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Música / Entrevista

Grag Queen lança single após estreia no Drag Race: 'Tenho que ser babado pra julgar' [EXCLUSIVA]

Vencedora do Queen of the Universe e agora apresentadora do Drag Race Brasil, Grag Queen lançou 'Sirene' e abraçou pop autoajuda em entrevista à Rolling Stone Brasil

Grag Queen lança single 'Sirene' (Foto: Divulgação)
Grag Queen lança single 'Sirene' (Foto: Divulgação)

Com apenas 28 anos, Grag Queen já foi consagrada Queen of the Universe no reality show homônimo e agora é apresentadora do Drag Race Brasil, com a benção da própria RuPaul. Ela ainda arranjou tempo para se dedicar à carreira musical e lançou nesta sexta-feira, 15, o single "Sirene".

"Filosoficamente falando, sirene é algo que faz alarde, faz barulho", disse Grag em nota enviada à imprensa. "As pessoas têm me conhecido, e este é o momento de tocar essa sirene para o mundo. Estou pronta para atingir não sei quantos milhões de decibéis!"

A música é inspirada na era setentista e tem como uma das referências Bruno Mars, artista que esteve ao lado de Grag no line-up da primeira edição do The Town. Inclusive, a cantora afirmou que está em contato com os mesmos produtores de Mars, mas não confirmou a chegada de seu primeiro álbum: "Não tô prometendo, mas tô deixando no ar."

Em entrevista exclusiva à Rolling Stone Brasil, Grag Queen falou sobre os rumos que a carreira musical está tomando, a definição de "pop autoajuda", o legado como rainha do universo e, é claro, o cargo de apresentadora na versão brasileira de RuPaul's Drag Race. Confira:

Rolling Stone Brasil: Você disse que “Sirene” representa uma nova fase para você. Pode me explicar melhor o que tem mudado e o que caracteriza essa nova fase?
Grag Queen: É uma nova Grag, né?  Eu acho que depois que eu fui abençoada pela RuPaul, de ser a gata que pode julgar, que pode trabalhar com sonhos de drags brasileiras, que a gente pode fazer parte desse marco histórico, eu acho que ali eu recebi uma missão de me portar diferente, de me enxergar diferente.

Eu tive a oportunidade de me enxergar diferente como artista. Ver a Grag Queen. Não como tentativas, mas sim como acertos.  Saber que eu não queria mais ter tais narrativas, não queria trabalhar com tais ritmos, e eu me descobri muito nessa era setentista, essa era vintage, mas também misturada muito com o futuro, com o moderno, trazendo letras divertidas, músicas mais complexas, musicalmente falando, com bandas, com sons orgânicos.

Também levando a oportunidade de entrar na bolha fora do Brasil, levar uma cuíca, levar um pandeiro junto com toda essa musicalidade meio James Brown, Bruno Mars, Cher e a própria Fat Family, que é uma grande referência. Então, "Sirene" traz isso. Vocês já têm visto toda a estética da Grag que eu tô servindo, toda a narrativa, tudo! Agora eu tenho que mostrar que eu sou babado mesmo para julgar as mães, né?

Rolling Stone Brasil: Você citou o Bruno Mars... Como foi se apresentar no The Town, ao lado de um artista como ele, que serviu como inspiração para o seu single?
Grag Queen: Eu pensei: "Gata, você tá no caminho certo." Tu vê isso acontecer: estar no mesmo line-up que Bruno Mars, no mesmo line-up que Gloria Groove, que Pabllo Vittar, que Iza... Para mim, eu venci, venci demais. Tanto com a representatividade brasileira de Iza, a representatividade drag de Gloria e Pabllo, representatividade artística e referência de Bruno Mars... Acho que toda a atmosfera foi me tocando e, obviamente, estive na minha maior potência, com uma banda orquestrada, com backing vocals, com bailarinos, com um show a minha cara, com músicas que eu amo cantar, com figurinos que eu amei vestir, contando a minha história musicalmente, artisticamente, eu não poderia estar melhor. Foi tão fluido, a nossa equipe escolheu trabalhar de uma forma tão leve. Nesses projetos grandes, as pessoas ficam todas doidas e pilhadas. A gente disse, "Vamos fazer com amor, vamos fazer na leveza," e refletiu no maior show da minha vida até hoje.

