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Economizando estante

Ted Sarandos, diretor de conteúdo da Netflix, falou à Rolling Stone Brasil sobre o mercado em que a empresa atua e a chegada dela ao país

Stella Rodrigues Publicado em 07/09/2011, às 18h50 - Atualizado em 08/09/2011, às 13h32

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Netflix - Foto: Reprodução
Netflix - Foto: Reprodução

A Netflix chegou ao Brasil esta semana e não, não realizou o sonho daquelas muitas pessoas que almejam uma forma legal de assistir online aos novos episódios de suas séries preferidas. Ao longo dos últimos dias, as redes sociais foram tomadas por comentário de “olha, tem isso no catálogo” ou “poxa, falta aquilo” e até “nossa, esse não é o nome desse filme, de onde tiraram esse portunhol?”. O brasileiro está desvendando o serviço, que ainda engatinha, e descobrindo uma amarga realidade – nem adianta ir lá procurar o episódio da semana passada de True Blood, pois a Netflix não serve para substituir o download ilegal de torrents. E nem é a intenção. Com uma defasagem de um ano em relação aos cinemas e uma temporada, no que diz respeito aos programas de TV, a proposta, embora supra parte da demanda de conteúdo de fácil acesso online, é absolutamente outra. O cidadão que vai dormir mais tarde esperando o link para baixar o episódio assim que ele sai nos Estados Unidos não interessa como cliente.

“O que é mais legal é que sim, há um público sedento para ver o episódio desta semana e o filme que acabou de chegar ao cinema. Mas segurar essa audiência é muito, muito, caro e essas pessoas acompanhando tudo conforme o lançamento não são tantas assim, é um mercado relativamente pequeno”, conta Ted Sarandos, diretor de conteúdo da empresa, em entrevista à Rolling Stone Brasil. Ele explica que, obviamente, nenhum produtor vai querer perder sua própria audiência para a Netflix. Afinal, quem pagará ingresso para ir ao cinema hoje sabendo que, em breve, o filme estará online, legalmente, e dentro do pacote de assinatura? Bancar um licenciamento assim seria tão absurdamente caro que a taxa de inscrição para a rede se tornaria exorbitante e, novamente, todo mundo optaria por baixar de graça.

“Olhe para Mad Men, um sucesso em todos os lugares, crítica adora, é premiado, comentado em todos os territórios, mas somente 2 milhões de pessoas assistem ao programa regularmente. Há uma grande parte da audiência que não acompanha semanalmente. Temos as primeiras temporadas disponíveis e, todos os dias, o episódio mais visto é o piloto, tem gente começando a acompanhar o tempo todo. Para conteúdo produzido em série, como esse, é muito melhor de assistir assim, sem aguardar a próxima semana, em maratonas. Esse é um tipo de comportamento que se desenvolveu com as pessoas assistindo à séries em DVD”, complementa. “Para o cliente que quer o episódio de ontem à noite, nunca seremos a resposta. Mas para todos aqueles que querem uma alternativa boa ao roubo de conteúdo online, somos uma solução ideal, com conteúdo atraente, personalizado e barato.”

Dessa forma, ganham, também, os produtores, além de os assinantes, garante Ted. “Eles podem faturar com publicidade, na TV, com a programação que está no ar e, ainda, lucram ainda mais com séries antigas, que antes continuavam rendendo apenas na venda de DVDs e com a exibição de episódios antigos em outras emissoras. Criamos todo um novo mercado.”

Ted, assim como todos os executivos que estiveram no país na última segunda, 5, claramente recebeu instruções de não falar em números. A fluidez desse mercado e a instabilidade no crescimento da adoção da banda larga tornam perigoso demais dar palpites de qualquer tipo - número de filmes que já estão no ar, previsões de lares assinantes, tudo foi tratado com absoluta cautela por Sarandos, que não se arriscou, sequer, a fazer a previsão de uma das coisas que mais despertou curiosidade entre os usuários de teste – quando é que poderemos ver tudo legendado?

Com a dublagem, um número maior de pessoas, em termos gerais, pode compreender um conteúdo produzido em país estrangeiro, isso não tem como negar. Porém, ao mesmo tempo, a dublagem parece criar uma rejeição tão forte dentre o público mais específico desse tipo de entretenimento que acaba tornando a coisa toda contraproducente. Em um mundo ideal, o consumidor teria a opção de escolher entre legenda e vozes em português e essa é a meta da Netflix. Contudo, Ted admite que ainda demora e bastante para chegar lá. “Estamos primeiro analisando quais títulos estão sendo devorados pelo público e quais não fizeram sucesso. Esse monitoramento será determinante para nos orientar como alimentar o site. Depois, trabalhando com pós-produtoras locais, em cada país, queremos oferecer mais opções de línguas. A princípio, para a estreia, tentamos garantir que os brasileiros tivessem pelo menos uma opção em português. O padrão será que vídeos voltados para o público infantil sejam dublados e, o resto, legendado. Temos, agora, muitas séries dubladas porque as masters que licenciamos dos estúdios vieram assim, eles nunca produziram legendas para grande parte das séries antigas. Algumas dublagens, inclusive, já tiveram que ser refeitas, apesar de o default ser que quem vende o conteúdo é responsável por suprir essa demanda de tradução.”

A televisão será revolucionada

Ainda que haja um pequeno mercado de programação on demand no Brasil e que a própria Netflix já atue, desta forma, há algum tempo, nos Estados Unidos, Ted ainda vê tudo como absolutamente inovador e acredita que a chegada do serviço ao Brasil será realmente impactante. “Veremos, certamente, uma revolução no comportamento das pessoas como vimos nos Estados Unidos há quatro anos. Hoje em dia, enxergamos como algo normal tudo que temos hoje, mas a forma como tornamos mainstream com o público algo que não era mainstream foi surpreendente. E a forma como conseguimos criar um novo ciclo de lucro para uma série, que, por exemplo, só durou uma temporada, há dez anos, é o tipo de coisa que prova que ainda estamos reinventado a roda todos os dias”, afirma. “Afinal, não muda tudo apenas para o consumidor, mas também para os produtores de TV e cinema. Por muito tempo, eles produziram no Brasil e para o Brasil, porque não havia uma plateia global com a qual se podia contar. A Netflix pode, certamente, prover isso” conta o executivo, citando filmes nacionais muito além de Cidade de Deus e se mostrou um verdadeiro amante da nossa sétima arte.

A proposta da Netflix, possivelmente, não fará a pirataria tremer nas bases. São ideias de entretenimento diferentes. A rede, que analisa o gosto do usuário e indica títulos, serve mais como o rapaz simpático da locadora que sugere DVDs antigos do que como o sujeito que, na maior cara de pau, vende uma cópia de uma determinada novidade na porta do cinema onde aquele filme está sendo exibido – e por um preço bem menor. Ao mesmo tempo, difere da locadora de bairro e do funcionário simpático porque está dentro de casa, pode ser acessado com alguns cliques, com preço fixo e sem a necessidade de sair correndo de pijama para devolver antes que a loja feche e uma nova diária seja cobrada. Atuando nesse mercado de meio termo, deverá acrescentar, caso realmente melhore o catálogo, e talvez tirar uma fatia das locadoras, videoclubes, TVs a cabo e mercado de pirataria, como fez em outros países. Todavia, dificilmente substituirá completa e satisfatoriamente algum deles tão cedo.