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Fernanda Takai, quase normal

Na carreira de cantora, Fernanda nunca se expôs tanto quanto agora. Aos 42 anos, ela lança um disco de músicas próprias e versões improváveis, enquanto percebe que a vida às vezes pode dar tapas na cara

Pedro Antunes Publicado em 11/03/2014, às 07h58 - Atualizado em 19/03/2014, às 09h47

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Escurinho
Fernanda Takai está sempre bem acompanhada - Daniel Aratangy
Escurinho Fernanda Takai está sempre bem acompanhada - Daniel Aratangy

"Ao longo dos anos, percebi que era bacana usar outra linguagem para somar à música." É fim de tarde de uma quarta-feira de fevereiro, e Fernanda Takai está no topo de São Paulo, no bar localizado no 42º andar do Edifício Itália, bebericando um Limone (drinque da casa preparado com gim, limoncello e suco de limão). Ao lado dela, uma janela enorme que rodeia o bar e dá uma visão ampla da cidade em dias ensolarados como aquele. Fernanda tem gel no cabelo e usa um vestido preto, discreto, e praticamente não chama a atenção dos outros presentes no local.

Levando ao limite a filosofia da vida ordinária, Fernanda Takai e John Ulhoa se apoiam na rotina discreta de pais de família dedicados e brincam de roqueiros transgressores nas horas vagas.

A normalidade e o lúdico coexistem há 42 anos nesse universe muito particular de Fernanda Barbosa Takai. Além de ser vocalist do Pato Fu, uma das mais inventivas bandas da década de 1990, ela já é dona de uma consistente carreira solo. A discografia própria, aliás, ganha mais um álbum para o catálogo com o recém-lançado Na Medida do Impossível. São 22 anos de carreira e, quase na metade desse tempo, ela se divide entre a música e a pequena Nina, 10 anos (“Faz 11 em outubro”, a mãe lembra, orgulhosa), filha dela com John Ulhoa, também integrante do Pato Fu e com quem é casada desde 1995.

Depois de um trabalho repaginando canções eternizadas na voz de Nara Leão (Onde Brilhem os Olhos Seus, de 2007), um ao vivo (Luz Negra, em 2009) e um acaso que se tornou o álbum de bossa nova com Andy Summers, ex-guitarrista do The Police (Fundamental, 2012), Fernanda enfim assina um disco que a representa como nenhum outro na carreira solo, cujo título e o repertório são tão cheios de improbabilidades que farão o ouvinte questionar se algum dia soube qual era a verdadeira Fernanda Takai. “Gosto do improvável”, diz ela, passando a mão pelo cabelo endurecido de gel e relembrando a sessão de fotos da qual foi protagonista horas antes. “O que, hoje, acabou sendo representado pelo nosso amigo gorila.”

Este disco traz algumas músicas próprias,diferentemente dos outros trabalhos solo. Isso gerou algum questionamento em você?

O meu conflito era mostrar que eu escrevo música, mas não queria sabotar a minha própria banda. Como o Pato Fu está em vias de fazer um disco novo, não poderia pegar todas as minhas ideias e jogar tudo em um disco.

Assista ao making of com os bastidores da sessão de fotos:

No evento em que foi anunciado que o disco seria patrocinado pelo programa Natura Musical, em novembro, você falou que ouviríamos “músicas que ninguém poderia esperar”. De quais canções você estava falando?

Reginaldo Rossi, né? [ “Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme” ] é uma música sobre encontrar a mulher perfeita e eu consegui fazer isso com a Zélia [Duncan], com quem tenho muita amizade. Acho bacana poder escolher uma música que as pessoas nunca imaginariam que eu fosse cantar ou uma música de que eu gostasse. Como se fosse pior gostar de uma música do Reginaldo Rossi do que uma do Roberto Carlos. Ambos têm músicas maravilhosas e outras de que eu não gosto. Mas não queria que as pessoas recebessem essa música como uma brincadeira.

Vi no seu Facebook que alguns fãs questionaram a parceria com o padre Fábio de Melo, em “Amar como Jesus Amou”.

Tem gente que recebe ela mal, não posso evitar. Primeiro de tudo, acho que muita gente falou sem ouvir a música. Se você ler que a Fernanda gravou uma música católica com o padre Fábio, chamou Samuel [Rosa, do Skank] para uma parceria ou fez versão para Reginaldo Rossi, vai parecer oportunismo. Mas tem a ver com a minha vida. Eu estudei em escola de padre a vida toda! Tocava violão na sala de aula, com a mesma freira que ensinava religião. Essa música é uma das primeiras coisas que eu toquei. E é um alinhamento com uma mensagem de bem. Sou mais próxima de ser budista do que católica.

