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Entrevista RS: Mauricio de Sousa

Aos 81 anos, o maior quadrinista do Brasil cria compulsivamente e continua a expandir os negócios com toques visionários

Paulo Cavalcanti Publicado em 02/08/2017, às 16h05 - Atualizado às 16h36

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<b>Mauricio de Sousa</b> - Arquivo Pessoal
<b>Mauricio de Sousa</b> - Arquivo Pessoal

Mauricio de Sousa é uma daquelas pessoas que parecem ter idade indefinida. Quando o cartunista e empresário era mais jovem, aparentava ser mais velho. Hoje com 81 anos, parece ter algumas décadas a menos de vida, não só no que se refere ao visual mas também em termos de vitalidade e agilidade mental.

Levaria muito tempo e espaço para listar todas as realizações e glórias do criador da Turma da Mônica. Ao lado de Pelé, Tom Jobim, Ayrton Senna e poucos outros, ele é um brasileiro notável cuja excelência em sua área de atuação é incontestável e amplamente reconhecida dentro e fora do país.

O artista nascido em 27 de outubro de 1935, em Santa Isabel, interior de São Paulo, acaba de lançar a autobiografia Mauricio – A História Que Não Está no Gibi (Sextante/Primeira Pessoa). O livro mostra como o jovem que saiu de uma cidade pequena para a capital para trabalhar como repórter policial acabou virando cartunista.

Atualmente, Mauricio é uma mistura de Monteiro Lobato, Walt Disney e George Lucas. Na obra, é possível notar como ele acertou o passo para emplacar os personagens no que ainda era um inexplorado mercado editorial de HQs no Brasil. Porém a saga dele não é apenas de expansão (inclua aí a venda de produtos e a criação de merchandising): é também uma história de reinvenção e de eterna curiosidade. Figuras como Mônica, Cebolinha, Cascão e Chico Bento têm vida própria há muito tempo, claro, mas quando Mauricio lançou a Turma da Mônica Jovem, em 2008, poucos esperavam que ele conseguiria criar um novo universo tão bem-sucedido quanto o original. Sempre ligado nas novas ferramentas, ele não se furta de usá-las para passar sua mensagem – a Turma da Mônica tem até seu próprio canal no YouTube.

Esta entrevista foi conduzida na atual sede da Mauricio de Sousa Produções, localizada em um moderno centro empresarial no bairro paulistano Lapa de Baixo. O local é fantástico, uma verdadeira ode aos quase 60 anos de carreira dele, e ainda está sendo ampliado. Maurício conversa de forma coloquial, e por meio de suas ideias e objetivos de vida se mostra um eterno humanista.

Por que escolheu lançar agora a autobiografia?

Eu já passei dos 80 anos e é bom fazer isso enquanto tenho memória e condições de falar tudo o que aconteceu na minha vida. Tive que buscar os fatos, e haja memória! Passei quase um ano conversando com o jornalista Luís Colombini. Ele escreveu o texto em cima dos meus depoimentos. Na edição, era assim: “Essa palavra eu não uso, essa expressão não tem no meu vocabulário”. Então, fomos ajeitando a conversa. A narrativa não é organizada necessariamente por ordem cronológica. É uma forma livre de contar minha vida, sem apelar para uma formatação sofisticada. Eu queria mesmo era conversar com o leitor. Sei de gente que chorou lendo. O que é relatado faz parte dos sentimentos e da realidade das pessoas – em algum tempo de sua vida, você estava lá, brincando e soltando a imaginação com a Turma da Mônica.

A leitura sugere que no que se refere a Mauricio de Sousa nada é definitivo.

Sou um eterno insatisfeito com as coisas, com o modo como elas acontecem, com o jeito e com a hora em que elas acontecem. Nenhum artista acha que o desenho que acabou de fazer está bom ou totalmente pronto. Ele sempre o ajeita, rasga ou joga fora. Sempre acho que dá para fazer melhor. Se você tem certa teimosia, segue criando, mesmo com os obstáculos.

Você sempre fez questão de manter a independência. Como é sua metodologia de trabalho?

