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Tranquilo e Infalível

Sereno, Demian Maia também usa a cabeça para encarar adversários nas arenas do UFC

Filipe Albuquerque Publicado em 12/11/2012, às 15h56 - Atualizado às 16h08

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RACIONAL
Maia se considera equilibrado nas lutas - CHRIS PARK/ DIVULGAÇÃO
RACIONAL Maia se considera equilibrado nas lutas - CHRIS PARK/ DIVULGAÇÃO

Algo em torno de três minutos: foi o que precisou o meio-médio Demian Maia para derrotar Rick Story em uma das lutas do card principal do UFC Rio, no mês passado. Sem estardalhaços e onde se sente mais à vontade – no jiu-jítsu –, com um mata-leão seguido de estrangulamento, ele fez o norte-americano pedir água ainda no primeiro round. É como um jogo de xadrez, no qual vence quem pensa duas, três jogadas à frente. E a lição Maia traz do jiu-jítsu, com mais estratégia e objetivos bem definidos. Foram eles que pavimentaram a vitória recente do brasileiro, a segunda na nova categoria (Maia veio dos médios), contra Story. “Quando faltavam alguns meses para a luta, comecei a traçar alguns objetivos para cada dia, algo bem específico”, diz. “E o que eu botei como objetivos para a luta foi exatamente o que consegui cumprir.”

Demian Maia é calmo. E racional, como gosta de se definir quando fala de suas características como lutador. Parte de sua postura quase zen vem da arte de imobilizar adversários. “O jiu-jítsu é bom por isso, porque o cara que é muito vaidoso ou se arruma ou para de treinar. Você tem de passar por cima da vaidade, porque você vai desistir várias vezes. E vira um jogo, porque aí você não quer [desistir], mas tem horas em que é igual a um xeque-mate.” Mas nessa fleuma também tem uma boa dose de personalidade. Formado em jornalismo e no universo das lutas desde a infância, aprendeu com as artes marciais que concentração, respiração e objetivos bem definidos valem no tatame, no octógono e na vida. “Aprendi desde criança, em luta, que o controle da respiração te ajuda a se acalmar em qualquer coisa. Ou esvaziar a mente. Às vezes não tem nada a ver com luta, mas você precisa saber que se voltar à respiração de uma determinada maneira, consegue manter a calma, conseguir a solução mais rápida.” A voz não se altera. A expressão é serena, embora marcas no rosto mostrem que a vida de Maia não é para qualquer um. Porque não é qualquer um que bota queixo, braços e pernas à disposição de alguém que saberá bem o que fazer com eles.

Mas o aspecto agressivo do esporte – o deputado José Mentor (PT-SP) quer proibir as transmissões do MMA pela TV por considerar a luta uma “rinha humana” –, é o que ajudou o lutador (marido e pai, aos 34, e à espera do segundo filho) a entender a si mesmo. “Pela parte da concentração, você fica focado. É tanta tensão que até espiritualmente você acaba se conectando mais. No meu caso, que acredito em Deus, você acaba tendo uma conexão maior com tudo”, explica. “O esporte me ajudou a entender melhor o que se passa comigo. Se você consegue ficar em silêncio, se conectar, esvaziar a mente e aproveitar o momento, isso é importante para o ser humano. E esse tipo de coisa eu consegui por causa de treino. E acho que você consegue transferir essas coisas para a vida.”

Vida para a qual Maia pretende deixar um legado, que ele julga ser mais importante do que títulos. Não que ele não lute – literalmente – por eles. Mas duas histórias recentes, de fãs que tomaram porradas da vida – um deles, antes de entrar em coma, aguardava ansiosamente a possibilidade de ter um autógrafo do lutador, e conseguiu; outro prometera deixar as drogas após a vitória do ídolo contra Dong Hyun Kim, em 2011 – o fizeram ponderar prioridades. “Tenho o meu lado atleta, quero ser campeão. Mas ser exemplo, no fim das contas, é o que sobra, é o legado que você deixou”, diz. “E fazer isso na vida de uma pessoa é o mais importante, porque todo mundo vai morrer um dia e não vai sobrar nada, título, dinheiro. Mas isso fica.”

Não à toa, uma das leituras preferidas do lutador seja a saga Musashi, três tijolos de 500 páginas do japonês Eiji Yoshikawa que narram a história de um samurai entre os séculos 14 e 15. Outros prediletos são os romances do norte-americano Jack London, entre eles O Lobo do Mar (1904). “Esse é muito legal, porque você vê coisas da psique humana”, diz.