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Exclusivo Site - Entrevista Scott Goodstein

O responsável pela campanha online de Barack Obama - confirmado ao lado de Dilma Rousseff em 2010 - falou à Rolling Stone Brasil

Por Gustavo Lanzetta Publicado em 27/10/2009, às 20h10

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Atualizada 27/10, às 17h37

Scott Goodstein, um dos principais responsáveis pela campanha presidencial via internet e celular de Barack Obama, esteve no Brasil no fim de agosto para conversar com a Pepper Comunicação, que cuidará da estratégia online da campanha de Dilma Rousseff à presidência. A empresa confirmou com exclusividade à Rolling Stone Brasil, nesta terça, 27 de outubro, o fechamento do contrato com o norte-americano - ele estará oficialmente a serviço da companhia a partir de novembro (há algumas semanas, foi confirmada a parceria com Ben Self, que também atuou na campanha do atual presidente norte-americano). Durante sua passagem pelo país, o marqueteiro falou à nossa reportagem sobre sua experiência com novas plataformas de campanha, entre elas, comunidades e redes sociais na web.

Como você chegou às mídias digitais na campanha presidencial de Barack Obama? Já tinha experiência no assunto?

Comecei a trabalhar com campanhas políticas em 1990, 1992, mas quando estava na faculdade também trabalhei com a indústria musical. Eu planejei eleições para o Congresso, uma campanha ao Senado nos EUA, ao legislativo e campanhas locais. E depois, quando voltei para a escola, fui barman e promoter musical. Trabalhei no 930 Club e no Black Cat, e também levando bandas para Washington, e depois para a Sony Music no departamento de marketing. O ano de 2002 foi ruim para a política, para os democratas, para a esquerda em geral. Atuei em uma empresa independente que combinava músicos, marketing e política. Ao lado de Fat Mike, do NOFX, ajudei a fazer o Punk Voter e o Rock Against Bush, que teve dois CDs acompanhados de DVDs com um texto explicativo chamado "Porque Você Deveria Votar". Também vinham com informações sobre as políticas de administração do então presidente George Bush, estatísticas sobre o que ele fez com os fundos de faculdades, o que fez ou não fez pela guerra - estatísticas básicas, simples, que você poderia dar para seus irmãos, irmãs e seus pais e encorajá-los a votar, mesmo que você não tivesse idade.

Então você obteve experiência no trabalho com internet e celulares na indústria da música?

Não usamos celulares quando fizemos o Rock Against Bush, mas usamos um pouco a internet. Tivemos um site chamado PunkVoter.com por volta de 2003, 2004. Ao mesmo tempo, a campanha de Howard Dean estava usando a internet para enviar e-mails, nós estávamos usando para passar mensagens. Também experimentamos telefonemas com gravações. Pedimos a um grupo de jovens eleitores que nos dessem seu número de telefone. Eles nos passavam esse número através do site e então podíamos enviar para eles mensagens dos músicos. Fat Mike, do NOFX, gravou uma música exclusiva e enviou apenas para este grupo e as pessoas comentavam "Ah! Eu recebi! Ele deixou uma mensagem na minha caixa postal com uma música sobre como odiamos o Bush e isso me fez querer ir votar". E continuamos experimentando como todas essas novas ferramentas poderiam ser utilizadas. Em 2005, mudei para o movimento antiguerra para continuar influenciando jovens eleitores e manter sua energia viva, apesar de termos perdido as eleições de 2004, e começamos a utilizar mais e mais a internet. Hoje utilizamos a internet para organizar protestos. Multidões vão para [Washington] DC para fazer grandes protestos. Cem mil pessoas, quinhentas mil pessoas. Um desses protestos, chamado Operation Ceasefire [Operação Cessar Fogo] contou com quinhentas mil pessoas e foi organizado pela internet, usando listas de e-mails de diferentes músicos e revistas alternativas para fazer toda a promoção, não envolvendo nenhum dinheiro. O movimento antiguerra não foi bem financiado como as excursões políticas com milhões e milhões de dólares. Quando perdemos em 2004, 2005 foi um ano terrível para angariar fundos. A internet se tornou o único meio de ter sua mensagem divulgada e de modo muito rápido.

