Rolling Stone Brasil
Busca
Facebook Rolling Stone BrasilTwitter Rolling Stone BrasilInstagram Rolling Stone BrasilSpotify Rolling Stone BrasilYoutube Rolling Stone BrasilTiktok Rolling Stone Brasil

Paternidade, pandemia e anos 80: The War on Drugs estreia no Brasil e reflete sobre o 'controle' criativo

Adam Granduciel, líder da banda, destrinchou o processo do disco I Don’t Live Here Anymore antes de shows no C6 Fest

The War on Drugs (Foto: Rich Fury/Getty Images)
The War on Drugs (Foto: Rich Fury/Getty Images)

Adam Granduciel, líder da banda The War on Drugs, precisou abdicar do controle para finalizar o disco I Don’t Live Here Anymore (2021). É com ele que a banda chega ao Brasil pela primeira vez para apresentações em São Paulo e no Rio de Janeiro pelo C6 Fest. Em entrevista à Rolling Stone Brasil, o músico refletiu sobre a produção do álbum e as sonoridades oitentistas, que se misturaram ao tradicional folk do grupo norte-americano.

A faixa “I Don’t Wanna Wait” foi usada de exemplo por Granduciel, que emulou a drum machine utilizada por Phil Collins em músicas como “In the Air Tonight”: “Eu tinha um aplicativo com uma drum machine no meu celular. Ele estava configurado na [Roland] CR-78, que Phil Collins usou. Eu meio que não escolhi, só aconteceu. E, então, imediatamente cheguei a esse lugar, essa vibe.”

Fiz um disco inspirado em músicas que eu gosto. Se você está sempre gravando e procurando por algo especial, você vai acabar com esses detalhes que lembram os anos 1980, ou guitarras dos anos 1990.

A maior parte do projeto estava pronta quando a pandemia de covid-19 obrigou os músicos a ficarem em casa. O período de isolamento, no entanto, deu ao War on Drugs “um ano extra” para amadurecer o disco por meio de processos inéditos para Granduciel. Acostumado com o controle quase excessivo de cada detalhe das faixas, o vocalista proporcionou mais liberdade para que os outros músicos seguissem suas jornadas individuais durante a criação de novas ideias e gravações de alguns trechos de I Don’t Live Here Anymore:

“Foi divertido e diferente, cada um podia trabalhar em seu estúdio, no próprio ritmo. Ir até o estúdio, ouvir a música, aprender, colocar as crianças pra dormir, assistir um filme, dormir, tomar café e voltar para o estúdio. Uma semana depois eles me enviavam os takes, que foram melhores do que qualquer coisa que eles fariam se tivessem vindo até Los Angeles. Gravar com o equipamento mais caro não é o importante. O que importa é a relação com a música e a habilidade de pensar sobre o que eles querem fazer. Eu aprendi a lidar com o controle sendo tirado de mim.”

+++ LEIA MAIS: Kevin Parker sobre ascensão do Tame Impala: 'Eu não odeio, não amo. Aceito' [ENTREVISTA]

A paternidade também ocupou um papel importante na nova forma de trabalhar. O músico teve seu primeiro filho em 2019 e admitiu que precisou lidar com o cansaço e outros desafios: "Não trabalho mais 12 horas por dia em um estúdio durante a semana. Mas quando uma música surge, apenas me sinto grato por isso e começo a trabalhar nela, tento fazer o melhor que posso, não importa o quanto leve para fazer um disco."

Por fim, Granduciel comentou sobre a própria evolução como artista desde o lançamento de 
Lost In The Dream, responsável por alçar banda a um novo patamar de popularidade. A pressão aumentou, mas o artista considera que o disco o ensinou o principal caminho para melhorar como compositor: “O que eu aprendi foi: ‘Seja lá qual foi a razão para você ter feito aquele disco, faça outro pela mesma razão. Faça a música que você gosta. Algumas pessoas irão gostar e outras não.’ [Lost In The Dream] me deu um senso de pertencimento ao meu próprio trabalho e me lembra de fazer música pelo motivo certo.”


Confira a entrevista completa com Adam Granduciel, da banda The War on Drugs:

Há linhas de guitarra e bateria em I Don’t Live Here Anymore que fazem sentido com o som de vocês, mas parecem influenciadas por outros gêneros dos anos 1980 além dos tradicionais folk e rock. Você poderia falar mais sobre o processo do disco? Qual era o som que vocês estavam buscando?
Adam Granduciel: Na faixa quatro, por exemplo, eu tinha um aplicativo com uma drum machine no meu celular. Eu sentava no piano, achava um tempo que gostasse no aplicativo e colocava a drum machine. Ele estava configurado na [Roland] CR-78, que Phil Collins usou. Eu meio que não escolhi, só aconteceu. E, então, imediatamente cheguei a esse lugar, essa vibe. Depois tem a gravação, os arranjos. Anthony [LaMarca], que estava na bateria, fez uma virada incrível, que é tão simples. Não é uma virada chique, é apenas simples e única, impactante. Todas essas coisas nos levaram a um momento musical. O mais importante é fazer música que você goste. Fiz um disco inspirado em músicas que eu gosto. Se você está sempre gravando e procurando por algo especial, você vai acabar com esses detalhes que lembram os anos 1980, ou guitarras dos anos 1990.

