentar. “Alguém compra minha arte por US$ 1 mil, e esse colecionador pode vender para outas pessoas por US$ 2 mil, US$ 4 mil... “

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As possibilidades para isso são, literalmente, o mundo inteiro, acredita André. Questionado se a compra exclusiva pode impedir a popularidade do artista, argumentou: “Muito pelo contrário! É uma disseminação maravilhosa para o planeta todo. Quem comprou a obra do Uno é do Canadá. De repente, um japonês compra minha música. É bem legal.”

Assustador? Um pouco, admite. “Tudo novo assusta. Mas depois, se conformam. Tudo vem para revolucionar, assim como a criptomoeda. E o NFT.”

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As obras dos artistas

Esta semana, Coélhek abriu as portas do NFT musical no Brasil. A obra é uma animação de Uno com uma música de Abujamra, e busca explorar a cultura do país. O próprio nome é um jogo cultural: brinca com "coé, lék", contração carioca de um "qual é, moleque." Quase um "como vai," para os conversavores.

Ganhou nome de Coélhek e formato de brasileiro: "É um moleque da favela," explicou Uno. "Um traficante por falta de opção na vida. No fundo, é um cara com coração pulsante, porém vazio."

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É o primeiro de oito volumes da coleção TROPICALFUTURISM, parceria dos artistas. Cada NFT terá uma música de divididas em 1 minuto e 75 milésimos de segundo, totalizando 8’6”. E todas obras trataram do país. Como publicou Uno no Instagram: 

"A cultura dos povos latimoamericanos é ligada a crenças, miscigenação de ancestrais indígenas e africanos. Hoje somos futurotropicalistas ou tropical futuristas. Heróis de uma sobrevivência na crença de um futuro melhor."

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Todas as NFT de Uno e André estarão disponíveis no Makersplace do artista plástico. Lá, há a exposição de diversas cryptoarts dele.


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