Eu mando em tudo no direcionamento que temos aqui na Mauricio de Sousa Produções. É uma briga diária com todo mundo. Só que quando chega no dia seguinte, é sempre outra história. Tudo pode ser recriado e reinventado. Não custa nada lamber a cria e melhorá-la. Eu opino sobre o traço, sobre vários tentáculos de uma história ou sobre o desenvolvimento de uma situação. Converso sobre as várias maneiras de explorar um personagem e também sobre como levar em frente todas as atividades que temos. Mas, se eu digo que sou insatisfeito, esclareço que sou um insatisfeito feliz, já que sempre posso achar outras coisas legais para fazer.

Década após década, novas gerações descobrem seus personagens. Como você enxerga esse legado?

Para mim, o tempo não conta mesmo: no universo da Turma da Mônica não existe o limite temporal. Não tem antes nem depois, é um bloco de situações que se juntou com os anos e ainda permanece. Esse é o legado que criamos. Ele vai se somando a outras coisas que vão acontecendo e assim vamos usando tudo. Ao mesmo tempo, ter esses personagens tão icônicos é uma responsabilidade. Para que isso siga como sempre foi e continue funcionando, eu prezo o propósito de vida que temos. Usamos ética e um tipo de comportamento. Em nossos produtos, aplicamos arte e criatividade. Também aproveitamos as ferramentas e as tecnologias que surgem para poder passar mensagens modernas e adequadas ao tempo em que vivemos.

Como manter a essência desses personagens depois de tantos anos?

Veja, os personagens ainda andam pela calçada, pelo campinho. Isso não muda. É porque a criançada também não muda. Procuramos criar um ambiente que é todo inerente à infância. A fórmula que usamos é a que todo mundo gosta. A garotada entende e recebe o que fazemos como algo particular. Já vi isso acontecendo na China, na África, no Japão. Minha mensagem funciona e vai continuar funcionando. As emoções básicas são as mesmas dentro das pessoas. Todo mundo fica bravo igual à Mônica, tem fome igual à Magali, gosta de andar em uma turminha unida como a dos meus personagens. Eu não estou inventando nada. Shakespeare já fazia isso há muito tempo. Temos histórias universais. Na verdade, é muito fácil. Mas, sim, também dá trabalho.

Não existe tópico mais presente na sociedade atualmente do que o feminismo. A Mônica já estava aí há décadas como um símbolo da garota poderosa. Recentemente, o seu estúdio desenvolveu o projeto Somos Todas Donas da Rua para ajudar a despertar a consciência do feminismo nos pequenos leitores. Como a Mônica se insere neste contexto?

Eu fico satisfeito com o resultado disso tudo. Principalmente porque a minha filha, Mônica Sousa, é daquele jeito mesmo. Eu consegui transpor fielmente as características dela para a personagem. Então, fico orgulhoso de tê-la comigo, já que a Mônica, a personagem, é um modelo visto por mulheres do mundo todo. Eu venho de uma família de matriarcas. Todos obedeciam ao que minha avó dizia. Depois, foi assim com a minha mãe e também com a minha madrinha. Desde menino eu convivo com mulheres fortes. Antigamente, a mulher tradicionalmente não comandava, havia um preconceito, uma separação. Hoje é diferente. É cada vez mais desejável ter mulheres no comando. No caso da fraqueza do homem, é bom que a mulher mande, mesmo!

O Cebolinha foi outro personagem que ganhou nova vida. Foi adotado pela internet, protagonizando memes como o infame “Chola mais”. Qual é o apelo do Cebolinha?

Quem não quer ter um “plano infalível” para se dar bem na vida? O homem é metido a conquistador, quer ser guerreiro. O Cebolinha é o típico “machinho”. Ele acha que sabe tudo, que pode tudo e que vai conseguir tudo. E, é claro, na vida real não é nada assim. O problema é que ele não entende isso. A Mônica tenta colocar ordem na cabeça dele, geralmente com as coelhadas [risos], mas talvez isso nunca tenha dado certo.

Você fala que o “Mauricio comportamental” do começo foi sobrepujado pelo “Mauricio infantil”, mas seu lado reflexivo e filosófico sobrevive nas historinhas do dinossauro Horácio. Ele é seu alter ego?