Rolling Stone Brasil: Em outra entrevista, sua música foi definida como “pop autoajuda”. O que pensa sobre essa expressão?
Grag Queen: Eu não sei muito o que eu penso. Acho que é um nome meio engraçado, sinceramente. Eu acho que a nossa arte, antes de tocar o mundo, ela tem que nos tocar. É um princípio artístico meu.

Eu comecei a fazer música no meio da pandemia. Não sou herdeira, não sou filha de ninguém, então, o que eu tinha para falar para mim era "bota fé que vai rolar", era "espera que o teu tá guardado", e tô muito feliz por minhas palavras para mim mesma terem refletido na vida de outras pessoas como eu, com os mesmos recortes, pessoas da minha comunidade.

Querendo ou não, a gente tem muita música que fala de amor, que fala de chifre, que fala de bunda no chão, as quais são perfeitas e todos amam, mas não era disso que eu queria falar. A minha primeira música se chama "Bota Fé" e as pessoas foram vendo que não era só uma autoajuda, [como um livro de] Augusto Cury, que você lê e bota na prateleira.

Sim, pode ser sim um pop autoajuda, o nome é engraçado, mas se você for ver a etimologia, faz muito sentido.  

Rolling Stone Brasil: Vem álbum por aí?
Grag Queen: Tem que vir, né? Tô falando de era, tô falando de nova fase, tô falando que me encontrei. Já estou produzindo músicas na mesma vibe e na mesma estética. A gente já tá num projeto de ir para Los Angeles fazer um camping com esse pessoal que produziu Bruno Mars, que produziu James Brown, que produziu Dua Lipa... A gente tem esses contatos, tem essas ligações, e por que não fazer acontecer? Por que não entrar lá como uma drag no mercado internacional, levando nossa brasilidade, levando o nosso "ziriguidum", levando também toda essa energia de sonhadora, de realizadora, de batalhadora? Eu quero muito que isso aconteça, e tenho certeza que isso vai culminar num álbum. Não tô prometendo, mas tô deixando no ar.

Rolling Stone Brasil: Pretende fazer uma mescla de idiomas?
Grag Queen: Acho que a gente vê bem pela Anitta. Estamos jogando futebol num gramado que a gente nunca viu. Então, eu acho que tudo é teste. Tenho muita, muita, muita gratidão de estar nesse lugar, onde muita gente já me conhece, já sabe do que eu sou capaz, já sabe a notoriedade e já sabe a validação que eu tenho como host de uma das maiores franquias do mundo.

Quero usar isso para realmente levar minha musicalidade, minha qualidade vocal, minha qualidade artística, e trazer o Brasil da melhor forma comigo, assim como eu sempre fiz, desde o Queen of the Universe e o Drag Race Brasil.

Eu quero ser eu, eu quero continuar sonhando, aceitando oportunidades e estando aberta. Acho que, no momento, eu não articulo nada muito pontual, internacionalmente, até porque eu nunca articulei nada, já tá acontecendo muita coisa. Então, eu tô aberta ao universo do qual sou rainha, e se tiver que estar lá, a gente vai estar lá da melhor forma.

Rolling Stone Brasil: Você acredita que há algum lado negativo em ser também conhecida como a Queen of the Universe?
Grag Queen: Não consigo achar nenhum lado negativo em ser conhecida como a Queen of the Universe. Não tem! Poderia ser a Queen of Bom Retiro, Queen of Rio Grande do Sul, Queen of...  Não, eles me deram o universo já de cara, e é com ele que eu tenho andado. É com ele que eu tenho me relacionado, e, de verdade — minha equipe pode dizer, meus amigos podem dizer —,  eu jogo escancaradamente tudo na mão do universo, porque o universo não é nada mais, nada menos, do que a gente. Quanto mais a gente se aproxima da gente, mais perto do universo a gente tá, porque esse é o universo.