Você acha que a internet é mais efetiva em pequenas ou grandes campanhas políticas?

Eu não sei se em uma ou outra. Penso que há um caminho fácil para agir sem o dinheiro, mas a eficácia continuará a mesma você estando ou não agindo com recursos. Nós estamos usando basicamente listas de e-mail, sites, blogs, e formas de propaganda já conhecidas. Para a campanha presidencial utilizamos a internet que anuncia e ao mesmo tempo aproxima o público. Tivemos comercias de TV e o público indo até a internet e aprendendo mais sobre o assunto. Ambos eficazes, mas para diferentes tipos de público.

A parte da campanha que compreende a internet apela mais para os jovens cidadãos?

Não, porque minha mãe usa a internet para comprar passagens aéreas, ela sabe como usar o Google, ela sabe como procurar por informação. As pessoas mais velhas entendem como colocar palavras-chave em um navegador da internet e procurar por informações. As gerações mais antigas podem não conhecer qual o site mais legal do momento, mas elas sabem como encontrar informação básica através do buscador. Sabem como colocar informação em navegadores, a Wikipedia tornou-se uma ótima ajuda. Além do YouTube, que não existia há quatro anos, nas eleições de 2004. Se Barack Obama fosse a algum lugar fazer um discurso, as pessoas esperavam que o vídeo completo estivesse disponível no YouTube, porque os noticiários transmitiriam apenas trinta segundos. O avô de um amigo, que tem oitenta e cinco anos, sabe como assistir a vídeos no YouTube e como baixá-los para seus amigos, por isso não classifico como algo de determinada geração. Coisas como o Facebook e similares, sim, são para as gerações mais novas, mas a internet como um todo tem evoluído para ser de todos.

Você acha que talvez uma campanha como essa aqui no Brasil seria diferente pelo fato de apenas uma pequena porcentagem da população estar ativamente conectada à internet?

A conexão é um grande problema - e o que as pessoas estão fazendo na internet também é. Nos EUA existem sites muito pesados, que demoram a carregar. Os baseados em flash são pesados, fotos e vídeos são pesados e pessoas transmitindo ao vivo, via stream, não faz muito sentido para uma grande parte da população que possui conexão discada. Mas aqueles que procuram o básico da informação estão usando a internet para também disseminar informação, portanto ela continua extremamente viável. Eu não sei qual a porcentagem da população no Brasil conectada, mas eu sei que você deve olhar para a porcentagem de pessoas que votam. Mesmo que no Brasil o voto seja obrigatório, nem todos votam. E nem todos querem votar. Seus líderes em cada comunidade estão na internet? Talvez. E se este for o caso, a internet se tornará um meio muito eficiente: as pessoas que têm acesso passarão informações para aqueles que não estão na internet. Lembre-se, na política você não precisa atingir cada uma das pessoas. Você precisa atingir líderes, e depois essa informação fluirá. Professores, diretores, escritores de grande influência.

E para atingir essas pessoas, qual você acha que é a chave ou o site-chave? Seria o YouTube? O Twitter?

Não diria que é um ou outro. É como um fazendeiro que tem diferentes ferramentas para diferentes propósitos. Não acho que uma ferramenta seja melhor ou pior que a outra. Às vezes você quer passar apenas uma mensagem, um pequeno site pode funcionar para essa mensagem, um vídeo pode funcionar para essa mensagem. Às vezes uma simples foto.

Aqui no Brasil as campanhas políticas se concentram em um espaço de tempo na TV e no rádio, algo que as pessoas tentam ignorar. Você acha que a internet tem a vantagem de ser uma nova mídia para esse tipo de campanha, para que as pessoas prestem mais atenção?

As pessoas ignoram a internet também. A leitura de e-mails teve uma queda drástica e eu acho que isso foi no mundo inteiro, não apenas nos EUA. Você envia a mensagem para a lista de e-mails e ela vai direto para a pasta de lixo eletrônico. O que acontece é que o número de e-mails abertos era de 10% a 50% anos atrás, agora não passam de 5%. Se a pessoa não estiver interessada na sua mensagem ela não irá abrir seu e-mail. Eu nem por um segundo penso que a nova mídia foi a razão das pessoas quererem eleger o Barack Obama. As pessoas simplesmente queriam ouvir Barack Obama. Quando eles abriram o nosso e-mail houve uma emoção, uma expectativa sobre a mensagem da campanha. Se sua campanha não tem uma mensagem e não é emocionante, não importa onde, as pessoas irão ignorar.

