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Robert Kirkman: "Eu posso fazer mil edições de The Walking Dead"

"Tenho um final em mente e escrevi a última cena outro dia", diz o autor das HQs e um dos roteiristas da famosa série de TV

DAVID PEISNER Publicado em 13/10/2013, às 12h47 - Atualizado às 12h51

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Robert Kirkman - Paul A. Hebert / AP
Robert Kirkman - Paul A. Hebert / AP

Quando você começou a pensar em escrever quadrinhos?

Meu sonho era escrever e ilustrar meus próprios quadrinhos, porque meus livros favoritos eram escritos e ilustrados por escritores-artistas, caras que faziam a coisa toda sozinhos. Quando eu cresci e percebi que eu era um péssimo artista e não era bom o suficiente para ilustrar, fiquei um pouco chateado. Então, percebi que a parte de escrever era mais divertida e, você sabe, menos demorada.

The Walking Dead: os momentos mais surpreendentes da 2ª parte da 3ª temporada.

Você fez faculdade?

Não. Não fiz nada no meu último ano do ensino médio. Eu era um estudante de arte, então falava para minha professora,]: “Vou me dedicar ao meu trabalho de arte”. Eu ia embora e ia passear e comer no Long John Silver’s. Quer dizer, eu conseguia passar tirando notas B, notas C, mas sabia que aquela educação não era para mim.

Quando você começou a HQ de The Walking Dead, o quanto da história já tinha mapeado na cabeça?

Naquele momento, muitos dos meus livros haviam fracassado, então não estava na posição de dizer: “Esse quadrinho é um filme de zumbi que nunca tem fim, e vai durar anos e anos e anos”. Mas eu tinha anos de histórias planejadas quando a primeira edição foi lançada. Eu sabia que eles iam chegar à prisão. Eu sabia que eles teriam aquele lugar onde estariam seguros e que fundariam uma pequena civilização.

Que tipo de coisa você estava lendo e assistindo quando começou a criar esse mundo?

Eu fiz uma pesquisa extensa sobre a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto, porque aquilo era a versão moderna equivalente ao quer seria sobreviver a um apocalipse. Muitos lugares na Europa estavam completamente bombardeados, e coisas horríveis aconteciam às pessoas. Eu tive aquilo como referência de como seria quando os personagens fossem levados aos seus limites.

Você pensou que aquilo fosse algo que pudesse funcionar na TV?

As pessoas me perguntavam: “Não seria incrível se fosse um programa de TV ou um filme?” E eu sempre dizia: “Bem, nunca será um programa de TV ou um filme”. Nunca houve nada igual na televisão. Zumbis são, essencialmente, pessoas que comem pessoas, então é um show canibal. “Não consigo visualizar um show canibal na televisão”, pensei.

Você se considera mais ou menos fiel aos quadrinhos do que os outros roteiristas do show?

A partir do momento que estou escrevendo o roteiro, é completamente diferente dos quadrinhos. As grandes mudanças da HQ acontecem na sala dos roteiristas quando todos estão discutindo coisas. Eu me sinto menos verdadeiro ao quadrinho do que muitas pessoas porque seria incrivelmente chato se eu ficasse na sala dos roteiristas falando de coisas que escrevi há seis, oito, dez anos. Eu quero que as pessoas possam dizer “isso não funcionou na HQ” sem ter medo de que eu fique bravo.

Você tenta manter certa distância entre você e o elenco, sabendo que terá que matar alguns deles?

Isso é difícil. Eu sei que às vezes fico desconfortável perto dos atores. Recentemente, houve uma morte no programa e eu estava no set assistindo. Foi estranho porque todo mundo no set está triste, o ator está triste porque o tempo dele na série está acabando. É uma coisa muito emocional. Teve uma discussão sobre a morte dessa pessoa, e eu defendi aquilo! Agora, estou cercado por todas essas pessoas que não queriam que isso estivesse acontecendo! Mas, sim, às vezes fica um clima estranho. Ter que remover alguém da família é algo absolutamente terrível.

Como é o clima na sala dos roteiristas?

Às vezes, fico decepcionado porque ouço histórias de outras salas de roteiristas que as pessoas jogam seus almoços na parede e estouram. Parece muito emocionante! A nossa sala de roteiro são oito pessoas na sala de estar conversando sobre coisas que eles gostam.

Como tem sido sua relação com os produtores executivos? Há uma tensão sobre quem vai conduzir a história?