Rolling Stone Brasil: Como foi sentir a pressão de um reality e pouquíssimo tempo depois apresentar o Drag Race Brasil?
Grag Queen: Eu acho que foi a ordem perfeita. Imagina apresentar e depois concorrer. Imagina que doideira. Eu acho que competir, ter a oportunidade de competir, ter a oportunidade de ser pressionada, de ser tratada como competidora, de estar lá numa corrida, a oportunidade de ganhar, a oportunidade de representar o Brasil, foram tipo escolas indiretas, que me fizeram ser uma apresentadora extremamente empática. Em vez de dizer "Entregue" em televisão, eu digo, "Amores, se divirtam, foi o que eu fiz, vocês viram, vocês torceram, vocês estavam torcendo por mim."

Eu sou prova viva de que a gente está realizando sonhos, sim, mas a gente está fazendo televisão. Só que a nossa única missão aqui é transformar essa vivência numa memória boa, porque sim, TV traumatiza, TV mata sonhos. A gente sabe como é reality. Tudo pode acabar para a gente em um piscar de olhos. Então eu digo: "Sejam vocês, se divirtam, se preservem, estudem, pesquisem, estejam atualizadas, e é isso."

Eu acho que eu levei muita empatia. Agora que elas já estão famosas, eu já digo, "Cuidado com o pessoal da internet. Internet não é terra de ninguém, o processo vem." Então eu estou sempre instruindo elas da melhor maneira, porque eu tenho 28 anos e elas têm essa média de idade. Temos uma relação de mãe e filha, mas eu sou aquela mãe que leva para a balada, sou aquela mãe que bola, entendeu? Sou aquela mãe mais tranquila.  

Rolling Stone Brasil: Tendo essa experiência, acha que pegou mais leve com as participantes?
Grag Queen: Lógico que não, né?  Eu acho que eu preparei elas para participar de uma corrida por uma coroa. Eu não disse para elas, "Aqui é férias," eu disse, "Amores, eu vou estar aqui sendo a mais chata possível," não no lugar de destruir, não no lugar de destruição, no lugar de realmente priorizar o crescimento que a gente pode ter dentro de um reality.

Dentro de um reality do qual eu participei, eu me descobri resiliente, descobri que eu sei trabalhar na impressão, que eu consigo ficar bonita em uma hora, entendeu? Vou dizer que a gente foi dura com elas, mas não como nesses realities que vocês veem, que as pessoas só dizem assim: "Você não é boa,  você não merece estar aqui." Não, foi para realmente ver elas evoluindo, elas saindo da cabeça delas,  porque também tem todos os recortes mentais, que eu faço questão de levar. Quantos meninos gays brasileiros, drags brasileiras, corpos marginalizados, violentados...

A gente já tem uma carga mental que passa por igreja, passa por dentro de casa, passa por escola e já não são mentes muito bem calibradas, infelizmente, por uma escolha que não é nossa. Então é muito fácil pessoas da nossa idade, artistas, entrarem na sua cabeça, se sabotar e achar que não é suficiente. Fazia muita questão de dizer, "Amor, dá dois passos para trás, se enxerga como eu te enxergo, você tá aqui porque você merece. Você não tá aqui por acaso. Não é presente, é conquista. Não é privilégio, é o teu, entendeu?"

Acho que eu preparei elas pro mundo, não mais numa competição, porque a competição acabou ali, e ganha só uma, e essa era a regra, mas a vida não tem regra, né? Então eu quero que elas sejam felizes. Eu digo sempre: o primeiro dinheiro, gastem com terapia, gastem com agradecimento, sejam gratas, se protejam, agradeçam seus pais — sejam eles os pais de verdade ou a família que a gente escolhe. E é isso, eu sou autoajuda mesmo, tá vendo?  Não adianta fugir.  

