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Patti Smith destrói guitarra e The Raconteurs furioso: como foi o Popload Festival 2019

Festival ainda teve Hot Chip na fritura e Cansei de Ser Sexy extremamente político e pop da Tove Lo

Pedro Antunes Publicado em 16/11/2019, às 10h00

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Patti Smith (Foto: Fabricio Vianna / Popload)
Patti Smith (Foto: Fabricio Vianna / Popload)

Patti Smith deixou no palco a guitarra com as cordas estraçalhadas enquanto se dirigia para o backstage. A presença do instrumento estragado, destruído propositalmente pela norte-americana de 72 anos, última atração do Popload Festival 2019, é sintomática. Tal qual a apresentação de Patti e seu grupo, a delicadeza no tocar o instrumento logo se transforma em caos e destruição. Da poesia ao punk. Essa é a Patti Smith que tocou em São Paulo na noite deste sábado, 15.

Segundo a organização, foram vendidos os 15 mil ingressos disponíveis para lotar o Memorial da América Latina. E, como ocorre em todos os grandes eventos realizados no espaço (como Coala Festival e o Cultura Inglesa Festival), a estrutura do Memorial não oferece um número de banheiros suficiente para evitar a formação de filas gigantescas. Fora isso, mais uma vez, a localização do local, ao lado da estação de metrô Barra Funda, ainda é o maior trunfo do lugar.

Patti Smith, a poetisa do punk

Quando subiu ao palco, Patti Smith precisou lidar e entender que a posição de headliner da noite a colocaria depois da barulheira poderosa do The Raconteurs e diante de uma arena que já não estaria tão cheia quanto no show anterior. Embora ela seja fundamental para a história da música, Patti não é exatamente conhecida ou extremamente popular no sentido da indústria "pop" da coisa - Jack White, por exemplo, não tem um som pop, mas é pop, sacaram?

Por isso, quando Patti começou a performance, aproximadamente às 20h50, a sensação foi de vertigem, daquela quando você dá um passo adiante e não percebe que precisava descer um pequeno degrau. Da massa volumosa do Raconteurs, precisamos nos ajustar à poesia da Patti.

Mas, no fim das contas, não é o volume que importa e, sim, o que é feito do som, o resultado disso. E Patti Smith, acompanhada da banda, fez uma apresentação potente na sua maneira. Com 12 músicas, foram sucintos. O tempo entre as canções foi usado para Patti usar as palavras como ela tão bem faz também na literatura.

"Não vamos ser oprimidos", diz a artista, em dado momento. "Temos que ser visionários, mas também temos que ser ativos. Precisamos cuidar da nossa Terra", ela seguiu.

Certeira, ela emendou covers e canções próprias. Como a dobradinha de "After the Gold Rush", de Neil Young, e "Free Money", música do disco clássico de Patti,  Horses, lançado em 1975.

Já para o final da apresentação, depois do hit romântico "Because The Night", Patti se entregou aos instintos mais selvagens. Com a guitarra em mãos, passou a produzir ruídos anárquicos, como se tivesse voltado aos anos do nascimento do punk, à Nova York de 1970. Puxou as cordas com violência até parti-las. E assim ficou, com o instrumento por pouco não completamente inutilizado, enquanto cantava "Gloria", do Them. Selvageria boa.

The Raconteurs, vigor, peso e diversão

(Foto: Fabricio Vianna / Popload)

Um dos tantos projetos de Jack White, o The Raconteurs é o mais direto, sem firulas e exageros. Se na carreira solo o ex-White Stripes gosta de experimentar timbres, fórmulas e linguagens, com Brendan Benson e companhia, ele faz a sua própria investigação do blues rock clássico.

O duo de vozes e guitarra formado por White e Benson funciona muito bem, em discos (como em Help Us Stranger, lançado neste ano) e ao vivo. White é mais estridente e raivoso, enquanto Benson se contrapõe com um entendimento do pop, de arranjos mais palatáveis.

+++ Discos de The Black Keys e The Raconteurs mostram que o rock está vivo - e tem futuro [ANÁLISE]

No palco antes de Patti Smith, é possível dizer que o Raconteurs era co-headliner do Popload Festival, mesmo que o público não mostrasse conhecer exatamente todas as canções apresentadas ali. Help Us Stranger foi tocado quase na íntegra: foram 7 músicas, com destaque para "Bored and Razed" (instigante com refrão que chega a notas altas inesperadas depois de um início de quase rock progressivo), que abriu o show, e Somedays (I Don't Feel Like Trying)", faixa de ritmo lento e guitarras sombrias.

Atraindo mais curiosos do que nerds/fãs, o The Raconteurs mostrou o potencial máximo da banda no fim da apresentação, com "Steady, As She Goes", a música mais famosa deles.

Hot Chip, fritação indie

Velhos conhecidos dos festivais brasileiros, os rapazes do Hot Chip ainda sabem comandar um palco. No fim de tarde, começo da noite, a sua fritação eletroindie funciona ainda melhor. Com gosto por sintetizadores e loopings, o grupo promove uma hipnose coletiva no palco.

Não é um show que apresente exatamente novidades, mas isso não os transforma em óbvios. "Ready for the floor" e "Over and Over" ainda são as favoritas e se transformaram ao longo dos anos, algo que fez bem para os dois hits. A versão de "Sabotage", dos Beastie Boys, foi intensa - tão intensa quanto o grito de Alexis Taylor contra o presidente Jair Bolsonaro.

CSS, político e divertido até a última gota

Há 8 anos o Cansei de Ser Sexy não tocava em São Paulo, 5 anos sem qualquer apresentação da banda. Como o som reagiria à força implacável do tempo era a questão a ser feita. Afinal, o CSS fez barulho quando surgiu, tornando-se a banda queridinha de público e crítica indie (no Brasil e no exterior).

Bom perceber que Lovefoxxx e companhia não só ainda são energéticas no palco e que suas músicas não ficaram datadas. O discurso em 2019 é ainda mais político. Lovefoxxx tocou metade do show com uma camiseta do MST cujo verso pedia por uma "revolução agroflorestal".

Dançante até o último fio de cabelo, CSS tem espaço na música de 2019/2020 - e são muito bem-vindas de volta.

Tove Lo, o pop não-óbvio

(Foto: Filipa Aurelio / Popload)

Além de chamar o funkeiro Mc Zaac, Tove Lo encantou a tarte com um pop que não é extremamente óbvio. A verdade é que, com o passar a noite, suas canções passaram a soar mais frágeis e quebradiças, com um instrumental insosso se comparado ao que veio depois.

Isso não tira o brilho da artista sueca dona de um público bastante fiel. Suas canções falam de libertação, o que é ainda mais importante em um 2019 de tanta repressão no mundo todo, e de amor próprio.

Antes ainda o Popload Festival teve a banda Khruangbin, a rapper/cantora Little Simz, e a sempre incrível Luedji Luna. A abertura do festival seria realizada com o cortejo do grupo Ilê Aiyê, mas o voo do grupo atrasou, então eles participaram da apresentação de Luedji e fizeram seu cortejo em meio ao público.