Sim, até hoje Horácio fala por mim. Nas historinhas, tudo o que ele diz, todo o comportamento dele... bem, eu me vejo nele. Na minha vida, eu faria tudo aquilo que aparece nas tirinhas dele. Por isso até hoje ninguém mais dentro do estúdio desenhou qualquer traço do Horácio. Eu faço toda a arte e os diálogos. Sou escravo do Horácio. Ele é popular no Japão, e vai voltar. Sugeriram algumas alterações, mas eu não gostei.

No livro, você fala de seu falecido irmão Marcio, que teve uma importância na dinâmica da Turma.

O Marcio fazia as músicas da turminha que eram usadas na televisão, em comerciais e nos discos. Ele também criou alguns personagens importantes. O Louco é invenção dele, mas ele não explicou muita coisa para mim. O Louco existe mesmo? Já repararam que somente o Cebolinha vê o Louco? E o Bugu também foi cria dele. O Bugu sempre fala: “Alô, mamãe!” Era coisa do Marcio: “Olhem, eu estou aqui!”

Você também comenta o momento político de 1964, quando os militares tomaram o poder justamente quando você começava a firmar o seu nome. Cita pessoas de esquerda que eram perseguidas pelo novo governo, mas também fala da intransigência dos sindicalistas, que “obrigavam” você e outros a trabalhar para eles.

Como criador de histórias infantis, eu não devo ter opinião sobre política. Mas como cidadão eu fico meio preocupado com o que está ocorrendo. Essa divisão entre esquerda e direita, bem, sinceramente eu acho que isso não deveria existir. No país, alguns estão bem e outros se encontram em pior situação, infelizmente. Isso vai existir sempre. Faz parte da condição humana. Mas eu, como autor, tenho que pregar paz, concórdia, intercâmbio de ideias e, de alguma maneira, passar algum tipo de felicidade. Nas minhas histórias, a molecada briga durante o dia, vai para casa dormir e, no outro dia, faz as pazes. Brincam e brigam de novo como se nada tivesse acontecido. Esse é o ciclo da vida. Nada é definitivo no momento de destruição. O que deve permanecer dentro das pessoas é a construção.

Você já transformou Pelé e Ronaldinho Gaúcho em personagens. Como o futebol se insere na sua criação artística?

Eu gosto de futebol como qualquer brasileiro. Não sou fanático – meu time de coração é a seleção nacional. No caso desses grandes atletas que se aproximaram de mim, eu vi que através deles poderia levar algum tipo de mensagem, seja comportamental, seja ética. E também falar de disciplina e da necessidade de preparo físico. Assim, fui me encontrando com alguns jogadores – primeiro com o Pelé, depois com o Ronaldinho Fenômeno, depois com o Ronaldinho Gaúcho. Eu converso com eles e vamos afinando o modo como eles podem se enquadrar em uma historinha minha. Mas quando você está trabalhando com alguém que existe de verdade é necessário que vários cuidados sejam tomados. A pessoa tem que ter o comportamento adequado. Tentei trabalhar com o Diego Maradona. O meu estúdio iria fazer o Dieguito calcado nele. Quando eu comecei a falar com ele para dar vida ao personagem, ele merecia. Depois, não. Na minha visão, já não era mais um bom exemplo para as crianças.

Você fala que o politicamente correto pode descambar para a patrulha, citando que houve reclamações sobre as histórias do Chico Bento por apresentar a caricatura de uma roça do passado e até da Mônica, por supostamente incitar a violência.

O politicamente correto, quando é feito de uma forma radical, desmonta toda a criatividade. Ele sugere que você não deveria pensar e fazer certas coisas. Você tem que pensar em todas as alternativas para criar, sua mente precisa estar livre. Se vou fazer uma história, tenho que ver se ela vai para cima, para baixo, se vai ser algo com um tom mordaz, crítico ou satírico. E se houver limitação das ações [dos personagens] isso se torna impossível.

Dentre os mais de 300 personagens que você criou, existe uma figura considerada “maldita” e que foi tirada de circulação há uns 45 anos: o Nicodemo. Nas historinhas dele, havia piadas com deficientes físicos, idosos, mendigos... O que você lembra sobre ele?