Rolling Stone Brasil: Como se sente à frente de um programa tão importante, estruturado e bem produzido como o Drag Race? Você tem apenas 28 anos, certo? A RuPaul começou o RuPaul’s Drag Race com quase 50, a título de comparação.
Grag Queen: Eu me sinto muito honrada, óbvio, não tem como não. Tô levando o legado de uma drag queen que é revolucionária, que revolucionou a cena dela, de onde ela era, de onde ela estava. Eu tô levando o legado de uma pessoa que construiu um formato de uma franquia que funcionou, e agora também levando o legado da arte drag brasileira.

Também lembrando da Silvetty Montilla, da Márcia Pantera e da Marcinha do Corinto, que vieram antes da gente. Lembrando da arte brasileira, que é diferente, e das pessoas brasileiras, que são diferentes.  Sinto que tô levando muitos legados e representando muitas coisas. Sou muito feliz pelo meu amadurecimento não ter me levado para um lugar de pressão, e sim de honra, sabe? E de estudo e de preparação para que eu pudesse honrá-las da melhor maneira, e também seguindo a minha verdade.

Rolling Stone Brasil: Existe alguma coisa no Drag Race — que possa contar, obviamente — que você achava que funcionava de um jeito, quando era espectadora da versão original, e descobriu que é totalmente diferente, agora que é apresentadora?
Grag Queen: Várias coisas, né? Passou da passarela para trás, amor, é só a gente que vê. E é isso, né? Não sou eu que vou tirar a cabeça do Bob Esponja no parque da Nickelodeon. Eu não vou dizer, porque é muito interessante ver como espectador, mas é muito mais interessante a gente entrando na workroom, a gente entrando no main stage... Era um chororô, parecia que a gente tinha transcendido. Era uma experiência, assim, pós-morte, sabe?

Entrar na workroom, ver elas, ver elas chorando, ter que mandar embora, entender que é um jogo, nisso tudo a gente foi se adaptando, mas confesso que tô muito feliz e muito grata por ter tido esse olhar novo, que é um olhar não só de espectadora, mas agora de facilitadora, de participante, seja executiva, seja criativa, seja de elenco. Então é muito gostoso. É como se você pegasse o seu reality show ou série favoritos e te chamassem, né? "Vamos ver, Friends? Agora eu quero te mostrar onde eles moram, eu quero ir com você ao bar lá," então é muito gostoso, eu amei.

Rolling Stone Brasil: O que você acha que as drags brasileiras têm que as outras ao redor do mundo não têm?
Grag Queen: Elas são brasileiras [risos]. Sabemos que a gente tem um negócio, né, amiga? Um "ziriguidum" que a gente não consegue ver, a gente não consegue nomear, mas a gente consegue sentir. A gente sabe que tudo que brasileiro bota a mão, por onde a gente passa, a gente bota essa energia. É químico, é biológico, não sei, é energético.

E óbvio que temos todas as vivências, né? Ser drag no Brasil é ser drag com poucos recursos. Ninguém nasce Gloria, ninguém nasce Pabllo, ninguém nasce Grag, ninguém nasce com recursos. Muita gente  teve que cantar por um copo de gin. Muita gente teve que gastar duzentos [reais] na roupa para pagar trezentos de transporte. Todo mundo teve que fazer drag porque ama demais. Porque, sinceramente, ser drag no Brasil não é um fundo de aposentadoria, é bem difícil. A gente é desrespeitada, a gente ainda mora no país que mais mata pessoas da nossa comunidade.

Ser drag não é só um ato político: é um ato de sobrevivência, de resistência, de saber que sim, é uma delícia estar acompanhando o quanto a gente está mudando as coisas, está mudando o mundo, a gente está na TV... Eu vivi num lugar onde drags eram abominadas, onde drags só apareciam em lugares  cômicos, lugares de ridicularização. E imagina, eu lá de Canela, estou vivendo tudo isso — até me emociona. Estou vivendo tudo isso e vendo isso acontecer, vendo essa transição, não esperando as coisas entrarem em colapso e, enfim, eu amo e eu sou muito feliz de estar fazendo parte disso.

Grag Queen: Rolling Stone Brasil: Você já deu pistas de que teremos outras temporadas do reality. Pode dar mais alguma dica sobre isso?
Eu vou dizer que eu quero muito e que eu tenho agenda. O resto é para o universo.