A Nina estuda em escola católica?

Ela estuda, sim. Não porque eu quis colocá-la em uma escola assim, mas é porque é a melhor escolar perto de casa. Ela não é batizada, por exemplo. E, outro dia, ela perguntou por que não era. E eu disse que não queria que fosse algo no piloto automático.


Ela tem 10 anos. Já está se comportando como uma pré-adolescente?

A Nina faz 11 em outubro, mas fala que ainda é uma menina e não uma pré-adolescente. Ela realmente não parece. Vejo meninas na idade da Nina e ela não pinta a unha, não usa salto, não usa roupa de adulto. Mas eu também não pinto a unha! [Ela ri enquanto olha para a própria mão] Acho que talvez seja isso.

Como é viajar em turnê e ficar longe dela?

Uma vez, a Nina quebrou o braço e foi traumático para mim. Eu estava em meio a uma turnê pela Austrália e Nova Zelândia. Ela tinha uns 7 anos. Sofreu fratura exposta uma semana antes de viajar. Eu não deveria ter ido. Fiquei mal, muito mal. Quando voltei, pensava que deveria ser uma mãe melhor. Até pensei que quando os pais são médicos, ou pilotos de avião, isso também pode acontecer. Quando foi comigo, eu fiquei: “Meu Deus, como a gente lida com isso?” Tá vendo? Temos algo legal, como a viagem para a Austrália e Nova Zelândia, e uma coisa como essa.

Em entrevista à RS Brasil, em julho de 2010 [edição 46], você e John diziam querer ter mais um filho. Como estão esses planos?

Na verdade, a gente tentou, mas não aconteceu. Fiquei meio assim, sabe, tenho 42 anos, comecei a fazer mais show, cantar com mais pessoas. Era claro para mim que teria que me dedicar mais ao bebê. Como não aconteceu naturalmente, não quis entrar nesse furacão que é tentar ter filho. Conversei com o John, com a minha médica. Já tive essa experiência da maternidade, que foi muito positiva e repetiria se acontecesse. Achei que fosse simples [em 2010], mas estava com 39 anos, tinha toda essa biologia envolvida.

Li textos seus que foram publicados no jornal O Estado de Minas. Eles têm o mesmo sabor agridoce que um disco do Pato Fu. Um deles, de 2008,“Ele Não Veio”, chamou a minha atenção por esse toque azedo.

É uma dessas coisas que acontecem na carreira. Escrevi depois do Prêmio Tim da Música, no qual eu não ganhei nada. Já tinha ganhado um monte de coisa, da APCA, Prêmio Bravo, MTV. Pensei que ia ganhar algo, fui arrumadíssima. E não ganhei. Falei para o John: “Estou me sentindo a noiva abandonada do altar”. Escrevi sobre isso. O John leu e falou: “Nossa, que texto amargurado”. Era como se todo mundo conspirasse contra você. A vida não te dá tudo, ela dá um tapa na cara de vez em quando.

Como vê o legado do Pato Fu após estas duas décadas de banda?

Tem esse tipo de coisa de: “Ah, eu ouvi o seu disco e fiquei com vontade de fazer outra coisa”. Eu acho isso legal. O Pato Fu fez isso, não em grande escala, em massa, mas atingiu as pessoas de forma seminal e disparou um gatilho, sabe? Eu acho isso ótimo.

Vocês têm uma fama que dá oportunidade de fazer algo corriqueiro como hoje, de caminhar pelo centro de São Paulo sem ser incomodada – ainda que aparentemente algumas pessoas tenham reconhecido você.

Eu estou disfarçada! [Passa a mão pelos cabelos] Mas é o nível de Belo Horizonte, sabia? Todas as bandas dos anos 1990 ficaram morando lá. Às vezes encontro o Samuel ou o Rogério [Flausino, vocalista do Jota Quest] no shopping. Então, não tem aquela comoção. A não ser que eu vá ao cinema, às 16h, e alguém venha tirar uma foto. Daí vira uma comoção. Mas, normalmente, vamos levando. Não tem correria, não tem nada. No máximo, o pessoal em BH chega pertinho e diz: “Gosto muito das músicas suas!”