Ah, quanto ao Nicodemo... bem, era uma tira de humor negro. Na época, meus estúdios ficavam dentro do prédio da Folha de S.Paulo. No grupo Folha havia o jornal Notícias Populares, que trabalhava com todo aquele lance de jornalismo sensacionalista, crimes, uma atmosfera carregada. Pensei: por que eu não posso me soltar um pouco e fazer algo assim? E fiz as histórias do Nicodemo. Não acho que ele era do mal, ele até tentava ajudar. Era assim: ele via um cara se afogando, jogava uma boia e ia embora. E o cara se afogava mesmo assim. Era bem intencionado, mas o resultado das ações dele era sempre desastroso. Ele conseguiu ser “despedido” de dois jornais. Primeiro, do extinto Jornal da Tarde. Um dia, me chamaram: “Mauricio, não dá para seguir, é muito pesado, muda o personagem”. Argumentei que não dava para mudar, que ele era assim mesmo. Eu o joguei na Folha da Tarde e o diretor me chamou: “Não dá, etc” Foi a mesma coisa. No final, deixamos o Nicodemo para lá. Vimos que ele não era mesmo a nossa onda.

A Turma da Mônica Jovem se tornou um grande fenômeno editorial. Como ela nasceu?

Não aconteceu tão de repente, mas estava na cara que ela iria surgir em algum momento. No começo, eu até fui um pouco contra, achava que daria muito trabalho. A Alice [esposa de Mauricio e parceira dele na administração dos negócios] fazia mais força do que eu para que acontecesse. Eu tinha outros planos para o estúdio, achava que não dava para fazer tantas coisas ao mesmo tempo. Até que um dia cheguei em casa e encontrei com o Marcelinho, o meu caçula. Eu estava com as novas edições da revista da Mônica clássica e com exemplares do Naruto, que ele acompanhava. Ele estava muito ligado em mangá, em todas as coisas japonesas. Foi engraçado: Marcelinho fez menção de pegar o Naruto primeiro, mas pegou as minhas revistas. Foi aí que eu decidi. Vi que havia um espaço, um vácuo óbvio. Ninguém estava fazendo isso, pegando personagens fortes e estabelecidos como os meus e depois os reformatando. Comecei a preparar o terreno. Ajudou muito o fato de nosso estúdio ter muitos nisseis. A escrita oriental já é um preparo para o traço de um desenho. É um pessoal muito disciplinado e criativo para dar vida àquelas filigranas e detalhes de fundo. Nós poderíamos fazer um mangá 100% com estilo e acabamento japonês, mas eu optei por fazer um mangá caboclo, elegante, sem rebuscamento e sem nada a ver com a turminha clássica. É uma mescla de estilos e por isso está funcionando tão bem. Neste ano, finalmente vamos lançar a Turma no Japão, onde os personagens clássicos já têm uma boa aceitação.

E como está isso de lançar seus trabalhos internacionalmente?

Ainda estamos em alguns mercados, mas não conseguimos desenvolver todo o nosso potencial por falta de cuidado e de investimento. Na verdade, conquistar o mundo custa muito caro. Mas eu também nunca pensei em conquistar o mundo. Quero publicar as minhas historinhas onde der. As consequências ficam para depois. Reforço que nosso objetivo principal é criar, inventar coisas e espalhar a nossa mensagem. Falando assim, estou até parecendo pastor! [Risos]

Paralelamente às revistas, você também fez criações para a área do cinema e do desenho animado. Como foram essas experiências para você?

Eu fiz muitos projetos de desenho animado em meados da minha carreira. Alguns deles fizeram bastante sucesso, como Feliz Natal pra Todos (1976) e As Aventuras da Turma da Mônica (1982) – este último tinha uma homenagem a Star Wars, todo mundo gostou. Mas com o tempo eu desanimei, porque a distribuição fica a cargo de grupos estrangeiros e eles não dão muita moleza para o mercado nacional. Nós pretendemos produzir alguns médias-metragens para o YouTube, mas eu não desisti do cinema. Já estamos elaborando alguns filmes em live action, tanto da turma clássica quanto da turma jovem. São produtos que o público pede muito. E ainda estamos planejando um documentário sobre a minha vida. Fizemos um quando eu completei 50 anos de carreira [Biography: Mauricio de Sousa, produzido pelo canal de televisão The Biography Channel], só que o novo será mais amplo e definitivo.

Você chegou a ter planos para fazer com que os Beatles se transformassem em personagens de suas revistas, mas não deu certo. O que aconteceu?

