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O futuro do jornalismo musical está... no TikTok

Perfis de música no TikTok cresceram durante a quarentena e estão ajudando a dar destaque a novos artistas

Elias Leight, Rolling Stone EUA Publicado em 16/12/2020, às 19h03

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Oscar Welch e Tom the Mail Man (Fotos: Will Lemay e Young Forever Inc.)
Oscar Welch e Tom the Mail Man (Fotos: Will Lemay e Young Forever Inc.)

Perto do fim do mês de setembrom Sam Levine, empresário do artista em ascensão Tom the Mail Man, notou uma crescimento inesperado no número de streams do rapper e cantor.

Após uma busca na internet, Levine descobriu a origem desse crescimento: um post de MostleyMusic, uma conta do TikTok que funciona de forma semelhante a um blog de música dos anos 2010, destacando novos artistas e também apresentando informações diretas sobre acontecimentos como o desentendimento judicial entre Chance the Rapper e o ex-empresário.

No dia 23 de setembro, MostleyMusic recomendou uma música de Tom the Mail Man, e o elogiou pelas "melodias grudentas". Durante os três dias seguintes, o número de reproduções do cantor subiu aproximadamente 10 mil por dia.

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"Geralmente, o que representa sucesso em uma campanha no TikTok é a reprodução", contou Levine, que também trabalha para uma empresa de marketing digital chamada Contrabrand. "Isso foi apenas um post que representa o poder da plataforma do Mostley".

MostleyMusic faz parte de um grupo de contas no TikTok, junto com Loveinamovie e Hahakcoolgottagobye, que prosperaram durante a quarentena e ajudam a base massiva e jovem de usuários do TikTok a peneirar o número incontável de músicas que são adicionadas diariamente às plataformas de streaming.

"Não existem muitas outras formas pelas quais os jovens da Geração Z entram em contato com músicas novas, a não ser playlists feitas pelo Spotify ou no boca-a-boca", afirma Ari Elkins, usuário do TikTok que faz vídeos animados de recomendações, e que aumentou de 500 seguidores para 500 mil nos últimos oito meses.

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Existe "um vazio quando o assunto é curadoria musical para a Geração Z", e ele está feliz em preencher esse buraco. 

"Esse jornalismo musical meio influencer, meio vlogger, talvez seja o futuro", acrescenta Levine.

Isso se deve parcialmente aos pontos-cegos presentes nas mídias mais tradicionais: jornalismo de música mainstream se mostra vastamente desinteressado em promover descobertas, focando apenas na cobertura superficial de superstars e em infinitas listas que têm como objetivo atrair acesso — que pode funcionar para uma base de leitores, mas falha na hora de conquistar fãs de música novos e mais jovens. É aqui que começa a ascensão do blogs de música no TikTok.

"Quando vejo as entrevistas desses artistas, a maioria delas é conduzida por apresentadores de rádio de 50 anos, da cidade do Kansas", diz Max Motley, responsável pelo MostleyMusic. "Sem querer diminui-los, mas muitos desses [artistas] são Geração Z, e eu sou Geração Z, então tenho uma perspectiva diferente, e consigo perguntar a eles coisas que as pessoas da minha idade têm curiosidade em saber".

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Motley trabalhou por três anos na estação de rádio da faculdade, e estagiou na agência de talentos Paradigm. O plano dele era batalhar por uma vaga que o colocasse dentro da indústria da música, assim que se formasse. Mas ao invés disso, veio o Covid, e o obrigou a improvisar.

"Sem o meu programa de rádio, eu sentia falta de compartilhar música", conta. Mas "não existe muito propósito em criar um site ou escrever artigos se todo mundo pode consumir tudo que precisa nas redes sociais, e isso não leva uma hora ou duas para elaborar e editar um post e manter um site". Motley então mergulhou no TikTok, com o argumento de que "vídeo é mais digerível". 

A conta Loveinamovie tem uma história parecida. Assim como Motley, o fundador Ananmay Sharan era fã dos blogs que reinaram entre 2013 e 2014, principalmente Pigeons & Planes. Também como Motley, ele estava entediado durante a quarentena.