Muitas vezes as pessoas não estão propriamente atentas à mensagem. O que fazer para que elas prestem atenção?

Se elas não abrirem seu e-mail, então ele não era tão bom. Se o e-mail era muito formal, não era uma newsletter da campanha de Barack Obama. Elas eram bastante informais, como mensagens de Michelle Obama, uma atualização do gerente de marketing da campanha, coisas desse tipo. A política nos EUA e o que estava envolvido tornou-se muito ruim para interessar as pessoas. Eu trabalhei em campanhas em que foi difícil prender a atenção das pessoas e houve toda uma influência de mercado, mas nem sempre isso funciona. Quando você prende a atenção de alguém em um comercial na TV, se o produto não é bom e a pessoa vai até a loja e compra o produto, ela irá falar para os amigos. Vejo que fazer diferentes tipos de marketing utilizando as ferramentas da internet ou de mensagem de texto só funciona se o candidato e seus assessores puderem cumprir o que prometem.

O que não se deve fazer em uma campanha na internet? Que tipo de coisa você não faria?

Você deve ser transparente com quem se está falando. Você não deve responder pelo seu candidato. Vou te dar um exemplo. Em nossa página no Facebook, se alguém perguntasse algo durante a campanha, a resposta não deveria ser assinada como "Barack Obama". Nós nos certificamos em nossa campanha de que todas as nossas respostas não dessem a entender que vinham diretamente do próprio candidato. Se uma pessoa fosse a alguma página do Facebook e buscasse por Barack Obama e fizesse uma pergunta, para ter certeza da transparência, nós deveríamos escrever em terceira pessoa e assinar como "Scott@Obama.HQ". Tentávamos deixar claro para as pessoas entenderem que o Barack Obama não tinha ficado sentado até tarde da noite respondendo perguntas no Facebook. Eu acho isso importante, as pessoas querem essa transparência. Também acho que você não deve parar uma conversa mesmo que você não goste dela. Houve vários comentários negativos em nosso site da campanha sobre nossas políticas, nossos políticos, mas encorajávamos o debate, porque descobrimos que não há como em política nacional ouvirmos alguém 100% das vezes. Se virem que concordamos com eles em 40%, 50% das vezes, isso propicia um lugar para se ter conversas educadas sobre definições e solicitações de novos pontos. Talvez possamos mudar nosso ponto de vista sobre algum assunto, talvez não mudemos, mas ao menos nós teremos um lugar para ter essa conversa. E finalmente não toleramos comentários de ódio ou qualquer tipo de ofensa puramente negativa. Se fosse detestável, doloroso, racista, etc. Criamos regras para não aceitar esse tipo de linguagem.

Para a campanha do Barack Obama você tinha uma conta no Twitter e páginas no Facebook. Agora que Obama foi eleito, o que você acha que deveria ser postado nesses endereços? Qual o objetivo de se manter o blog ou a conta no Twitter?

É uma pergunta interessante. Nos EUA criamos essas contas para propósitos políticos e não para o governo. A campanha foi criada como uma entidade política, não apenas para ser transferida para o governo. Consequentemente hoje ela é separada, é registrada como uma organização política. Obama for America mudou o nome para Organizing for America e está registrada como entidade política no site dos Democratas. Todos os perfis em redes sociais ainda existem, como a conta no Twitter, mas fica claro que hoje todas existem pela Organizing for America, separada da Casa Branca. Se você quiser se juntar à Casa Branca e quiser segui-la, não importa se você é um democrata ou republicano, independente se for militarista, socialista, você deve poder entrar e se juntar a essas organizações separadamente. E você sabe que a Organizing for America não está sob o controle do governo. A Casa Branca controla sua própria página no Facebook, bastante pequena, eles estão começando, ainda não entrei em contato. A galeria de fotos da Casa Branca está trazendo coisas muito interessantes. Agora podemos ver fotos dos bastidores, fotos do Barack Obama com seus filhos na lavanderia da Casa Branca ou no playground. É muito interessante ver pessoas interessadas nesse tipo de foto, o que não é noticiado na página oficial da Casa Branca no Flickr, diferente da página do Flickr da Organizing for America, que é sobre pessoas participando de eventos pelo país, pessoas falando sobre tratamentos de saúde, coisas desse tipo. Os sites da Organizing for America são completamente separados dos sites da Casa Branca.