Todo mundo que tem mais ou menos a minha idade e fez parte da minha geração foi fã dos Beatles e acompanhou tudo o que eles fizeram. Claro, passou o tempo e os Beatles começaram a ser esquecidos pela criançada. Há algumas décadas, pensei que poderia resgatar os Beatles em HQ. Fizemos um estudo e viemos com o Beatles 4 Kids. Criamos umas figuras bem bonitinhas. Mas todo o nosso projeto tinha que chegar até Londres para o aval deles. Meus advogados disseram que três dos Beatles aprovaram. Certa pessoa que toma conta dos interesses de um deles não autorizou. Prefiro dizer que até hoje não sei quem foi...

Seus personagens são licenciados para cerca de 150 empresas e aparecem em mais de 300 produtos, de macarrão instantâneo a fraldas. Seu lado de empresário se sobrepõe ao de cartunista?

Tenho que inventar um jeito de ganhar dinheiro para seguir criando e fazendo as coisas. Não me acho um administrador, empresário, nada disso. Eu me acho mesmo um artista metido a besta. Quero manter tudo o que conquistei e, é claro, seguir crescendo. Tenho agora este novo estúdio. Nós mudamos para cá no começo deste ano. Já me candidatei a alugar o prédio ao lado. É preciso ter um bom faturamento para investir e pagar o salário do pessoal, mas o dinheiro nunca está em primeiro lugar. Você pode, sim, crescer e fazer algo que se pague. Fico satisfeito de poder multiplicar as minhas atividades.

E sobre o futuro dos seus empreendimentos? Alguma pista?

Eu sempre posso expandir. Muitas vezes, crio mais do que posso desenvolver. Vou dar um spoiler: estou em uma nova frente, estudando parceria com uma empresa internacional para incrementar ideias que eu não tenho condições de executar sozinho. Posso inventar mil coisas, mas para isso preciso ter tempo e condições financeiras. Eu nunca tive sócios, já que outras pessoas poderiam não gostar de algo e pedir para eu mudar. Mas agora vou abrir uma segunda linha de atividade, aí poderei fazer coisas que não são possíveis para mim. Estou preparando o terreno para quando eu não estiver mais aqui. Já falo com os meus filhos sobre a sucessão, para que tudo siga como sempre foi.

A Dona da Rua

Mônica surgiu como coadjuvante, mas virou a número 1

O primeiro personagem de sucesso criado por Mauricio de Sousa foi o cachorrinho Bidu, e o desenhista ainda tem um grande carinho por ele. Depois, vieram Cebolinha e Cascão. Mas a Mônica, que surgiu como coadjuvante, foi um divisor de águas e hoje é a rainha da turma. Décadas atrás, o cartunista mostrou as tirinhas a um amigo que trabalhava no jornal Folha de S.Paulo, que comentou: “Puxa, mas só tem homem aí!” Foi dessa fala que veio o clique. Em casa, ele viu a filhinha Mônica, na época com 2 anos e meio, enfezada, brigando com as irmãs e arrastando um coelho amarelo pela casa. Em março de 1963, Mônica estreava nas HQs, já dando uma coelhada no Cebolinha. Em 1965, Mauricio e Mônica, a menina de carne e osso, então com 5 anos, foram convidados a participar do programa de Hebe Camargo. “Foi aí que notei que era famoso”, conta o artista.

A Maior Influência

Will Eisner, criador de The Spirit, fez a cabeça de Mauricio

Em A História Que Não Está no Gibi, Mauricio de Sousa conta que foi influenciado por diversos artistas, mas poucos o tocaram tanto como Will Eisner, criador do herói The Spirit. “Ele era o desenhista que eu queria ser quando crescesse. Foi o artista que mais me influenciou na abertura das histórias, abordagem de temas, ângulos das cenas, desenvolvimento de personagens, enredos e narrativas”, afirma o brasileiro. The Spirit se tornou a tira favorita dele. Mas não eram histórias para criança. “Elas tinham violência, crime, lutas, tiros e um realismo acima da média.” Mauricio costumava cortar as tiras de The Spirit e acabou montando uma edição própria, com encadernação e capa caprichadas. Nos anos 1970, ele conheceu o ídolo em Nova York. Anos depois, em visita à Mauricio de Sousa Produções, Eisner desenhou de seu jeito característico os personagens da Turma da Mônica.