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"Decidi fazer um blog de música, mas infelizmente ninguém mais lê isso", explica Sharan, que está no terceiro ano do curso de geografia e ciências da computação. "Ninguém da minha idade entra em um blog de música para encontrar artistas. Então decidi ir para o TikTok — é o que todos os meus amigos usam."

Sharan faz lip-sync com as músicas que seleciona, e usa a própria performance para adicionar peso às recomendações, além de frequentemente anunciar que a canção tem dezenas de milhares reproduções no Spotify. "Todo mundo pode ir em uma playlist enorme e descobrir o que está bombando", diz. "Prefiro destacar alguém que seja independente".

Em outubro, o perfil Loveinamovie postou um vídeo no qual recomendava as músicas "Sixteen", do Oscar Welch, "Last Night!" do Gaff e "Am Sleep", do Dvr.

O vídeo alcançou um milhão de visualizações no TikTok, e esse desempenho foi marcante principalmente nas Filipinas, onde, pouco tempo depois, a faixa de Welch foi parar da 6ª posição da playlist do Spotify Viral 50. Essa é um pico de popularidade muito além do que qualquer artigo de um veículo tradicional consegue conquistar.

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Isso também evidencia a grande diferença entre um veículo mais datado que publica histórias na internet e o TikTok: o segundo está inserido em um sistema criado para gerar conteúdo viral. "Com um blog, existe um limite de pessoas que você consegue alcançar", diz Sharan. "Nesse caso [o TikTok] possui um algoritmo que distribui [os vídeos] para pessoas que conseguem ouvir a música direto".

Usuários do TikTok podem ouvir uma música em um post do Loveinamovie e imediatamente fazer um vídeo próprio, além de compartilhar com os seguidores sem qualquer conflito. E não para por aí: Motley e seus companheiros direcionam o tráfego do TikTok para as respectivas contas do Spotify, o que aumenta ainda mais a chance de gerarem uma atividade no streaming.

Por isso não é surpresa alguma que a indústria da música já esteja rondando essa área do TikTok, mostrando novos artistas aos donos dessas contas e buscando oportunidades de colaboração.

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Essas conexões podem solucionar um problema que nem o algoritmo celebrado do TikTok conseguiu resolver ainda: a dificuldade de blogueiros serem pagos. Motley conta que está pensando em monetizar os vídeos, menciona estar em busca de alguém para patronicar a série Rising Artists (Artistas em Ascensão), ou cobrar para "divulgar ainda mais os artistas nos quais acredito", mas nada está ainda resolvido.

A necessidade de ganhar dinheiro pode eventualmente forçar os TikTokers a se tornarem marqueteiros, trocando as próprias preferências, algo que deu a eles os seguidores, por prioridades mercenárias de selos mainstream.

Mas caso esses TikTokers cedam a essa pressão, acabarão mais próximos do jornalismo musical tradicional, que nunca foi isento de influências.

Hoje, publicações costumam ser agradáveis nos textos, para garantir o acesso a grandes nomes, e alguns selos e plataformas de streaming inclusive têm o próprio veículo.

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A maior parte da cobertura musical está acorrentada ao ciclo de lançamento de álbum, apesar disso ter pouco impacto nos hábitos dos ouvintes jovens — principalmente porque esse cronograma tem o propósito de servir às demandas promocionais de artistas e selos.

A velocidade com a qual tudo se move nas redes sociais obriga TikTokers que eram desconhecidos há alguns meses a já procurarem um jeito de se adequar às pressões mencionadas anteriormente, e para piorar: fazer isso sem o apoio institucional do jornalismo tradicional.

Mas nesse momento, alguns dos jovens por trás dessas contas estão apenas tentando passar nas provas finais. Sharan também está trabalhando em uma e-zine com outros fãs de música, ao mesmo tempo em que tenta se acostumar com a fama na internet. "Ontem Dominic Fike comentou em um vídeo meu", contou incrédulo. "Isso é insano".

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