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P&R - Walter Salles

Walter Salles relembra as dificuldades que enfrentou para filmar Na Estrada

Stella Rodrigues Publicado em 06/07/2012, às 11h36

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<b>BRASILEIRO</b> Salles não pretende focar no mercado norte-americano - FERNANDO YOUNG/DIVULGAÇÃO
<b>BRASILEIRO</b> Salles não pretende focar no mercado norte-americano - FERNANDO YOUNG/DIVULGAÇÃO

Walter Salles começou sua imensa relação com On the Road ainda adolescente. Nos últimos anos, esse contato se fortaleceu enquanto ele mergulhou como nunca na obra de Jack Kerouac para levá-la ao cinema. “O que segura o livro é a força dos personagens, a genialidade de uma narrativa que acredita mais na intuição do que na razão”, define o diretor de Central do Brasil (1998) ao falar sobre a dificuldade de filmar o “infilmável”.

Como e quando foi seu primeiro contato com o livro e com a cultura beat? Que tipo de ideias On the Road deixou em sua mente?

Foi aos 18 anos, mesma idade de muitos dos personagens do livro. Eu já tinha ficado marcado por outros relatos, como O Apanhador no Campo do Centeio, do [J.D.] Salinger, mas o Kerouac foi um choque, ele criou um antes e depois. Parecia um relato de pessoas próximas, que pulavam no vazio para experimentar todas as formas de liberdade. Acho que Allen Ginsberg explica isso bem quando diz que a geração dele queria escrever da forma como falava entre si, com esse grau de intimidade.

Há décadas tentam levar o livro para o cinema, embora sempre tenha havido resistência dos fãs mais radicais, que defendiam que nenhuma adaptação faria jus ao texto. Quais aspectos específicos da obra a tornam tão difícil de transformar em filme?

É o fato de não ter uma dramaturgia convencional, com aqueles atos distintos que você encontra na maioria dos livros ou filmes. Ao contrário, ele é construído por camadas, uma arquitetura mais sensorial do que racional, e é aí que a influência do jazz se faz sentir. Truman Capote chegou a dizer que não era literatura, era datilografia. O tempo acabou dando razão a Kerouac, não a Capote.

Kerouac mandou uma carta a Marlon Brando sugerindo que ele fizesse Dean, enquanto ele próprio faria Sal. Chegou até a prever algumas tomadas. Ocorreu a você pensar no que Kerouac diria do seu filme? A tecnologia mudou muito, Brando morreu faz tempo...

Cada pessoa que leu esse livro tem o seu Dean ou Sal em mente, e eles vão corresponder a atores que foram icônicos em décadas diferentes. É interessante ver como o pessoal do [site do museu] Beat Museum reagiu ao filme, eles escreveram uma crítica superpositiva, dizendo que os atores tinham feito justiça aos personagens. Para quem trabalhou tanto tempo nesse projeto, sentir que os caras que mais entendem do assunto gostam do filme é o melhor “joint” que a gente podia receber....

As histórias dos diretores e atores daqui que foram parar em Hollywood são muito diferentes. Tem exemplos da publicidade, documentário, etc. Por que Hollywood está abrindo as portas para o Brasil? É algo sazonal?

Não acho que essa seja uma situação diferente daquela que acontece hoje em outras áreas, como no esporte, por exemplo. Como não acho que seja algo desejável, a longo prazo, para um diretor brasileiro, a não ser que ele queira se radicar de vez nos Estados Unidos, como muitos diretores europeus foram obrigados a fazer durante a Segunda Guerra Mundial.Nunca fiz dois filmes seguidos longe da América Latina, e nem pretendo fazer. A força de um cineasta está próxima de suas raízes. Jean Renoir dizia isso o tempo inteiro. Ele foi um gênio filmando na Europa, mas nunca foi feliz nos Estados Unidos.

Depois de Xingu ter recebido uma bilheteria ruim, Fernando Meirelles declarou que desistiu de filmar Grande Sertão: Veredas por achar que não haveria interesse. Você teria uma reação parecida?

Em qualquer país europeu, a bilheteria de Xingu teria sido boa, porque lá o filme não se paga só no cinema. A televisão, que é uma concessão pública, participa do financiamento dos filmes. Xingu é um longa ótimo, que teve uma bilheteria mais do que respeitável para o tema sensível que aborda. O cinema não pode ser apenas avaliado quantitativamente. É o legado, aquilo que o filme nos ajuda a entender sobre o mundo, que faz seu real valor.

Depois de anos, esse projeto gigantesco está chegando ao fim. O que vem agora?

Uma vez perguntaram para Joseph L. Mankiewicz, que tinha acabado de filmar um projeto especialmente difícil, qual seria seu próximo projeto. Ele respondeu: “Filmar em uma cabine telefônica”. E eu adicionaria: na minha cidade, pertinho de casa.