A pandemia influenciou a gravação do disco, principalmente considerando a sonoridade orgânica da banda - difícil de recriar à distância?
Muito do disco foi escrito e gravado antes da pandemia. Bateria, baixo, guitarra. Comecei a escrever em 2018 e trabalhamos muito como uma banda, de 2019 até o começo do lockdown. Mas a pandemia nos deu um ano extra. As músicas estavam quase feitas, não precisamos começar do zero. A única faixa que fiz remotamente foi “Harmonia's Dream,” mas já estávamos trabalhando nela há um ou dois anos. Tínhamos a gravação da bateria, mas precisei recomeçar. Contratei meu amigo que estava na Filadélfia para gravar. Você sabe, só ele e o engenheiro de som, todos usando duas máscaras. Foi legal. Normalmente eu teria trazido ele para Los Angeles e estaria tentando cuidar de cada detalhe. Como eu não estava lá, eu apenas enviei a ideia e pedi os takes que queria. Eu sabia como eram as viradas dele… Então, ele me enviou o trabalho cru e eu disse: ‘É perfeito.’ 
Isso aconteceu algumas vezes durante o lockdown. Foi divertido e diferente, cada um podia trabalhar em seu estúdio, no próprio ritmo. Ir até o estúdio, ouvir a música, aprender, colocar as crianças pra dormir, assistir um filme, dormir, tomar café e voltar para o estúdio. Uma semana depois eles me enviavam os takes, que foram melhores do que qualquer coisa que eles fariam se tivessem vindo até Los Angeles. Gravar com o equipamento mais caro não é o importante. O que importa é a relação com a música e a habilidade de pensar sobre o que eles querem fazer. Eu aprendi a lidar com o controle sendo tirado de mim.

Essa era justamente uma das questões. Você sentiu que esteve menos no controle do álbum?
Sim, mas eu gostei! Todos puderam processar as músicas. Foi diferente, mas eu aprendi muito. Isso fez o disco soar melhor.

Lost In The Dream, talvez o disco responsável pela mudança mais drástica de popularidade da banda, está completando nove anos. O que mudou na sua percepção artística nesse período? Uma popularidade maior colocou mais pressão em seu trabalho?
Isso colocou mais pressão em mim, mas eu não me senti como se estivesse na escola… Me deu mais liberdade para ser o tipo de compositor que eu queria. Seja lá o que fiz em Lost In The Dream, foi algo que ressoou com as pessoas, mesmo sem tentar. Foi meu terceiro disco e eu queria fazer algo melhor do que anterior, como compositor. Foi um daqueles discos em que eu queria fazer algo para mim mesmo, que eu amava, mas muitas pessoas se conectaram. Eu não fiquei mais confiante, mas sabia que se eu fizesse o disco que eu queria fazer… era sobre isso. A pressão que você menciona é como uma pessoa sentindo que precisa fazer a mesma coisa que o tornou popular, mas o que eu aprendi foi: ‘Seja lá qual foi a razão para você ter feito aquele disco, faça outro pela mesma razão. Faça a música que você gosta. Algumas pessoas irão gostar e outras não.’ Foi um presente para mim, com certeza. Mas isso me deu um senso de pertencimento ao meu próprio trabalho e me lembra de fazer música pelo motivo certo.
Às vezes, eu fico frustrado. Eu tenho uma criança e não consigo trabalhar da mesma forma que antes. Fico cansado pra caralh*, exausto [risos]. Não trabalho mais 12 horas por dia em um estúdio durante a semana. Mas quando uma música surge, apenas me sinto grato por isso e começo a trabalhar nela, tento fazer o melhor que posso, não importa o quanto leve para fazer um disco. Somos gratos pelo que os últimos anos nos trouxeram. Estou empolgado para o que os próximos 10 anos nos reservam.
Sobre o Lost In The Dream, tenho muito material gravado daquela época. Quero fazer alguma coisa com isso no aniversário de 10 anos.

O que você espera dos shows no Brasil?
Eu espero três milhões de pessoas enlouquecidas [risos]. Vamos tocar músicas de todo nosso catálogo, estamos muito empolgados. Desde 2006, as pessoas que tocaram na América do Sul me diziam: ‘Você precisa ir. Eles vão amar.’ Foram 15 anos tentando vir e fazer alguns shows. Estamos confiantes de que faremos o show e as pessoas saberão cantar as músicas, ficarão empolgadas ao nos verem tocar. Vamos nos divertir e espero que seja a primeira de muitas vezes.