Eu tive uma boa relação com todos os produtores executivos até agora. Na minha mente é: “Estou à disposição”. Scott Gimple é quem tem a palavra final. Se Scott quer fazer uma história que eu não quero, chamo-o de lado e pergunto: “Você realmente quer fazer isso? Talvez nós devêssemos fazer algo diferente”. Mas eu reconheço que a série é a série e a HQ é a HQ. Posso fazer o que eu quiser nos quadrinhos.

Como você se sente tendo passado por três produtores executivos em quatro temporadas?

Showrunners mudam o tempo todo em vários programas, por uma série de razões diferentes. E, para você saber, é uma pena que chamem tanta atenção para esse aspecto de The Walking Dead que também acontece em outras séries. Dexter já teve mais showrunners do que The Walking Dead teve no mesmo período de tempo. Hell on Wheels acabou de trocar de produtor executivo.

Quais características suas aparecem em The Walking Dead?

Coisas bobas. Eu trabalhei numa pizzaria, então é por isso que Glenn trabalha numa pizzaria. Uma coisa engraçada é que eu não tinha filhos quando comecei The Walking Dead. Quando escrevi a relação entre Rick e Carl, eu era o Carl e meu pai era o Rick. Depois, meu filho nasceu por volta da trigésima edição, então, agora quando escrevo eu sou o Rick e meu filho é o Carl.

A série tem uma audiência incrível, mas que não equivale à opinião dos críticos. Isso te incomoda?

Eu acho que seria legal ter um Emmy só porque eu sou do Kentucky e nenhum dos meus amigos tem um Emmy. Mas eu trocaria um Emmy por boa audiência a qualquer momento. Além do mais, existem outros mil programas ótimos na televisão agora. Então não posso reclamar sobre o The Walking Dead ser esnobado quando eu mesmo classificaria quinze shows acima de The Walking DeadBreaking Bad, Mad Man, Homeland, The Americans e American Horror Story, por exemplo.

Por mais quanto tempo você poderia continuar com os quadrinhos?

Estou calculando. Estou com 34 anos. Quando tiver chegado aos 65, terá ido bem longe. Se eu não me entediar e as pessoas continuarem envolvidas na história, eu posso lançar mil edições de The Walking Dead. Será possível então contar uma história que passa pelo colapso da civilização, segue para os anos sombrios e para o renascimento da civilização, onde tudo é completamente diferente. Pode haver uma edição 700 de The Walking Dead que seja sobre as pessoas entregando correspondência. Me parece estimulante.

Você tem um final em mente para toda a história?

Eu tenho um final em mente para a HQ e escrevi a última cena outro dia. Sei como quero que seja o diálogo final. Pode ser que mude, mas o interessante é que eu nunca posso contar para ninguém envolvido no show sobre o final que tenho em mente porque é provável que a HQ continue depois de a série acabar. Não pode ter nada a ver com o final que eu planejo para o programa, porque se ele acabar na temporada 12 e a HQ continuar por mais oito, dez, ou 20 anos, o final vai ter sido estragado. E isso me tiraria do sério.

Existe alguma filosofia ou mensagem que você sente que é reforçada na história?

Seja grato pelo o que você tem. Às vezes, eu penso como a vida não está legal no momento. Nós cometemos um erro em algum momento de nossas vidas, há cem anos, quando morávamos em casas que nós construíamos, plantando a comida que comeríamos, interagindo com nossas famílias e vivendo nossas vidas. Olhando pra essa era, parece bom. Essa é a vida que faz sentido. Agora trabalhamos em empregos que não gostamos pra comprar coisas de que não precisamos. Não quero soar como o Tyler Durden, mas parece que ferramos tudo. Parece não haver movimentação para continuar a evoluir o jeito como vivemos, quem somos e qual o nosso propósito como seres humanos. Isso é uma pena. Então, é divertido olhar para o mundo de The Walking Dead e enxergar o que foi tirado de nós. A vida vai ser melhor? Muitas pessoas acham que o show é muito solitário e depressivo. E é, às vezes. Mas consigo ver o rumo da história nos próximos dez anos e eu o vejo de maneira otimista. Talvez nos torne pessoas melhores no final das contas.

Então, é o apocalipse zumbi como uma grande faxina?

[Risos] Talvez. Mas eu vou dizer, eu amo Pizza Hut e assistir a DVDs, então não quero que aconteça. Mas você não preferiria estar plantando uma cenoura agora, em vez de estar falando comigo?

Tentei plantar cenouras uma vez e elas nasceram deformadas e pequenas e com um gosto horrível.

Acho que a grama do vizinho é sempre mais verde.