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O mundo só acaba para quem quer

Suco de laranja, caca de elefante e conflitos juvenis: Antes Que o Mundo Acabe, de Ana Luiza Azevedo, é a típica cria da Casa de Cinema de Porto Alegre

Por Anna Virginia Balloussier, de Paulínia Publicado em 17/07/2009, às 08h00

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Adeus, primeiro amor. Adeus, cultura local. Adeus, mundo como antes o conhecíamos. Apresentado na quarta, 15 - última noite de competição do 2º Festival de Paulínia -, Antes Que o Mundo Acabe mostra o sufoco de Daniel (Pedro Tergolina), um menino de 15 anos que precisa lidar com o fora da namorada (que não sabe se vai ou se fica), o pai desconhecido (que soube que ia) e a vida na pacata Pedra Grande (que não foi com o tempo, só ficou... na mesma). Mas é bem menos fatalista do que o título propõe. E também menos teen do que o elenco, com núcleo juvenil, possa sugerir de cara.

Cria da Casa de Cinema de Porto Alegre, de onde saíram filmes como Saneamento Básico, o Filme e O Homem Que Copiava, Ana Luiza Azevedo faz sua estreia em longa. A produção, baseada no livro homônimo de Marcelo Carneiro da Cunha, não se distancia da fórmula já consagrada pelo pólo cinematográfico: bambear entre o indie e o popular, com diálogos espertinhos (daqueles capazes de misturar "cocô de elefante", "Tailândia" e "suco de laranja" na mesma linha de pensamento) e trilha que resgata "Beat Acelerado", da banda oitentista Metrô.

A história engrena quando, certo dia, a vida de Daniel vira de ponta-cabeça. Sua namorada pede um tempo porque está dividida entre ele e seu melhor amigo. Na mesma época, seu pai, que partiu para o outro lado do planeta antes de ele nascer, manda uma carta da Tailândia - fotógrafo premiado com um Pulitzer, ele sente essa compulsiva vontade de registrar culturas ermas "antes que o mundo acabe".

O flerte com a ideia de uma mesma mulher dividida entre os dois amigos funciona como uma espécie de reedição de Jules et Jim, de François Truffaut. Ponto para a diretora, ao lado dos "comparsas" Jorge Furtado, Giba Assis Brasil e Paulo Halm, que a ajudaram com o roteiro. Sem queimar sutiãs em praça pública, Azevedo reposiciona a mulher no mapa amoroso (a história cita, inclusive, as culturas poliândricas - em que uma mulher pode ter vários maridos -, bem menos pop que as poligâmicas). "Mim [a personagem] não quer ter um amor só. Os homens não entendem isso!", explicou com bom-humor a cineasta, na coletiva de imprensa realizada nesta quinta, 16, sobre o "motim" de parte da ala masculina da equipe.

Antes Que o Mundo Acabe é isto: patchwork com retalhos do retrô e do moderno. A cidade do interior em que bicicletas são meio de transporte muito mais usado do que automóvel não tem uma lan house sequer - mas os adolescentes do filme manjam os macetes da internet como qualquer garotão de São Paulo. Quem pega no batente é a mãe de Daniel, enquanto o padastro cuida da casa. Mim pode ter dois namorados e nem por isso o mundo vai acabar - talvez apenas o do machismo.

Há este filme de 2006, Como Eu Festejei o Fim do Mundo, sobre jovens que batem de frente com regras da Romênia comunista. O que isso tem a ver com nossa discussão? Além do parentesco no título, as duas produções falam sobre o amadurecimento do jovem - processo que, se isento de conflito, merece menção honrosa no Nobel da Paz. Mas falam sobre essa fase de descobertas respeitando as peculiaridades de cada lugar. O mundo como os jovens antes o conheciam muda a toda hora - seja no Brasil, na Romênia ou na Tailândia. Festeje o fim do mundo antes que ele acabe - porque um novo te espera na esquina.