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Turma da Mônica: Laços ensina a geração dos 30 anos a desacelerar o ritmo [ANÁLISE]

Ficção baseada nos personagens de Mauricio de Souza é dedicado ao público infanto-juvenil, mas bate, mesmo, nos novos adultos

Pedro Antunes Publicado em 30/06/2019, às 14h20

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Personagens da Turma da Mônica no filme 'Laços' (Foto: Divulgação)
Personagens da Turma da Mônica no filme 'Laços' (Foto: Divulgação)

O Bairro do Limoeiro, onde vivem Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão não existe na vida real. Parece até uma realidade paralela, pensar nas casinhas com quintal frontal, grama verde e cercas brancas baixas, quando existem. Mas ele existiu em passado não tão distante assim até. E, o principal, vive dentro de cada um que, mesmo vez ou outra, folheou ou leu alguma das histórias da Turma da Mônica, de Mauricio de Sousa.

E é graças a Turma da Mônica: Laços, filme já em cartaz nos cinemas brasileiros, que ele está de volta, com sua calmaria, sem violência e grandes preocupações. Leve, o filme de Daniel Rezende é ótimo para a criançada, o público-alvo dos gibis e de grande parte da empreitada da Mauricio de Sousa Produções, mas é especialmente espetacular para os jovens adultos de 30 e poucos anos.

Quem tem 20 e poucos talvez não tenha um sentimento ainda tão nostálgico com relação à infância. Porque 1) ainda está muito próximo dela; e 2) está com a cabeça mais voltada para o futuro que tem se colocado bastante difícil.

Quem já se aproxima dos 50 anos, por sua vez, já viveu o sentimento de nostalgia gostosa que propõe Turma da Mônica: Laços, talvez até tenha filhos mais velhos que Mônica, Cebolinha e o restante da turma.

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Mas quem está nos seus 30 anos - até uns 40, para falar a verdade -, Turma da Mônica: Laços é um banho morno e cheiroso de nostalgia e mensagens subliminares.

Nesse quesito, o filme brasileiro se diferente de Toy Story 4, que traz um brilhante ensinamento para essa mesma geração, de aceitar que algumas amizades têm uma função importante nas nossas vidas, mas que também podem ir embora sem que isso seja um problema.

Toy Story 4 usa as agonias de não se ter mais proximidade com os velhos amigos para aliviar as angústias da geração trintona. É sobre o hoje, para o hoje.

Turma da Mônica: Laços, em contrapartida, se mostra magnífico em levar esses jovens de 30 anos - eu, incluso -, a um período no qual o mundo parecia girar de maneira mais lenta e as preocupações eram mais simples.

Até quem não era leitor assíduo da turminha e se divertida com os planos mirabolantes, "infalíveis" e completamente falhos de Cebolinha para conseguir dar alguns nós nas orelhas do Sansão, o coelhinho de pelúcia azul da Mônica, é capaz de se relacionar com essa época.

Da maneira que for, cada um guarda um próprio bauzinho de memórias desses tempos nos quais se poderia brincar, correr e a imaginação parecia criar inúmeras realidades diferentes daquela que vivíamos.

A adolescência e a pós-adolescência (também conhecida como 20 anos) fizeram com que esse baú fosse guardado naquele maleiro do armário, escondida entre outras tralhas sobre as quais não sabemos exatamente o que fazer.

Não porque as lembranças não eram prazerosas de se ter, mas porque elas tinham um efeito pouco prático no dia a dia de quem está brigando para se estabelecer no mercado de trabalho e tentando, de forma razoável, sobreviver às amarguras e doçuras das relações amorosas.

A chegada aos 30 anos significa muita coisa. Possivelmente você, leitor que acabou de cruzar essa barreira, ainda não se estabeleceu na profissão - se é que você conseguiu entender qual é a sua real habilidade - e seu coração segue remendado. Mas algo muda na gente quando pensamos na infância nessa época.

É a mesma sensação de mudar de casa depois de tanto tempo. Os armários precisam ser esvaziados e lá está o bauzinho, esperando para ser aberto. Depois de tanto tempo, olhar para ele não é embaraçoso ou coisa do tipo. Vale a pena dedicar alguns minutos da mudança para ir para dentro dele e esquecer o mundo ao redor.

Os 30 anos são um período no qual a velocidade imposta pela década anterior começa também a cobrar seu preço. As calças passam a "encolher" na região da cintura, o mesmo acontece com aquelas camisetas velhas que tanto amávamos e hoje parecem pequenas. O fígado já não gosta tanto das bebidas alcoólicas como outrora e as ressacas, por vezes, começam enquanto você ainda está na festa com os seus amigos. O que está acontecendo? Você cresceu, abusou e agora é hora de frear o ritmo.

Turma da Mônica: Laços, enquanto conta a história de como o cãozinho Floquinho, do Cebolinha, desapareceu, mostra como pode ser bonita a relação entre quatro crianças tão diferentes. Cada um da turma, Cebolinha, Mônica, Cascão e Magali tem seus medos e questões a serem resolvidas - possivelmente, eles farão terapia, já mais velhos, para tratarem os casos mais latentes.

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Mas eles se aproximam ainda mais, mesmo diferentes, porque é isso que as pessoas adultas deveriam fazer, não fossem conceitos, pré-conceitos e preconceitos entrarem ao longo da vida e estragarem tudo.

Além de toda a mensagem sobre igualdade e convivência carregada pelos quatro personagens ao longo da jornada para encontrar o cachorrinho perdido, Turma da Mônica: Laços é um convite ao sossego e ao fim do ritmo frenético do dia a dia.

A simplicidade da vida da turma, hoje tão distante da rotina do trintão, é se coloca como um "e se...". "E se eu começasse a ler mais, em vez de só incluir nas promessas de ano novo?" ou "E se eu parasse de me importar tanto com uma carreira?" As lembranças de uma vida mais simples e tranquila na infância não precisam ser somente isso, memórias, podem ser o futuro também.

Por mais que o mundo ao redor se coloque caótico, desorganizado e impiedoso, ele não foi sempre assim e pode deixar de ser, também. Basta pisar no freio um pouco, lembrar de quem se era antes dos quilos de responsabilidades serem colocados nas costas dessa geração enfim adulta.

Turma da Mônica: Laços, com uma fotografia bastante contemplativa e cenas de silêncio em meio à floresta, propõe um respiro, o primeiro, depois de uma grande maratona que é amadurecer.

O filme disfarçado de infanto-juvenil bate em cheio em quem, enfim, percebe que a vida não vai sair correndo se você começar a caminhar.