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Rolling Stones voltam a SP depois de 18 anos provando que foram feitos para o palco

Quarteto britânico tocou pela primeira vez no estádio Morumbi na noite da última quarta-feira, 24

Lucas Brêda Publicado em 25/02/2016, às 05h11 - Atualizado às 13h04

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Rolling Stones em São Paulo (25/02) - Roberto Larroude
Rolling Stones em São Paulo (25/02) - Roberto Larroude

Os Rolling Stones passaram 18 anos sem se apresentar em São Paulo. Na última quarta, 24, eles voltaram à capital paulista, estreando no estádio Morumbi, para fazer o primeiro dos dois shows do grupo na cidade (o segundo acontece no mesmo local no próximo sábado, 27).

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O quarteto britânico teve uma noite tipicamente paulistana, de muito trânsito nos arredores – com grande parte do público chegando nos minutos anteriores à apresentação, marcada para 21h – e uma garoa inconstante, que fez surgir as capas de chuva, apesar de não atrapalhar efetivamente as performances.

Levando em conta que os Stones não têm um disco de inéditas recente para promover, eles passearam previsivelmente pelos clássicos de mais de 50 anos de carreira. O setlist do primeiro show da turnê latina Olé em São Paulo, contudo, abriu espaço para duas músicas não tão frequentes: “Bitch” (do disco Sticky Fingers, 1971), escolhida pelos fãs em votação na internet, e “Worried About You” (de Tattoo You, 1981), não tocada desde 2014.

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Ainda assim, o show começou com as quatro faixas iniciais quase protocolares da atual excursão: a apropriada “Start Me Up”; a mais emblemática faixa do grupo, “It's Only Rock 'n' Roll” – com os solos de Keith Richards quase minguados pela chuva –, a melódica “Tumbling Dice” e a misteriosa “Out Of Control”, que fez apagar as luzes do estádio e cresceu com a abordagem sensual de Mick Jagger.

“Olá paulistas, olá moçada”, saudou Jagger, com um português muito espontâneo. “Estamos no Morumbi pela primeira vez. Dezoito anos. Não acredita, Sampa”. A esta altura, a chuva já havia praticamente cessado e Jagger dobrava as mangas da camiseta aberta, já sem o casaco com o qual ele iniciara a apresentação. “Vocês votaram nessa música”, disse ele, anunciando a faixa seguinte.

“Bitch”, escolhida pelos paulistas, ganhou versão recheada de metais e foi, paradoxalmente, recebida com certa frieza pelo público. Já a performance seguinte, a poderosa balada “Beast of Burden”, gerou euforia e contou com um duo vocal contagiante entre Jagger e o backing vocal Bernard Fowler (em abordagem tecnicamente mais precisa, mas bem menos ameaçadora que quando o vocalista fazia o mesmo dueto com Keith Richards).

Com o entusiasmo habitual (para ele, não para qualquer outra pessoa de 72 anos de idade), Jagger liderou Richards, Ron Wood, Charlie Watts e companhia em mais uma apresentação potente da banda. “Worried About You”, surpresa da noite, levou o vocalista ao teclado, de onde soltou falsetes e fez mais uma das performances recebidas de maneira morna pela plateia da noite.

Os Stones arrancaram coro do público com uma versão elétrica – ainda que lenta – da antiga “Paint it Black”, antes de Jagger apresentar os integrantes da banda. O baterista Charlie Watts, conhecido pela simplicidade e pelo jeito de tocar quase mecânico, chamado por Jagger, foi timidamente à frente do palco, sorrindo, parar cumprimentar o público e gerar uma euforia comicamente antagônica à sua persona.

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Ainda mais ovacionado, Keith Richards assumiu o microfone para um par de performances, “You Got The Silver” e “Happy”. “Tenho um show para fazer”, disse ele no intuito de abafar os gritos de “Keith” (ou “quif”, aportuguesado) por parte da plateia. Uma das lendas vivas do rock, Richards pode ter perdido um pouco da vitalidade para solar e cantar, mas ele continua com o mesmo deslumbramento pelo instrumento a cada acorde.

“No palco eu não penso, só sinto”, disse ele certa vez. A frase se faz valer a cada expressão do guitarrista, que pode não ser o mais virtuoso no instrumento, mas praticamente forjou o jeito de tocar desleixado e orgânico que dá a espontaneidade necessária para o som dos Rolling Stones continuar vibrante depois décadas. Ao lado de Wood – passeando com o slide pelo violão –, ele se deleitou em “You Got The Silver” e comandou o time de backing vocals em “Happy”.

Com Jagger de volta e empunhando uma gaita, os Stones tocaram “Midnight Rambler”, que teve solos agressivos de Ron Wood e soou até comportada perto do teor sonoro e da letra da gravação original. Sem os metais e backing vocals, a performance da faixa de Let It Bleed (1969) fez o quarteto soar básico e sujo, como se estivesse tocando na garagem de uma casa e não em frente a cerca de 60 mil pessoas no Morumbi.

Poderia ter sido a noite menos inspirada da carreira dos Stones e ainda assim, com um setlist com algumas das maiores músicas de todos os tempos, estaria justificado todo e qualquer alarde. Não foi o caso em São Paulo, onde a banda puxou uma sequência avassaladora antes do bis: “Miss You” – com solo de baixo e coro de “uh uh” – “Gimme Shelter” – crescente, com a backing vocal Sasha Allen brilhando ao lado de Jagger –, “Brown Sugar”, “Sympathy for the Devil” e “Jumpin' Jack Flash”.

O Coral Sampa, com 24 cantores, retornou ao palco junto à banda, dando início a “You Can't Always Get What You Want”. Usando uma espécie de boina, Jagger se entregou na performance da provável maior balada dos Stones. Com uma mensagem tão universal quanto dura, a canção segue capaz de preencher estádios e arrancar lágrimas do mais cético pessimista.

Diferente de muitas bandas que viram “empresas” – e acabam caindo na repetição quase automática de uma fórmula de shows para o resto da carreira –, os Stones sabem dosar o protocolar e o espontâneo, o ensaio e o improviso, sem nunca demonstrar desinteresse em ação.

Para uma banda que lotava casas de shows antes mesmo de começar a compor, enfrentar milhares em estádios depois de tantas décadas é um destino natural. Seja com Richards debruçado sobre a guitarra ou Jagger dançando freneticamente, os Stones provam, no palco, que sua arte só é plena quando está viva, pulsando nos altos falantes, em contato físico com o público.

Em versão prolongada, “(I Can’t Get No) Satisfaction” encerrou o primeiro show dos Rolling Stones em São Paulo em 2016, deixando a impressão de que não importa o quanto a banda esteja afiada, eles nunca se darão por satisfeitos. Só assim é possível responder ao supracitado questionamento de quando os Stones vão parar: assim que acabar o prazer de subir em um palco e tocar dezenas de músicas para pessoas tão sedentas quanto eles.

Sorte dos paulistas, que poderão ver novamente os Rolling Stones em busca de satisfação no próximo sábado, 27, no mesmo estádio Morumbi. Os gaúchos também verão o quarteto em ação no dia 2 de março, no estádio Beira Rio.