Mas você acha que o governo não deveria ter esse tipo de mídia social e continuar investindo em um contato mais direto com o púbico através da internet?

Creio que alguns poderão dizer que sim. Eu quero que o governo trabalhe, mas eu não quero que eles percam muito tempo fazendo coisas extravagantes, eu quero usar o que seja uma ferramenta de comunicação. A Casa Branca sempre tem um fotógrafo, então porque não colocar essas fotos em um site e compartilhá-las com todos, em vez de colocar em um arquivo oficial do governo? A Casa Branca colocará quinze vídeos por semana no YouTube? Provavelmente não. O fato é que as pessoas querem assistir ao pronunciamento do presidente em algum endereço. Elas não deveriam ter a possibilidade de apenas assistir uma vez por semana e sintonizar na estação de rádio e ouvir. Coloque um desses programas no YouTube e esteja certo de que mais e mais americanos poderão ouvir o conteúdo, não sendo prejudicados por não terem conseguido ouvir o rádio naquele dia específico. O que eu acho que ajuda, que adiciona a essa conversa, é que a maioria dessas ferramentas é gratuita e não exige muito tempo. Não vejo a necessidade de se fazer algo extravagante, como em uma campanha. Não é marketing. Eu acho muito importante você não ter que ir até os arquivos da Casa Branca e procurar.

Aqui no Brasil, bem como nos EUA, temos vários políticos usando o Twitter e outras redes sociais. Quando chegar o período das eleições, aquela conta entrará em conflito porque ela costumava ser utilizada para manter uma comunicação, ser transparente, e agora se tornará um veículo para a eleição. Como se separa isso?

Sempre existirão os dois papéis. A pessoa pode ser ambos. Você não pode separar a pessoa política para ser utilizada apenas na campanha e no governo ser outra pessoa. Se o político está realmente usando o Twitter como sua voz, um dia ele fará um discurso político e em outro um não político. Eu acho que se você estiver usando a ferramenta para a sua campanha você provavelmente terá de registrar essa conta, exceto se ela representar a campanha como um todo. Vou dar um exemplo das eleições governamentais de Virginia, no sul de Washington. Os candidatos e os senadores do estado tinham perfis no Twitter e os atualizavam escrevendo diversas coisas. Aquela era claramente a voz deles, eram eles mesmos que estavam utilizando. Você também tinha as contas no Twitter das respectivas campanhas e a de seus administradores. Acho que o Twitter ainda está em sua infância e as pessoas ainda estão enlouquecidas com ele. As pessoas estão interessadas em informação, porém eu não acho que todos os políticos que possuem perfil no Twitter fiquem extremamente populares. Honestamente, acho que vários dos nossos políticos são chatos. Mas existem aqueles que são interessantes, perspicazes e estão ganhando certa popularidade. Claire McCaskill é uma senadora do estado de Missouri que se tornou um fenômeno no Twitter. As pessoas são genuínas e ela as trata como a personalização da história. O outro exemplo é um prefeito de uma pequena cidade em Nova Jersey, Cory Booker. Cory Booker tem centenas de milhares de seguidores, mas atualmente ele esta sendo criticado pela quantidade de tempo que gasta com o Twitter, o deixando sem tempo para suas obrigações de prefeito.

Aqui no Brasil temos várias regulamentações para campanhas políticas. Muitas pessoas acham que o governo irá regularizar a campanha na internet. Você acha que eles deveriam fazer isso? Acredita que isso é possível?

Você pode regularizar o gasto com anúncios e o tanto de dinheiro gasto em campanhas. Nos EUA isso é regularizado. É bastante transparente quando sou contratado para uma campanha e o tanto de dinheiro que a campanha gasta comigo. Tudo isso fica registrado. Não sou contra uma regularização, mas estarei bastante atento quanto às ferramentas gratuitas, eles tentarão regularizar o livre fluxo da informação.