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La Casa de Papel: Por que cantar ‘Bella Ciao’ na Itália pode ser considerado ofensivo?

O vocalista italiano Mark Zitti, da banda Fratelli Coltelli, explica a origem de um dos 10 maiores hits europeus presente em La Casa de Papel

Redação Publicado em 15/04/2020, às 14h00 - Atualizado em 03/12/2021, às 18h04

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Tóquio em La Casa de Papel (Foto: Netflix / Divulgação)
Tóquio em La Casa de Papel (Foto: Netflix / Divulgação)

Quando Mark Zitti e a banda italiana FratelliColtelli tocam “Bella Ciao” nas residências numerosas dos Emirados Árabes, a reação do público é sempre a mesma: algumas pessoas seguem para a pista de dança improvisada e batem palmas cada vez mais altas, enquanto a música folclórica ganha força gradativamente.

No entanto, Zitti também repara que os italianos mais velhos permanecem sentados, com um olhar levemente confuso e dolorido. Às vezes, no final do show, nada acontece. Outras vezes, alguns abordam Zitti com um feedback sincero. “Eles vêm me perguntar por que toquei essa música,” ele lembra. “Para muitos italianos, essa música não é sobre celebração. É sobre guerra. E traz de volta muitas lembranças pesarosas.”

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Esta é uma linha tênue que Zitti tem trilhado nos últimos três anos, desde que “Bella Ciao” ressuscitou por meio do sucesso da Netflix,La Casa de Papel. A música é o mote chave da série. É frequentemente usada para sublinhar a resistência do Professor - ou para comemorar um assalto bem executado pela equipe de criminosos.

Com o sucesso internacional do programa, a música tornou-se um dos 10 maiores hits da Europa. Mas sob a atmosfera comemorativa de “Bella Ciao,” existe uma história complicada que inclui uma boa dose de injustiça e sangue. A música tem fortes raízes no Vale do Pó, localizado na região norte da Itália. Na primeira metade do Século XX, os trabalhadores sazonais cantavam o “Bella Ciao” como uma maneira de lidar com a tarefa árdua e mal remunerada. As letras, inclusive, descrevem um dia normal de trabalho nos campos de arroz.

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“Esta manhã, eu me levantei para trabalhar lá no arrozal, adeus querida,” diz a primeira estrofe da música antes de descrever os “insetos e mosquitos,” além da presença malévola do supervisor, traduzido como “o chefe com uma vara.” Cada verso aumenta a intensidade e ilustra que o compositor, resiliente, aguarda o momento decisivo no qual a sorte mudará: “mas chegará o dia em que todos trabalharemos em liberdade.”

Foi essa declaração final que viu a música ser adotada como um grito de guerra pelos partidários italianos entre 1943 e 1945, que mudaram o último verso para “morrer pela liberdade.” Foi uma época em que eles lutaram contra a ocupação das forças nazistas na Segunda Guerra Mundial e a guerra civil contra o governo fascista italiano de BenitoMussolini.

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São os ecos daquele período angustiante que fazem de “Bella Ciao” um lembrete indesejável para muitos italianos. Foi algo que Zitti percebeu 33 anos atrás, quando, aos seis anos de idade, testemunhou a forte reação de seu avô quando uma das versões cover da música tocou nas rádios.

"Ele não estava muito feliz,” disse Zitti. “A guerra civil é algo muito próximo de nós na Itália. Quase todas as famílias italianas foram afetadas por ela. Muitos avós estavam envolvidos no conflito. É por esse motivo que você realmente não pode tocar essa música na Itália. Não é proibido, mas seria indelicado.”

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"Bella Ciao veio de uma época em que os italianos cantavam com sentimento," continuou. “Eles cantaram sobre amor, liberdade e até guerra do coração. Você não ouve mais músicas como essas da Itália.”