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Como Gilberto Gil se reinventou na música após prisão na ditadura militar

Após ser preso e exilado pela ditadura militar brasileira, Gilberto Gil passou a olhar para o futuro quando fazias as músicas

Alexandre Matias Publicado em 03/02/2023, às 12h53

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Gilberto Gil durante exílio na Europa, após ser preso pela ditadura militar (Foto: Reprodução/Instagram)
Gilberto Gil durante exílio na Europa, após ser preso pela ditadura militar (Foto: Reprodução/Instagram)

O fim do sonho psicodélico da Tropicália veio como um soco: o Ato Inconstitucional número 5, decretado no final de 1968, transformava o regime militar em uma ditadura sem eufemismos. As consequências no mundo da cultura atingiram em cheio o coração tropicalista, quando Gilberto Gil e Caetano Veloso foram presos e levados a um quartel no Rio de Janeiro, sem terem a menor ideia do que iria acontecer com eles no futuro.

A prisão e posterior exílio dos dois baianos os acertou com força, tanto emocional quanto artisticamente, e cada um reagiu a sua maneira. Gil abandonou seu ar de cronista e passou a olhar para o futuro. Aos poucos, suas composições se misturavam à ficção científica, à medida que ele se sentia um personagem em uma distopia autoritária.

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O isolamento da cadeia e a iminência da possibilidade de deixar o Brasil – quem sabe, para sempre – provocou um trauma em sua poética, que passou a misturar nostalgia com uma contemplação pasma com um futuro implacável, lançando um disco ainda mais experimental do que o anterior.

Após dois meses preso, Gil pôde deixar a cadeia, mas manteve-se em prisão domiciliar até negociar sua saída do Brasil. Como Gil e Caetano estavam proibidos de fazer shows, o diretor artístico da gravadora Philips, André Midani, encomendou discos para aplacar suas condições financeiras e psicológicas no período.

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Gil compôs e gravou as músicas que se tornariam seu terceiro disco, conhecido como Gilberto Gil (1969) ou Gilberto Gil : Cérebro Eletrônico, esperando que pudessem ser acompanhadas por uma promissora banda de rock de Salvador, Os Leif’s, que contava com os irmãos Pepeu e Jorge Gomes, ainda adolescentes, na formação.

Mas o produtor Manoel Barenbein preferiu agilizar o processo, convidou o maestro Rogério Duprat para arranjar as canções e montou uma superbanda para gravar as bases – Lanny Gordin na guitarra, Chiquinho de Moraes no piano, Sergio Barroso no baixo e Wilson das Neves na bateria.

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Aos instrumentos, foram acrescidos metais, ruídos, diálogos, ecos e outras invenções que Barenbein e Duprat criaram no estúdio. Ironicamente, a única música que Gil gravou no estúdio foi seu maior hit até então. “Aquele Abraço” era uma óbvia carta de despedida ao Brasil, cantada em um astral que destoa do clima triste da letra – Barenbein inclusive lembra como a animação do baiano contrastava com a desolação ante à notícia de que teria de deixar o país.

Batizado mais uma vez com seu próprio nome, o disco de 1969 é referido como “Cérebro Eletrônico” devido a sua primeira música, uma das várias em que Gil lida com a ficção científica, como a psicodélica “Futurível”, sua regravação de “2001” (de Rita Lee e Tom Zé) e a melancólica “Vitrines”, quase uma versão alternativa (e melhorada) para “Space Oddity” de David Bowie.

Capa de Gilberto Gil (1969)
Capa de Gilberto Gil (1969)

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Também se destacam “Volks-Volkswagen Blues”, interpretações para “A Voz do Vivo” (de Caetano) e de um hit de Luiz Gonzaga (“17 Léguas e Meia”) e a ousada “Objeto Semi Identificado”, uma colagem de diálogos e pedaços de canções em diferentes rotações.

Entre as digressões da última faixa, Gil acaba resumindo seu estado de espírito - e o conceito do disco - de um jeito bem particular: “Eu gosto mesmo é de comer com coentro, uma moqueca, uma salada, cultura, feijoada, lucidez, loucura... Eu gosto mesmo é de ficar por dentro, como estive na barriga de Claudina, uma velha baiana 100%”.

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Rolling Stone Brasil Especial 80 Anos de Música
Rolling Stone Brasil Especial 80 Anos de Música

Gilberto Gil (1969) é um dos discos resenhados no Especial 80 Anos de Música, uma edição exclusiva da Rolling Stone Brasildedicada à Geração 1942, que reúne nomes essenciais da MPB, como o próprio Gilberto Gil, Milton Nascimento, Paulinho da Viola e Caetano Veloso, além de um panorama global dos nascidos neste ano. O especial impresso já está nas bancas e nas bancas digitais. Clique aqui para saber mais. Ouça o disco completo abaixo: