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O dia em que os Beatles acabaram e a música pop chorou [ESPECIAL]

Em 10 de abril de 1970, o tabloide britânico estampou na capa a manchete: “Paul McCartney deixa os Beatles”

Guilherme Bryan, em colaboração para a Rolling Stone Brasil* Publicado em 10/04/2020, às 10h21

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Os Beatles em 1968 (Foto: AP Images)
Os Beatles em 1968 (Foto: AP Images)

Em 10 de abril de 1970, o tabloide britânico Daily Mirror estampou, na capa, a manchete: “Paul McCartney deixa os Beatles”. Foi o dia em que a música pop chorou. 

"O beatle Paul McCartney confirmou hoje que rompeu com os Beatles – mas ‘não sabe’ se o rompimento é temporário ou permanente", dizia o texto.

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A notícia, porém, não era tão inesperada quanto se pode imaginar. Há vários meses, parecia estar na eminência de ser anunciada e que mudou para sempre a história do rock e da música pop. Os Beatles haviam acabado.

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O anúncio coube ao vocalista, multi-instrumentista e compositor, e hoje também sir, Paul McCartney, que foi muitas vezes apontado como traidor e oportunista.

Houve quem o acusasse de ter aproveitado essa notícia bombástica para lançar o primeiro álbum solo dele, batizado apenas “McCartney”, apenas sete dias depois. Porém, é fato também que John Lennon e George Harrison já haviam lançado seus próprios álbuns solo antes dele e a banda praticamente não fazia mais nada desde janeiro de 1970, quando Paul, Harrison e Ringo Starr gravaram a última música da banda – “I Me Mine”, incluída em “Let It Be”.

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O disco de McCartney era o mais temido e a revelação de que ele vinha trabalhando nele há mais de um ano, praticamente em segredo, caiu como uma bomba. No livro “John Lennon A Vida”, do jornalista britânico Philip Norris, há uma declaração muito sincera de Lennon: “Paul simplesmente fez uma grande autopromoção. Eu queria fazer aquilo e devia ter feito. Pensei: ‘Porra, que merda, que babaca eu fui...’. Fui um babaca em não fazer aquilo, em não fazer o que Paul fez, que era usar o lance para vender um disco”.

Paul McCartney, o traidor

De acordo com Norman, John Lennon teve raiva dele mesmo, por ter dado ouvido a seu espírito de equipe e a todos os apelos do maior ressuscitador da banda, que agora roubava as manchetes, abandonando um palco que John, George e Ringo já haviam deixado seis meses antes.

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Ao mesmo tempo, se sentiu aliviado quando Paul disse ao telefone: “Estou fazendo o mesmo que você e Yoko e lançando um álbum. E também estou saindo do grupo”.

Em entrevista dada à revista Rolling Stone EUA, trinta anos depois, e reproduzida na biografia “Many Years From Now” (1997), do jornalista Barry Miles, Paul McCartney se defendeu: “Não acho que tenha traído alguém. Ninguém mais do que eu lutei para manter a banda unida entre 1968 e 1970, quando os outros não estavam interessados. Fiz de tudo e quis levar os Beatles adiante, mas não deu. Então, diante disso, eu me senti no direito de anunciar o rompimento”.

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Paul McCartney, o ingênuo

No mesmo livro, Paul conta que não queria fazer uma coletiva para lançar o álbum batizado apenas com o sobrenome dele e nem fazer qualquer tipo de publicidade. Mas Peter Brown, que trabalhava na Apple, sugeriu que ele respondesse algumas perguntas, cujas respostas seriam enviadas à imprensa, o que foi aceito, desde que fosse feito por escrito.

“Peter Brown tinha percebido que a grande questão eram os Beatles e, por isso, colocou algumas perguntas bem tendenciosas. E eu, em vez de dizer simplesmente que não queria respondê-las, pensei comigo mesmo: ‘Ah, foda-se! Se é isso que ele quer saber, eu vou responder!’. Achei que nunca poderia começar vida nova se não contasse as pessoas”, diz Paul.

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No tal questionário, havia a pergunta “Seu rompimento com os Beatles é temporário ou definitivo? Ele se deve a diferenças pessoais ou musicais?”. A qual, McCartney respondeu: “Pessoais, comerciais... Mas aconteceu sobretudo porque, para mim, é melhor estar com a família. Se é temporário ou definitivo? Não sei”.

Segundo o biógrafo Barry Miles tratava-se apenas de um pouco mais do que John Lennon vinha dizendo durante meses, mas, claro, caiu como uma bomba, que resultou, inclusive, na briga dos amigos Ringo Starr e Paul McCartney. Mesmo assim, “Let It Be” ainda seria lançado, em 8 de maio de 1970, e o filme ganharia um Oscar.

Beatles saem de cena e viram lendas

O fato é que o anuncio de Paul McCartney, feito naquele dia, nunca mais foi esquecido, como conta o jornalista americano Bob Sptiz, no livro de quase mil páginas, “The Beatles – A Biografia”: “Por um momento, o anúncio de Paul deixou tudo em suspenso. Uma quietude lúcida preencheu o vazio. A música se quedou silenciosa. Toda a tensão se desfez, a demanda pelo superestrelato inimaginável cessou. Por um momento, o mundo que conheciam tinha parado de rodar, parecia perfeitamente em paz."

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O texto segue: "Quanto aos Beatles, tinham atingido o toppermost of the poppermost. Tinham encontrado as multidões, ouvido os gritos, sentido o amor. Visto a luz. Por um breve e brilhante intervalo, tinham vivido um sonho que ninguém em Liverpool poderia ter imaginado – um sonho mágico, fabuloso, como um conto de fadas. Um sonho inesquecível. ‘Foi maravilhoso, e acabou’, afirmou John, para todos os que esperavam por um sinal. ‘E assim, queridos amigos, vocês vão ter de continuar. O Sonho Acabou’. Mas a lenda dos Beatles tinha apenas começado”. Prova é que, de acordo com a revista “Forbes”, apenas em 2013, os fab four faturaram cerca de 71 milhões de dólares. E, no ano passado, houve mais de 1,7 bilhões de acesso, no Spotify, a edição especial de 50 anos do álbum “Abbey Road”.


*Guilherme Bryan é professor do Centro Universitário Belas Artes e autor dos livros Quem Tem um Sonho Não Dança - Cultura Jovem Brasileira dos Anos 80, e Teletema - Uma História da Música Popular pela Teledramaturgia (com Vincent Villari).