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Extras - As 100 Maiores Vozes da Música Brasileira

Guilherme Bryan Publicado em 22/10/2012, às 10h20 - Atualizado às 10h27

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Roberto Carlos - Divulgação / Site oficial
Roberto Carlos - Divulgação / Site oficial

Leia abaixo uma carta de Marcelo Jeneci sobre o reinado de Roberto Carlos e o depoimento de Seu Jorge sobre Wilson Simonal.

Todo Reinado É Brega

Roberto Carlos antes de ser Roberto Carlos era tudo isso que conhecemos hoje e muito mais. O grande compositor e cantor já morava dentro daquele jovem com cabeça de homem e coração de menino.

Tentem desconstruir o mito...

Pensem nele no auge de seus 18 anos. Imaginem um jovem amigo da família com seu violão tímido, querendo mostrar algumas canções que acabara de fazer.

Aquele vozeirão já existia no garotão. Com 20 anos ele gravou seu primeiro álbum, Louco Por Você, e, aos 21, fez o histórico Splish Splash. Simples assim, aparentemente, começa a história de uma das pessoas mais cultuadas até hoje no Brasil.

A televisão precisava de alguém que alcançasse o coração dos brasileiros. O Brasil precisava de alguém que cantasse pra tornar o dia a dia do trabalhador menos insuportável. Com o alcance poderoso de sua voz e das sínteses de suas canções - que ora triscavam na ingenuidade da juventude, ora na religiosidade das pessoas e ora dava voz aos sentimentos mais puros e verdadeiros que todos nós temos - ele acalentava o país de canto a canto, comovendo e embalando muitas multidões. Não demorou muito pra que ele fosse eleito “Embaixador da Fé em Deus e no Amor”. Nascia então o Rei Roberto Carlos.

Seu diálogo com Caetano Veloso, por exemplo, nos rendeu 3 lindíssimas canções. Roberto fez “Debaixo dos Caracóis”, Caetano lhe respondeu com “Força Estranha” e, depois de um desentendimento entre eles, Roberto desabafou com “Fera Ferida”. Caminhar na linha que une o popular e o sofisticado, o intelectual e o comercial é de fato tarefa pra poucos e ele esteve lá.

Mas como todo reinado é brega, vieram no pacote todos os exageros que costumam existir nele. Mantos estranhos, coroas estranhas, súditos estranhos, conselheiros estranhos, cabelos estranhos, além de isolamento, distanciamento e tristeza.

A mesma televisão que constrói, destrói. O combustível dela são as notícias mais bizarras que se pode imaginar. O circo estava armando em torno do Rei.

Sua saúde psicológica começou a ser exposta através de seus conhecidos “TOCs” (transtornos obsessivos compulsivos). Sua fé em Deus “versus”

dureza da vida gerou uma espécie de reality show, no momento em que ele enfrentava o leito de dor de sua falecida mulher. Isso foi muito triste... No meio dessa loucura, ele manteve sua voz firme e continuou trazendo seu recado singular ao logo dos anos.

O tempo passou e, aos poucos, sua genialidade foi se transformando num mito azul e branco, como o céu.

Quando rola aquele brinde de fim de ano na televisão, chego bem perto da tela e tento olhar nos olhos dele. Vejo que, apesar de tudo isso, ele ainda é muito sincero e continua lá, com muitas tristezas e alegrias pra compartilhar.

Todo reinado é brega, mas nem todo Rei se entrega.

Marcelo Jeneci

Wilson Simonal por Seu Jorge

Wilson Simonal foi o primeiro negro popstar brasileiro, depois do Pelé. A gente tinha uma população muito maior do que a de hoje. Ele era o único artista negro que tinha algum respeito. A massa crítica tinha que aturá-lo. Ele tinha um estilo particular de cantar, uma extensão vocal muito limpa, clara, bonita. Tinha uma sensualidade. Ele era muito charmoso, intrigante. Dançava muito bem, tinha um poder de comunicação muito forte. E levava isso para o canto; era muito interessante de assistir. Ele era um artista muito versátil. Eu o escutei pela primeira vez com a música “Meu Limão, Meu Limoeiro”. Um episódio curioso. Eu estava com minha mãe e meu pai, e ouvimos a música no rádio, e eles reagiram como se fosse um orgulho ouvir aquela música na rádio. Como negros, naquela época, aquilo era muito bom, pois havia tolerância zero. Então, qualquer pessoa ou entidade, personalidade negra, que pudesse estar em posição de destaque, era motivo de orgulho. Aprendi isso, desde cedo, com meus pais ouvindo Wilson Simonal no rádio e sentindo orgulho por ele, ficando felizes mesmo. E isso era algo que só se falava dentro de casa. Por isso, essa mudança foi muito profunda. A música em si tem seus efeitos, mas o que está por trás dela até chegar às pessoas, são outros quinhentos. E isso ficou muito nítido no comportamento da minha mãe e do meu pai.

Eu me sinto influenciado por ele no lado showman, de quem tem cuidado com figurino, performance, de estar sempre na luz, nunca pra fora.

Muito dele eu trago, procuro me espelhar e fazer com que a música que estou fazendo chegue às pessoas mais claramente. Como intérprete, ele tinha outras qualidades, essa mobilidade em cena, no palco, por exemplo, que o Tim Maia não tinha. Tinha sempre o microfone em mãos, andando, pulando, se dirigia para massa e, de repente, a um casal. Eu gosto de muita coisa dele – “Nem Vem que Não Tem”, “Fio Maravilha” também, que foi um estouro na época, com ele. Mas destaco, principalmente, “Nem Vem que Não Tem”, o lance da pilantragem sadia é demais. Em uma época que não havia maldade, era mais curtição.

Foi muito bom homenageá-lo [no encerramento dos Jogos Olímpicos de Londres]. Era necessário fazer essa homenagem. Acho também que é necessário fazer isso de novo, quando a Olimpíada for aqui. Um cantor incrível, sugeriu muitas coisas boas pra música brasileira. Fiquei muito feliz em poder fazer o papel dele. Me senti no teatro, na Inglaterra, um lugar onde nasce o teatro. O cara foi a performance, tenho ele como plataforma para representar meu país ali; sendo ele, eu era 190 milhões. Estava cantando Simonal ali, não era Seu Jogre. Eram milhares e milhares de brasileiros. Fiquei muito feliz em adentrar aquela cena com a áurea musical de Wilson Simonal. Carinho em dedicação pessoal e profissional.

Um álbum dele, cantando só músicas deles, nunca aconteceu. Fazer um filme no papel dele, eu adoraria, eu ia curtir. Mas não é um trabalho fácil. Interpretar a vida de uma pessoa não é só falar da vida dela, é falar dos amigos dela, dos inimigos. Você tem que estudar muito. Pra gente que se envolve com isso e com o cinema de uma forma geral, é um desafio superar as expectativas. Adoro desafios e espero que, se isso acontecer um dia, eu possa encarar como um desafio, porque não é uma história simplesmente vivida. É uma história que pode vir a ser um exemplo e que já é uma referência. Uma vez projetada nas telas, vira um modelo, um exemplo, e é uma responsabilidade muito grande.